Helô Sampaio

Como preparar um pavê de cachacinha

Sobreviveram? Está todo mundo inteiro depois do Carná? Eu caí fora do fuzuê, fui para o interior – Itabuna, Ilhéus, Ibicaraí – descansar o espírito, aproveitando para matar saudade da família. Em Ilhéus, fiquei na praia da Tulha onde o celular ainda é um produto inacessível, acredita? Para se conseguir falar com alguém, tem que ir para a praia e rezar para o ‘vento’ ser favorável. Como se fazia com tevê algumas décadas atrás, no tempo da pedra lascada. Adorei. Nada de zapzap ou trimtrim. A gente volta para outro mundo, aquele em que ser humano fala, olha e se ‘liga’ no ser humano.

Mas lá a televisão funciona. E eu sou ‘paxonadinha’ em tevê, novela e noticiário. E fico feliz e cheia de orgulho ao ver os meus queridos ex-aluninhos, lindos, mandando bem o recado, informando com ética e precisão. Dá orgulho e alento ao coração. Todos convictos, profissionais. Não perco os informativos das tevês e tenho que fazer ‘mágica’ quando os horários coincidem. Me ‘viro’ nos intervalos para ver um e outro.

Não fico só nos noticiários: eu também requebro os quadris nos desfiles das escolas de samba ou no remelexo da galera da ‘pipoca’ na Barra ou na avenida, em Salvador, em São Paulo ou no Rio. Tudo vale. Adoro ver a criatividade do meu povo, a alegria autentica - mesmo numa situação politica confusa e complicadíssima como a que vivemos. Ver o povão com o espirito solto na avenida, esquecido das contas, das aporrinhações, do trabalho, todo banzeiro, completamente entregue à esbornia tem preço não. Tô certa ou tô certa, fio?

O ano começou segunda feira, 26, para boa parte da população porque, para a maioria, vai começar mesmo é na primeira segunda feira de março, quando a gente limpa os olhos para enxergar as contas pra pagar, ‘fundar’ a cara nos jornais, tevês e bater pernas pelas agencias para encontrar trabalho, produto raro nos dias de hoje. Os ‘home’ lá de cima só pensam em tirar dinheiro das empresas para encher o bolso e a população que se lixe. Vota neles de novo, mané, que eles precisam enriquecer agora os filhos e netos.

Fico pensando que o povo brasileiro merece o que passa, pois é roubado e não reclama de nada. Trabalha muito, paga os maiores impostos do mundo e não recebe nada de volta: não tem assistência de saúde, não tem educação de qualidade e não tem segurança. Mas não protesta. Boa parte só vai pra rua quando recebe um sanduiche e um trocado para gritar ‘viva’ ou ‘fora’. Depois, volta para a vidinha miserável.

Xá pra lá, que um dia a coisa muda. Ainda bem que a vida no interior ainda está pacata (com raras e honrosas exceções). Lá, em Ibicaraí, ainda podemos sentar na porta da casa, andar na praça ou sair com os amigos á noite. Eu amo a minha cidade. Gosto de andar pelas ruas da minha infância, rever pessoas conhecidas (agora, encontro os filhos ou ex-alunos. Será que tô ficando véia?), parar trocar um dedo de prosa, ter noticias dos parentes (uma parte foi para grandes cidades ou capitais em busca de emprego; outros já voltaram para a casa do ‘pai velho’, lá em cima).

Fico muito orgulhosa porque o ‘ponto alto’ de Ibicaraí, agora, é a ‘praça meu pai’, oficialmente Praça Henrique Sampaio, que o prefeito Lula Brandão revitalizou, iluminou e deixou lindona. Todo mundo à noite, vai pra lá, conversa, revê os amigos, senta nos bancos, como eu fazia desde criança. Amei. E cá prá nós, não é orgulho para uma filha ter um pai amado pelo povo? Confessa aê, lindinho, se não é pra eu ficar faceirosa?

O melhor, são os convites para almoço ou prá ‘tomar uma’. Eu já bebi minha cota desta ‘encarnação’, da que passou e da que virá. Não bebo mais. Mas vou quando é para almoçar uma coisa gostosa. Isso eu não dispenso. Gosto de comer gostoso – em todos os sentidos. (E tire esse sorriso safadinho da sua cara, lindinho, que eu sou moça direita, não sou canhota). E quando o convite é pra comer no sitio de Cachacinha, vou na hora. O rango lá é de primeirissima qualidade.

Os nossos pais, as nossas famílias são amigas. Nós crescemos juntos. Aí, Cachacinha casou com Maria, neta de Caxingó, que era como irmão para o meu pai. Todos cozinham bem. Gente, a dobradinha estava simplesmente maravilhosa. Ah! E o pudim, sobremesa preferida do meu amigo, estava di-vi-no. Aí eu entendi porque Cachacinha, depois que casou com Maria, nunca mais saiu da linha: ficou sempre ‘fofinho’ (você já estava pensando em bobagem, não foi, bonito?). 

Eu pedi e Maria prometeu que fará o pavê como meu presente de aniversário, em junho. Não pense que eu sou glutona, é gostoso mesmo. Ponha o avental e vamos pra cozinha, que você vai preparar esta delícia, para saborearmos juntos. Passo a receita da forma como Maria me disse que prepara. Vamos lá.

Pavê de Cachacinha 

- Passar quatro gemas na peneira (para tirar a ‘pele’), 2 caixas de leite condensado (ela usa o nestlé) e 2 caixas de leite de vaca fervido. Misturar tudo e levar ao fogo, mexendo sem parar até ferver, pra não pegar no fundo. Retirar do fogo e colocar num pirex com tampa, pra não endurecer muito.

- Distribuir dois pacotes de biscoito champagne (ou maisena, se preferir) de forma a  cobrir todo o pirex.

- Misturar duas caixas de leite de vaca com aproximadamente quatro colheres (sopa) de nescau (de forma que fique bem ‘moreno’) e uma colher de maisena. Levar ao fogo para engrossar. Quando ferver, retirar do fogo e cobrir todo o pirex que já está com o biscoito champagna.

- Bater quatro claras em neve e misturar com uma lata de creme de leite. Finalizar colocando por cima do pavê, enfeitando com ameixas ou passas sem caroço, levando para a geladeira.

Saborear aguardando os aplausos carinhosos.