Um voluntário brasileiro que participava da fase três de testes da vacina da Universidade britânica de Oxford em parceria com a farmacêutica anglo-sueca AstraZeneca contra o novo coronavírus morreu de complicações da Covid-19, informou a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) nesta quarta-feira (21).
Segundo comunicado, a agência informou ter sido notificada do óbito no último dia 19 de outubro, e disse que o Comitê Internacional de Avaliação de Segurança manterá o estudo.
"Com base nos compromissos de confidencialidade ética previstos no protocolo, as agências reguladoras envolvidas recebem dados parciais referentes à investigação realizada por esse comitê, que sugeriu pelo prosseguimento do estudo. Assim, o processo permanece em avaliação", diz a nota.
Apesar da confirmação da morte, a Anvisa não esclareceu se o voluntário recebeu uma dose da vacina ou de placebo. Além disso, a agência ressaltou que os dados de voluntários são mantidos em sigilo devido aos princípios de confidencialidade do estudo, destacando que "cumpriu, cumpre e cumprirá a sua missão institucional de proteger a saúde da população brasileira".
O responsável pelos testes no Rio de Janeiro, o Instituto D'Or de Pesquisa e Ensino (Idor), por sua vez, explicou que, "seguindo normas internacionais de pesquisa clínica e respeitando os critérios de confidencialidade dos dados médicos, não pode confirmar publicamente a participação de nenhum voluntário no estudo clínico com a vacina de Oxford".
O Instituto brasileiro ainda informou que "todas as condições médicas registradas foram cuidadosamente avaliadas pelo comitê independente de segurança, pelas equipes de investigadores e autoridades regulatórias locais e internacionais", após a "inclusão de mais de 20 mil participantes nos testes ao redor do mundo".
De acordo com a entidade, até o momento, conforme uma análise rigorosa dos dados colhidos, não há dúvidas com relação à segurança do estudo, no qual 50% dos voluntários recebem o imunizante produzido por Oxford. No Brasil, já foram vacinados aproximadamente 8 mil voluntários.
Uma pesquisa com resultados preliminares da vacina de Oxford (AZD1222), publicado no dia 20 de julho, na revista científica "The Lancet", revelou que os testes em análises não apresentaram efeitos colaterais graves, apenas leves e moderados.
Análise técnica
A direção da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) afirmou em entrevista coletiva hoje (21) que a análise de vacinas contra o novo coronavírus será técnica, independentemente do laboratório e do país de origem do tratamento.
Segundo a Anvisa, a análise de qualquer vacina será realizada de acordo com os parâmetros científicos e técnicos definidos neste procedimento. A agência analisa a segurança da substância e sua eficácia, visando avaliar se o tratamento traz resultados e se pode implicar em efeitos colaterais que coloquem a saúde ou a vida das pessoas em risco.
O presidente da Anvisa, Antônio Barra, afirmou que não cabe à agência adiantar posições ou análises sobre as vacinas nem apresentar previsões de calendário ou de quando uma substância estará disponível à população. A prerrogativa do órgão, reforçou, é examinar os pedidos de registro e as informações científicas apresentadas para embasá-los.
“A ação que esta agência tem no caso concreto dos protocolos vacinais é de aferição do desenvolvimento garantindo ao final do processo a qualidade, segurança e eficácia. A Anvisa não participa de compra feita pelo governo de medicamento ou insumo. As políticas públicas são do MS. Para nós pouco importa de onde vem a vacina. Nosso dever é fornecer a resposta se produtos induzem ou não à imunidade e se vai combater o coronavírus”, destacou Barra.
A diretora da Anvisa Alessandra Bastos declarou que a agência está atuando para avaliar os pedidos que chegam relacionados à covid-19, mas mantendo a segurança e as exigências dos protocolos. “Nossos técnicos avaliam se aquela fábrica está funcionando e que nessa vacina, independentemente de sua origem, seja produzida dentro de boas práticas de fabricação”, comentou.
