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"PT enfrenta fim de um ciclo e pagará por isso", afirma Geddel

Confira entrevista exclusiva à Tribuna da Bahia

O presidente do PMDB na Bahia e ex-ministro da Integração Nacional, Geddel Vieira Lima, foi um dos principais articuladores do rompimento do seu partido com o governo da presidente Dilma (PT). Nesse momento em que o impeachment da petista avança no Congresso Nacional, o dirigente é visto como um dos homens de força do vice-presidente Michel Temer, mas ele evita traçar cenário de um eventual governo peemedebista. “Se, eventualmente, o Temer me chamar para algum espaço próximo a ele nessa coisa de elaboração da discussão política, posso examinar com muita simpatia. Mas não tenho o desejo de voltar a participar com cargos no plano federal”, afirmou.

Em entrevista à Tribuna, Geddel também critica o discurso do PT de que o impeachment é golpe e diz que o projeto petista está indo à falência. O peemedebista diz ainda que governador Rui Costa terá o tratamento institucional que a Constituição determina e que “quanto menos vontade de criar problema que ele demonstre, certamente mais apreço terá de um eventual governo Temer”. 

Tribuna - Geddel, como você vê o discurso do PT e da presidente Dilma de que o PMDB está orquestrando um golpe?
Geddel Vieira Lima -
Isso é um discurso político de quem não tem condição de se defender claramente do crime de responsabilidade que cometeu indo contra a Constituição e contra a Lei de Responsabilidade Fiscal. Agora, é um discurso irresponsável, que não é verdadeiro e mancha a imagem do Brasil fora do país. Que golpe é esse que está escrito na Constituição, foi validado pelo Supremo Tribunal Federal e que na Câmara Federal a própria presidente Dilma, o ex-presidente Lula, se mobilizam para tentar vencer a votação, legitimando o processo.  Acho que a sociedade brasileira, fora aqueles militantes petistas que têm o dever de acreditar naquilo, mesmo que não acredite, não vai se envolver em um processo que respeita a democracia, a Constituição, pode devolver ao país esperanças perdidas.

Tribuna - Acredita que o Senado confirmará o afastamento da presidente ou pode acontecer alguma reviravolta?
Geddel -
Eu não creio. A tipificação do crime de responsabilidade fiscal é muito clara. Aliado a isso, a sociedade brasileira quer alguma luz para que o país possa sair desse estado letárgico em que se encontra com a economia paralisada, cerca de 248 demitidos a cada hora no Brasil. Estamos chegando a dez milhões de demitidos no país, falta investimento, uma dívida pública insustentável, um governo sem nenhuma iniciativa, sem credibilidade perante o mercado e à sociedade, os mais pobres se tornando mais pobre ainda com a inflação que o mais injusto dos impostos que podemos ter. Portanto, eu tenho convicção de que o Senado não só aprovará a admissibilidade do relatório que foi aprovado na Câmara, como após o prazo de julgamento confirmará o afastamento definitivo da presidente Dilma do cargo.

Tribuna – Sempre foi um dos maiores defensores do rompimento com o PT. Com Temer presidente, ganha ainda mais espaço nacional. Em que setor do governo acredita que pode ajudar mais?
Geddel -
 Veja bem. Primeiro, deixa eu lhe dizer uma coisa, eu estou muito feliz onde eu estou. Passei por perdas pessoais que me marcaram profundamente e não cicatrizaram. Tenho minha família, meus negócios pessoais, mas evidentemente me preocupo com o cenário nacional, que é de extrema gravidade. Seria hipócrita não reconhecer que tenho uma experiência que pode ser aproveitada. Sou amigo de Temer há 30 anos, somos amigos fraternos e pessoais. Tenho participado dessa fase de transição, desse período pré-impeachment, vamos assim dizer, levando ideias, cumprindo missões. Creia nisso, não tenho nenhuma ambição, por mais legítima que fosse, como já tive no passado, de ocupar espaços. Já fui um ministro operacional, aquele que está fazendo obras. Se, eventualmente, o Temer me chamar para algum espaço próximo a ele nessa coisa de elaboração da discussão política, posso examinar com muita simpatia. Mas não tenho o desejo de voltar a participar com cargos no plano federal.

