Em 6 de setembro de 2008, uma marca de preservativos masculinos lançou uma campanha que entraria para a história da publicidade. Fazendo uma alusão à data sugestiva (uma referência ao "meia-nove"), a propaganda protagonizada por homens admirando corpos femininos convidava os brasileiros a celebrar o “Dia do Sexo”.
A ideia pegou e é lembrada até hoje. Mas o que poucos se recordam é que ela reflete um conceito que perdura há séculos sobre o objetivo da relação sexual: que seria oferecer o prazer masculino.
“Nós vivemos ainda em uma cultura sexual castrativa, que faz com que as mulheres criem um bloqueio achando que o sexo é ruim e que não pode. Recebo muitas queixas sexuais relacionadas a isso, que estão ligadas também a falta de conhecimento ou porque nunca foi ensinado para ela o que é sexo e que ele pode e deve ser prazeroso”, afirma a uroginecologista especializada em sexualidade humana Lilian Fiorelli, do Hospital Israelita Albert Einstein.
A ideia do sexo relacionado ao prazer feminino é recente. Segundo a Carmita Abdo, Psiquiatra e Coordenadora do Programa de estudo em Sexualidade da Universidade de São Paulo (USP), o divisor de águas aconteceu nos anos 1960, com a descoberta da pílula anticoncepcional: “Com ela, começamos a perceber, que se a mulher vai fazer sexo pelo sexo, sem ser para reproduzir, é porque tem prazer”, afirma.
Mas apesar da evolução, o prazer feminino permanece um tabu. Uma pesquisa do Projeto de Sexualidade da Universidade de São Paulo (Prosex) realizada em 2016 mostrou que metade das mulheres brasileiras não tem orgasmo nas relações sexuais.
Mesmo na internet, que tem sido uma importante ferramenta disseminar informações, casos de restrições à discussão ainda são encontrados.
A médica do Einstein, por exemplo, alega que teve suas publicações sobre o assunto censuradas em uma rede social, que alegou “tentativa de promoção de conteúdo inadequado”. A postagem só foi liberada depois que a uroginecologista fez uma apelação à página.
"Hoje temos um conhecimento mais profundo e respeitoso em relação ao sexo do que no passado. Passamos de uma cultura reprimida para uma cultura exacerbada e machista, e agora estamos em uma cultura que busca mais esse equilíbrio do prazer entre o homem e a mulher”, comenta Lilian.
Benefícios do orgasmo
Relaxamento, bem-estar, melhora da função cognitiva, autoconhecimento, autoestima e prazer. Esses são alguns dos benefícios que um orgasmo pode proporcionar. Mas o que explica esse sentimento que ainda sobre resistência, mesmo nos dias de hoje?
Como explica Carmita Abdo, o orgasmo é a terceira fase do ciclo da resposta sexual. Começa com o desejo, que é a vontade do ato com o parceiro ou sozinha. Depois vem a excitação, que é a modificação do seu corpo conforme você vai recebendo alguns estímulos.
Nela, há um aumento de batimentos cardíacos, pressão e temperatura do corpo, assim como aumento da frequência respiratórias e vaso dilatação. Com isso, se chega à terceira fase, que é o clímax ou o orgasmo, sendo um momento de extremo prazer, alívio da tensão, e que não dura mais de 15 segundos.
“É difícil ser descrito, mas quando sentimos sabemos que chegou, porque é uma fase de muito prazer, de intensa conexão entre os parceiros ou com si mesma, sensação de bem-estar e descontrole do corpo”, comenta Lilian.
A maioria dos orgasmos femininos não vem acompanhado de ejaculação, e podem ser múltiplos, caso continue com a estimulação. Entrementes, existe uma grande liberação hormonal, e dentre os principais hormônios estão a dopamina e ocitocina, que são os responsáveis por causarem uma sensação de relaxamento, de bem-estar e por ajudarem a diminuir o estresse.
“Não há meditação mais profunda, que te faça sentir, ser, e também libertar-se, e se conectar consigo mesma”, afirma a uroginecologista do Einstein. “Além disso, pode ajudar na melhora da percepção, atenção, memória, linguagem e funções executivas, como tomadas de decisões, a lógica, o raciocínio, as estratégias e as soluções de problemas”, acrescenta.
E, afinal, como "chegar lá"?
Autoconhecimento: conhecer seu próprio corpo, saber o que você gosta, quais pontos do seu corpo te dão mais prazer, além de criar uma relação consigo mesma, assim, aumentando a autoestima.
Permitir-se: a busca pelo orgasmo feminino, às vezes, é tão intensa, que a mulher fica o tempo todo pensando nele e não se permite aproveitar o momento e apreciar cada fase do prazer.
Estímulos: podem ser visuais, mas para a mulher o que mais funciona é a “pegada”, o beijo, o abraço, que acaba instigando a excitação. Além de outros estímulos, como fantasias sexuais, olfato, paladar, audição e tudo que possa contribuir com a excitação.
Não se cobrar tanto: iniciar a vida sexual exigindo de si mesma um orgasmo simultâneo com o parceiro e em todas relações, não é nada positivo, pois nem sempre vai acontecer sincronicamente. É importante aceitar e negociar como vai ser a sequência, quem é mais rápido, quem é mais lento, até que a intimidade faça com que esse casal tenha um início, meio e fim mais equilibrado.
Educação sexual: se a mulher é educada sexualmente ela não cria mecanismos internos de desvalorização, começa a entender como ela pode se impor no relacionamento, entendendo seu direito de exigir que seus limites sejam respeitados, e se realmente ela está interessada naquele momento e naquela pessoa.
E por último: o orgasmo é um só. A diferença é só no estímulo, e o que mais funciona para as mulheres é no clitóris. O orgasmo intravaginal, é possível, porém raro. Somente 18% das mulheres conseguem, segundo um estudo publicado no The Journal of Sex and Marital Therapy. Por isso, é importante saber qual a parte do seu corpo que mais funciona para você para facilitar que o orgasmo ocorra.