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Afonso Florence nega negociação em troca de apoio para a presidente Dilma

Ele negou que seja pré-candidato à prefeitura de Salvador

O líder do PT na Câmara, deputado federal Afonso Florence, negou, em entrevista exclusiva à Tribuna, que o governo esteja negociando cargos com partidos aliados em troca de apoio contra o pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff. Segundo ele, a oposição “desesperada” usa esse discurso para dar “golpe” no país. 

“Não tem barganha, não tem troca-troca. Isso é a oposição percebendo que não tem legitimidade para o impeachment e procuram uma saída para justificar o porquê o impeachment não passou. Aí vão continuar fazer a disputa política, porque não se conforma de ter perdido a eleição”, afirmou.

Com total otimismo, Florence detacou: "Tenho convicção de que vamos rejeitar o pedido. Para aprovar crime de responsabilidade tem que ter consistência jurídica, e não só política. E não há provas de crime de responsabilidade. Por isso, impeachment é golpe". Ainda na entrevista, o petista falou sobre eleições municipais deste ano. Ele acredita que todos os partidos serão impactados pela crise política. E negou que seja pré-candidato à prefeitura de Salvador.

Tribuna da Bahia– Como o senhor avalia o processo de impeachment contra a presidente Dilma? O senhor acredita que o governo terá sucesso na Câmara?
Afonso Florence –
Tenho convicção de que vai ter sucesso. Se não conseguir rejeitar na comissão, perde apertado. Mas eles precisam de 2/3 e no plenário da Câmara não vão conseguir. Por isso, tenho convicção de que vamos rejeitar o pedido. Para aprovar crime de responsabilidade tem que ter consistência jurídica, e não só política. E não há provas de crime de responsabilidade. Por isso, impeachment é golpe.

Tribuna – Como o senhor avalia o rompimento do PMDB? O partido errou ao pressionar o Planalto?
Florence
– Primeiro, é importante dizer que houve pedido de impeachment contra FHC, Lula e Dilma. E os presidentes da Câmara, com base na legislação vigente, rejeitaram. Esse pedido acatado pelo presidente Eduardo Cunha foi parte de uma ação política para desestabilizar. Todas as agências de classificação de risco que rebaixaram o nível de grau de investimento acusaram a crise política como motivo. Então, Eduardo Cunha, DEM e PSDB começaram a trabalhar com “pautas-bombas” e do impeachment desde o início de 2015. Não posso acusar o PMDB todo. Mas, o PMDB da Bahia apoiou a Aécio, e não podemos exigir que quem apoiou Aécio dê toda a sustentação a Dilma. Entretanto, o presidente da Câmara fez um movimento nacional e a imprensa cobriu, exigindo que o PT o apoiasse com relação às delações premiadas e às provas arroladas pelo procurador-geral da República e encaminhadas ao Supremo. E o PT e o governo nunca aceitaram. No dia que foi votado o processo admissibilidade, ou seja, pela possibilidade de Eduardo Cunha ser investigado, o PT votou a favor.  Aí ele acatou o processo de impeachment que nunca teve base legal. É apenas a publicação de decretos presidenciais, que Michel Temer também fez, e não tem nada a ver com investigação de corrupção, Lava Jato e Petrobras. É gestão de orçamento, quando o Tribunal de Contas decidiu que não podia mais fazer, não teve mais nenhum. Então, não há crime de responsabilidade. Agora, com Aécio e Eduardo Cunha investigados, eles começaram a buscar uma solução de tentar recompor com um governo Temer uma agenda econômica conservadora, que retira direitos dos trabalhadores, e também uma tentativa de segurar as investigações. É o que a imprensa diz. Uma maioria do PMDB, com ausência de muitos parlamentares, tomou a decisão de sair da base. Acho que o erro do PMDB, do PSDB e do DEM é insistir em tentativa de impeachment sem crime de responsabilidade. Por isso é golpe.