Tribuna - Diante da crise econômica do país, defende a redução de ministérios com um formato de governo mais enxuto?
Geddel -
O ideal, às vezes, não possível. Mas acho que temos que trabalhar com uma redução de oito a dez ministérios, fazendo incorporação, com foco, para que você possa ter os poucos recursos disponíveis sendo otimizados na aplicação com qualidade, com uma reforma política imediata, com o fim da reeleição. Eu que fui a favor, vejo que não foi uma experiência que deu certo. Tem que fortalecer os partidos políticos. Reformas econômicas são absolutamente necessárias e acho que o governo tem que dar o exemplo cortando nitidamente na sua própria carne para readquirir credibilidade interna e conquistar a credibilidade internacional para que os investimentos voltem a ser feitos no país.

Tribuna - Quais os três nomes mais qualificados para assumir o Ministério da Fazenda?
Geddel - 
Eu tenho participado muito proximamente dessas discussões. Tenho conversado com o vice-presidente Temer de forma recorrente, mas quem está lendo essa entrevista me entenderá que seria impróprio eu falar de nomes agora até pela minha proximidade com o vice-presidente. Se eu abordo nomes agora, geraria especulações absolutamente inoportunas para esse momento. O que posso afirmar é, se confirmado o impeachment, o vice-presidente estará pronto para assumir e com ministério de grande nível apto a representar a sociedade brasileira.

Tribuna - Qual é, então, o principal desafio de um ministro da Fazenda nesse momento?
Geddel -
 Resgatar a credibilidade do país, propor medidas a curto prazo muito objetivas que sinalizem um governo que não será perdulário. Medidas que signifiquem um governo com foco, com objetivo, de maneira que os investidores, tanto nacionais como internacionais, voltem a acreditar na economia brasileira, voltem a investir na produção para que a gente possa enfrentar a grave dificuldade que tem pela frente gerando expectativas de que novos empregos serão criados em prazo razoável. Evidente que ninguém é ingênuo para imaginar que herdando um país literalmente quebrado se possa ter resultados com a rapidez que todos desejam. 

para que em 2018 a disputa se dê em outro clima e que o presidente eleito possa levar adiante aliado às profundas reformas retomando a estabilidade econômica, conquista que nós não podemos perder.          

Tribuna - É real o movimento que existe para Temer não tentar a reeleição?
Geddel -
 Como eu disse, uma das primeiras medidas que serão propostas é o fim da reeleição. Se o destino reservar a Temer esse fardo de enfrentar essas dificuldades nesse momento do país, ele tem que governar para a história com o olhar pela recuperação da economia, no aprofundamento das questões sociais para que, sem nenhuma demagogia, ajude a melhorar a vida dos mais pobres, olhando para esse país na perspectiva de fazer uma grande revolução na educação, com um quadro que surpreenda a todos e que tenha ideias para o futuro. Que tenha também olhar para a saúde pública, que é um tormento e precisa de sinalizações para ser resolvida.

Tribuna - Como vê a mobilização de setores aliados ao PT de se convocar nova eleição direta?
Geddel -
É um discurso diversionista. Aí sim, é golpe. A Constituição tipifica todas as alternativas. Fazendo um retrospectivo histórico, até para condenar esse tipo de posição de setores do PT: no colégio eleitoral que elegeu Tancredo Neves, o PT considerava que era ilegítimo, que era golpe, não participou para não legitimar. Na Constituição de 88, acha que era ilegítimo, não assinou a Carta Magna para não legitimar. No governo Itamar Franco, eles consideraram que era ilegítimo, não participaram para não legitimar. Agora, o impeachment, que eles dizem que é golpe, que é ilegítimo, o ex-presidente Lula montou um bunker em um hotel caro em Brasília para tentar cooptar deputados. O governo ofereceu ministérios como galinhas gordas para cooptar deputados. Participaram, votaram, discursaram na Câmara e foram derrotados. Eles legitimaram esse processo. A sociedade brasileira não vai aceitar manobra diversionista. 

