Escritos

Dia de fogueira

E quando nada parecia restar para atearmos fogo, descansa

Foto: pxhere/Creative Commons

Toquei. Toquei fogo como muito queria tocar.

O fogo se alastrou de forma linda, com seu calor uivante, suas chamas de consumição, sua paixão desenfreada de eloquência vasta, toquei o fogo como os artistas da grande ópera e me vi rindo ao ver queimar todas as roupas, todos os pertences, todas as angústias do eu perdido que não me serve.

Vi cintilar as brasas do orgulho, vi o medo gemendo, vi a falsidade saltitando em meio às faíscas do ódio e da solidão.

Foram tantas labaredas que não cabiam em uma fogueira e dancei, dancei como dançavam os maias em volta do grande deus fogo. E chamei todos os que não deveriam ser transformados em cinzas, veio o amor, o carinho, a amizade, a esperança com seu vestido verde, a paz quis sobrevoar, mas pedi delicadamente que ela bailasse comigo a linda canção e depois tomamos um a mão do outro e rodopiamos, felizes, leves.

Foi então que percebemos a inveja querendo fugir e a devolvemos ao braseiro junto com os excessos, as injúrias e o tédio, novas flamas subiram, o fogo alimentado e suas cores inebriantes.

E quando nada parecia restar para atearmos fogo, descansamos, fizemos um pacto de não deixar as ervas daninhas voltarem a crescer e brindamos com o tempo.

Foi então que lembramos da ganância, da deslealdade e a mentira. Foi daí que o incêndio se redobrou, o medo quis ressurgir das cinzas, mas a fé e a coragem vieram e jogaram a lamúria por cima e nada mais restou, era só fogo e brasas.

Exauridos, mas alegres começamos a nos juntar para retomarmos o prumo e o rumo, quando a chuva nos abençoou lavando as cinzas e logo o arco-íris coloriu o céu.

Hoje acordamos mais certos, mais sabidos do presente e futuro. O amor divide seu reino com outros tantos sentimentos bons.