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Sempre fui o filho, o neto, o afilhado, o protegido, o que está acostumado a receber. E, como sintoma do nosso tempo, sempre estou com a cabeça no futuro ou no passado. Quase nunca no presente.
Não vou dourar a pílula da paternidade, até porque não existe medalha de ouro ou de latão pra pai. Como naquele comercial de requeijão em que a mãe fica com o copo, o pai divide o copo vazio com a mãe.
Quando minha filha Valentina nasceu, o horário que ia dormir, passou a ser a hora de acordar. Eu tinha acabado de completar 40 anos.
Nunca imaginei confiar em alguém com mais de 30, ou 32 dentes. E aquele bebê dependia de mim. Meu mundo girou 180 graus. Quando minha filha tinha cólicas, eu também sentia dor. Dor e impotência.
Aprendi que o mundo não gira ao redor do meu umbigo. Talvez tenha sido a maior descoberta. E quando Valentina ficava no chão, explorando o novo mundo, nem no futuro e nem no passado, mas no presente, no agora, eu tava ali com ela, com minha filha, sentindo-me o ser mais privilegiado do universo.
Quando fui ensiná-la a lavar as mãos, ela riu tão gostoso, com o sabão e a água gelada. E, em muito tempo, lavei minhas mãos pela primeira vez.
Depois veio Isadora. A Dodó, minha segunda filha. Tive que esquecer tudo que aprendi sobre paternidade. E eu tinha aprendido quase nada. E havia outro ser humano ali.
Andou com 9 meses, não queria ficar pra trás. "Papai é o lobo, able o olho, papai". Me acordando pra brincar, pra vida. Ela troca "r" por "l". E eu digo: "Já acordei, filha". E ela me intima: "Acorda de pé, papai". E lá vou eu. Porque o amor é uma eterna vigilância, é vigília. É o pousar num movimento de corrida de patinete.
Paternidade é um estar presente esquecendo de si. Não é segurar água nas mãos, é senti-la escorrer pelos dedos. E ter a certeza de nossa finitude. É oração. É poesia. É sacrifício. É dar a vida pelo filho (a) sem pestanejar, sem receber nada em troca, e, muitas vezes, sem reconhecimento.
Pai não é promovido. É ter como núcleo a doação. E ficar feliz com isso. É viver um dia de cada vez como um viciado em recuperação. No anonimato. É errar. É aprender. É a pureza do principe Michkin como principio de vida.
O que é ser pai ou o que é a paternidade? Eu não sei. Eu tô aprendendo.