Tribuna - Eduardo Cunha no comando da Câmara tira legitimidade do processo de impeachment?
Geddel -
Eduardo Cunha é um problema, hoje, do Conselho de Ética e do Supremo Tribunal Federal. As pessoas, por vezes, ficam tentando fazer esse discurso para constranger quem é do PMDB. Eu não posso fazer nada com Eduardo Cunha, não sou a Justiça. Então, essa é uma questão do Supremo Tribunal Federal, que está julgando e apreciando assuntos relacionados a Eduardo Cunha, e o Conselho de Ética na Câmara. Essas duas instâncias devem se posicionar a respeito do deputado Eduardo Cunha.

Tribuna - Há, de alguma forma, ameaça à condução da Operação Lava Jato hoje no país?
Geddel -
 Você acha que realmente que uma operação que está sendo levada pelo Ministério Público, que tem sua independência estabelecida na Constituição, uma ação que está a cargo de investigadores da Polícia Federal, dá para se estabelecer controle sobre isso? Eu acho que dá para se ter o cuidado de acabar misturando o joio do trigo. Você não pode, por exemplo, misturar alguém que foi eventualmente citado por uma relação, por uma coisa qualquer, com aquele que comprovadamente recebeu recursos ilícitos em contas suas. São esses cuidados, mas também cuidados com os próprios instrumentos constitucionais, a própria democracia, a regulamentação da mídia, da sociedade, sempre vai se impor no momento oportuno. No mais, é outro discurso diversionista. Tem determinados fatos que quando ganham perna, perdem a cabeça. A Lava Jato já ganhou perna própria, não há cabeça capaz de ficar controlando, porque isso não é coisa que a sociedade aceite. Até porque a Operação Lava Jato tem vida própria.

Tribuna - Qual é a sua visão sobre a Lava Jato?
Geddel Vieira Lima -
A única visão é a que a democracia permite. É que se investigue, se dê o direito de defesa e quem, comprovadamente, tiver culpa nesse cartório, tem que ser exemplarmente punido. E quem, ao final, não tiver culpa, tem que ser exemplarmente resgatado para não ter indelevelmente sua imagem maculada sem culpa no cartório.

Tribuna - Com a força que o PMDB passa a ter agora no eventual governo Temer, vocês cogitam participar do jogo sucessório em Salvador de uma forma mais intensa?
Geddel Vieira Lima -
 Como eu disse anteriormente, o eventual governo Temer tem que focar na história. São imensas as responsabilidades que serão jogadas em um eventual governo Temer, porque o país está quebrado, vive uma crise ética, política e econômica da maior gravidade. Eu já tenho algum tempo de vida e posso afirmar que nunca vi isso. Mesmo pesquisando nos livros de história, não vejo momento que o Brasil tenha atravessado como esse. Vamos participar do processo político em Salvador, no interior da Bahia, em outros estados com o mesmo artifício político com que sempre participamos. Não há espaço para se imaginar que uma eventual ascensão de Temer vá gerar uso de máquina na eleição para se fortalecer. Até porque a sociedade não aceita isso. Nosso desafio é exatamente outro, é desaparelhar o Estado, mostrar que se pode fazer diferente. Se essa oportunidade surgir, não será permitido a Temer, nem àqueles que estiverem perto dele, errar.

Tribuna - Uma conjuntura com o PMDB no Palácio do Planalto, ele se fortalece para 2018 aqui também. Há um entendimento sempre com o DEM, PSDB?
Geddel Vieira Lima -
Nós temos uma aliança que hoje na Bahia está sendo liderada pelo prefeito ACM Neto. A preservação dessa aliança não dependerá de um eventual fortalecimento ou não do PMDB a nível nacional. Ela dependerá muito mais da habilidade do prefeito ACM Neto na condução dela. Tanto como eu tenho tido com ele uma fraterna convivência, um diálogo muito claro, da mesma forma tenho com lideranças do PSDB e de outros partidos. Eu creio que a tendência absolutamente natural é a preservação desta aliança para agora e para 2018.