Senadores criticam o governo
O recuo do governo na compra da vacina Coronavac foi motivo de críticas de vários senadores. O presidente da República, Jair Bolsonaro, desautorizou o Ministério da Saúde, que havia anunciado nessa terça-feira (20) a compra de 46 milhões de doses da vacina contra o coronavírus produzida pelo Instituto Butantan em parceria com um laboratório chinês. Os senadores classificaram o recuo como "estupidez", "falta de conhecimento" e até "atentado contra a saúde pública".
Na visão da senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA), a decisão de desautorizar o Ministério da Saúde a comprar a vacina chinesa “beira a estupidez”. Ela disse que desprezar uma vacina eficaz apenas em razão do país que a produz é menosprezar a vida. Para a senadora, politizar a saúde pública é irresponsabilidade. “Queremos a cura da doença”, concluiu Eliziane, em sua conta no Twitter.
O senador Fabiano Contarato (Rede-ES) também foi ao Twitter para afirmar que “é atentado à saúde pública o descaso do presidente [Bolsonaro] com a vida dos brasileiros”. Segundo o senador, a vacina contra o coronavírus é medida obrigatória, “não importa de que país venha”. Ele ainda disse que “vidas humanas não são números nem podem ser ameaçadas pela irresponsabilidade de governantes”.
Randolfe Rodrigues (Rede-AP) apontou que “além de demonstrar a falta de conhecimento e de empatia com a vida das pessoas, chamar a vacina de ‘vacina da China’ é xenofobia”. Ele lembrou que vacina Coronavac está sendo produzida em parceria com o Instituto Butantan, respeitando testes criteriosos. Para o senador, a atitude do governo, “mais do que ignorância, é desonestidade”.
— A vacina, além da vida, é a libertação. É nos livrar da máscara, é podermos nos encontrar novamente. Não pode haver controvérsia sobre essa vacina. Não pode haver controvérsia sobre a vida — afirmou o senador.
Pelo Twitter, Randolfe fez um apelo direto a Jair Bolsonaro: “Presidente, deixe as diferenças para depois. Já perdemos muito e vamos perder mais, caso não assumas teu posto de liderança. Além da pandemia, já estamos em uma crise econômica grave. Supere as questões pessoais, vamos lutar pela vida! Libere a vacina ao povo do país!”
Na opinião do senador Humberto Costa (PT-SE), que é médico, Bolsonaro coloca os interesses pessoais e ideológicos acima da vida dos brasileiros. Em sua conta no Twitter, Humberto disse que “o cenário que ele quer é de um país onde o povo passe fome e continue sendo fortemente atingido pela covid-19”. Segundo o senador, “seguimos sem ministro, sem vacina, sem um plano para sair da crise”.
Humberto Costa destacou que “Bolsonaro brigou para dar cloroquina ao povo e agora vai interromper a compra da vacina. Enquanto isso, a covid-19 continua matando milhares de pessoas”. Para o senador, Bolsonaro nunca ligou para as vidas perdidas. Ele classificou o recuo do governo como “mais uma atitude criminosa do presidente que coloca a política acima da vida” e pediu “Fora Bolsonaro”.
Também pelo Twitter, o senador Weverton (PDT-MA) registrou que “todos temos muita expectativa para a chegada da vacina do coronavírus, para que tudo volte ao normal e tenhamos tranquilidade. Não importa se venha da China ou onde for”. Ele disse que “ideologia, teorias da conspiração e disputa política não podem ficar acima disso”, pois “precisamos defender vidas!”.
Na mesma linha, o senador Jean Paulo Prates (PT-RN) lamentou o “egocentrismo” de Bolsonaro. Pelo Twitter, ele disse querer “lembrar ao presidente que a população brasileira está acima de qualquer questão, principalmente política e ideológica”. O senador afirmou que “Bolsonaro deveria pensar mais na população e não enterrar as esperanças do povo brasileiro de um capítulo final para essa pandemia”.
O ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, havia anunciado nessa terça-feira (20) a intenção de comprar 46 milhões de doses da vacina Coronavac, produzida pelo Instituto Butantan em parceria com o laboratório chinês Sinovac. O Butantan tem sede na capital paulista e larga experiência na produção de vacinas. Durante uma reunião com representantes de vários estados, o ministro chegou a falar que a vacinação iria começar em janeiro. Vários governadores comemoraram a decisão do governo. Senadores como Humberto Costa e Randolfe Rodrigues também celebraram a possível compra da vacina.
Nesta quarta-feira (21), porém, o presidente Jair Bolsonaro desautorizou o ministro da Saúde, ao negar a compra do que chamou de “vacina chinesa de João Dória”. Ele disse não abrir mão de sua autoridade. Ao responder seus apoiadores no Twitter, Bolsonaro disse que “para o meu governo, qualquer vacina, antes de ser disponibilizada à população, deverá ser comprovada cientificamente pelo Ministério da Saúde e certificada pela Anvisa”. Ele ainda registrou que o “povo brasileiro não será cobaia de ninguém” e afirmou que sua decisão “é a de não adquirir a referida vacina”.
Em entrevista coletiva em Brasília na manhã desta quarta-feira (21), o governador de São Paulo, João Dória (PSDB), disse que a Coronavac é a vacina mais avançada no país e lembrou que o Instituto Butantan tem 120 anos de existência, é o maior produtor de vacinas do Brasil e conta com grande prestígio internacional. De acordo com o governador, a volta ao normal ocorrerá com a vacina, e se possível com “as vacinas”.
— A vacina do Butantan é a vacina do Brasil, é a vacina de todos os brasileiros. Não classificamos vacina por razões políticas, ideológicas ou eleitorais. Não é a ideologia que vai nos salvar, é a vacina — declarou Dória, lembrando que cerca de 700 cidadãos estão morrendo diariamente em razão da covid-19.
Na mesma entrevista coletiva, o senador Izalci Lucas (PSDB-DF) disse que é preciso investir mais na ciência. Ele destacou que a vacina não é um “milagre”, mas resultado de investimento em pesquisa e inovação. O senador ainda defendeu o acordo para a compra da vacina Coronavac por parte do Ministério da Saúde, como forma de beneficiar todos os brasileiros.
— Não podemos tomar posição política e ideológica em relação à vacina. Defendemos todas as vacinas, mas a do Butantan deve ser a primeira [a ficar pronta] — afirmou o senador.
O secretário de Saúde do Estado de São Paulo, Jean Gorinchteyn, declarou que o Brasil tem o melhor e maior programa de vacinação gratuita do mundo. Ter um programa rico de vacinação, destacou, é um indicativo de desenvolvimento. Segundo informou o secretário, o Butantan é responsável por 75% dos programas de imunização no país. No caso da vacina contra a gripe, esse número é de 100%. O secretário disse que esse caráter nacional não haverá de ser diferente no caso da vacina contra o coronavírus. Ele admitiu que o coronavírus "veio para ficar" e que será necessário vacinar a população anualmente.
— O Butantan não é de São Paulo, é de todos os brasileiros. Essa vacina vai permitir que as pessoas parem de morrer — afirmou.
O diretor-presidente do Instituto Butantan, Dimas Tadeu Covas, disse que a vacina está sendo produzida há quatro meses. Segundo Covas, há 2,5 mil pessoas trabalhando intensamente no instituto para que a vacina contra o coronavírus chegue logo até a população. Ele destacou ainda que a discussão neste momento é sobre o financiamento para a produção da Coronavac e admitiu que, se não houver recursos oficiais, o instituto vai procurar financiamento alternativo.
— Estamos com a vacina em fase final de desenvolvimento. Logo ela estará disponível. É preciso enfatizar: esta vacina é produzida no Butantan, com selo do Butantan — registrou Covas.