Tribuna - Fala-se que a Bahia tem muito a perder com a saída da presidente Dilma. Quais os canais que o governador Rui Costa teria? 
Geddel Vieira Lima - 
Em acontecendo isso, quem tem muito a perder é o PT, a Bahia não. A Bahia terá muito a ganhar. Um governador que está se reunindo com sua equipe para tratar de retaliações à posição do prefeito ACM Neto e a de outros adversários políticos, a visão nossa é muito clara, é a Bahia. Os governantes passam. Evidentemente que Temer na Presidência, dentro das dificuldades econômicas que se enfrentará, a Bahia terá sempre tratamento privilegiado, sempre que eu estiver por perto, já mostrei isso. Me acusavam exatamente de privilegiar a Bahia. O governador Rui Costa terá o tratamento institucional que a Constituição determina, e quanto menos vontade de criar problema que ele demonstre, certamente mais apreço terá de um eventual governo Temer. O prefeito ACM Neto terá o acesso de quem foi colega de Temer, de quem é amigo dele, de quem é participante de uma aliança com o PMDB no estado da Bahia também.

Tribuna - Nesse cenário de instabilidade política e crise econômica, obras que estão em curso como metrô, avenidas estruturantes, correm algum risco de ameaça?
Geddel Vieira Lima -
 O metrô é uma parceria público-privada e a empresa tem o interesse de acelerar o máximo possível essa obra para que ela possa ter seus ganhos. Evidentemente, que não vejo nenhuma razão para se diminuir ritmo de obras, salvo se eventualmente for constatada alguma irregularidade, como vi que retomaram agora questões relativas à Arena Fonte Nova. Eu já denunciava lá atrás e agora o Tribunal de Contas do Estado volta a abordar esse tema. Não tendo nenhuma irregularidade que mereça registro ou algo que macule uma administração, não vejo porque se diminuir ritmo de obras que são importantes para a Bahia. Muito pelo contrário, é contornar dificuldades para se começar outras.

Tribuna - O PT vai sofrer o impacto da crise no país já nas próximas eleições? Qual a sua expectativa para esse pleito?
Geddel Vieira Lima -
 A minha expectativa é que, sendo candidato e montando uma aliança forte em Salvador, o prefeito ACM Neto terá uma eleição consagradora no primeiro turno e que essa aliança possa avançar em vitórias no interior do estado ou em consolidação de lideranças.

Tribuna - Essa crise nacional vai causar um estrago muito grande no PT?
Geddel Vieira Lima -
Eu acho que o PT enfrenta o fim de si, que quase termina nas eleições passadas, quando venceram com uma margem muito apertada utilizando da máquina pública. É o fim do ciclo, isso acontece nas democracias. É o fim de um processo de desgastes e o PT pagará por isso. Evidentemente, eles terão que tentar se reinventar para conquistar espaço na sociedade brasileira além daqueles que tradicionalmente eles têm. Eles possuem esses ditos movimentos sociais, sobretudo movimentos subsidiados com verba pública do governo federal. Acho que demandará algum tempo para que eles possam voltar a ter crédito, franquia com a sociedade. Isso é próprio das democracias.

Tribuna - Em um eventual governo Temer, o PT já anunciou que vai dar muita dor de cabeça...
Geddel Vieira Lima -
 Olha, se for dor de cabeça dentro da lei, não há nenhuma dificuldade para se conviver com isso. Se for fora da Constituição, existem instrumentos de Estado para que a ordem permaneça vigendo nesse país e haverá autoridade para fazer prevalecer a Constituição. Portanto, é mais um discurso de quem está vendo seu projeto falir e que naturalmente se debate. Nesse período, inclusive, não vi, apesar de toda a movimentação, a antiga capacidade de mobilização do PT para levar o povo às ruas. Deixe eu dizer uma coisa, o PT perdeu aquilo que achava ser exclusividade deles, para levar o povo às ruas. O povo hoje se mobiliza por outros instrumentos, por outros meios e tem clara capacidade de discernimento.

Colaboraram: Aparecido Silva e Fernanda Chagas.