Tribuna – Como o senhor avalia a atuação do Planalto, sobretudo, do chefe de gabinete, Jaques Wagner, e do ex-presidente Lula? Eles foram rápidos para conter essa debandada de aliados?
Florence –
O ministro Berzoini, na articulação política, o Wagner, na chefia de gabinete, e o advogado-geral da União, Eduardo Cardozo têm apresentado com muita consistência que não tem crime de responsabilidade. Parte do PMDB, defensora do golpe, tentou fazer uma debanda, mas não se concretizou. Em parte, porque não tem crime de responsabilidade. Em parte, porque no Brasil há hoje um grande movimento com passeatas, eventos em faculdades de Direito, artistas, intelectuais, inclusive, alguns opositores do governo Dilma, todos contra o impeachment. Em São Paulo, botaram para correr Alckmin e Aécio.

Sem dúvida a atuação deles, tem sido decisiva. Não tenho conhecimento de ação do ex-presidente  Lula.

Tribuna – Como o senhor vê as críticas de que o Planalto virou um balcão de negócios na tentativa de conter o sangramento do governo?
Florence –
Essa é uma acusação do desespero. Os governos são compostos por políticos, ou por indicações de políticos. Se alguém sai, outro tem de ocupar a vaga para o governo continuar a funcionar. Enquanto Eduardo Cunha, Michel Temer e seus aliados do PSDB e DEM jogaram para a crise política, o governo trabalha pela estabilidade política. Então, se há alguém exonerado, tem que ter alguém para ocupar. Óbvio, que não tem ser da oposição, mas sim da base do governo. Mas não houve até agora uma troca de ministro. É uma acusação que não se confirma. É desespero da oposição. Não tem barganha, não tem troca-troca. Isso é a oposição percebendo que não tem legitimidade para o impeachment, e procuram uma saída para justificar o porquê o impeachment não passou. Aí vão continuar a fazer a disputa política, porque não se conformam de ter perdido a eleição.

Tribuna – O momento mais tenso desta crise foi quando juiz Sérgio Moro divulgou conversa entre o ex-presidente Lula e a presidente Dilma. Houve um exagero de Moro ao tornar público o diálogo?
Florence –
Para mim, houve ilegalidade, porque o grampo não tinha autorização judicial. E depois divulgou dizendo que era de interesse da opinião pública. Não é um juízo isento. Depois ele deu declaração dizendo que se tocou com as manifestações dos oposicionistas, defensores do golpe. Mas ele não se tocou com a manifestação democrática que fizemos. Depois, ele ainda pediu formalmente desculpas ao Supremo, mas não pediu ao povo e ao país. O ato dele jogou gasolina na fogueira da disputa política. Foi uma atitude de quem vestiu a camisa do PSDB e do golpe. O erro dele tem uma magnitude muito superior do que ele reconhece. Tem que pedir desculpas ao povo brasileiro. Tinha que ter se comportado para termos um ambiente de paz social e não de confusão. O ato dele contribuiu para acirrar o ânimo.

Tribuna – A disputa jurídica politizou. Como o senhor tem visto esse processo de judicialização no país?
Florence –
O pleno funcionamento independente da Polícia Federal, do Ministério Público e da Justiça é bem-vindo. O que não pode é promotor, gestor público ou juiz agir fora da lei. A condução coercitiva do presidente Lula sem ele ter se negado a depor é um exagero. É uma ilegalidade. Ele tinha dado depoimento e se colocado à disposição para depor outras vezes. Então, tudo leva à conclusão de que foi um ato político. Foi um exagero. Os promotores de São Paulo que pediram a prisão alegaram que o ex-presidente se pronunciou politicamente. Tomaram uma decisão de cerceamento da liberdade política. Se não for uma ilegalidade, é no mínimo exagero. Esse tipo de coisa não contribui para a conjuntura política. Mas essa não é uma conduta geral das instituições. Quando o ministro Gilmar Mendes toma aquela decisão que anulou a posse de Lula, não quer dizer que o Supremo esteja errado. Que o Ministério Público esteja errado, mesmo dentro de um partido, se tiver alguém errado, não quer dizer que todos sejam. Temos que preservar as instituições.

Tribuna – Qual será a solução para crise? E quando acaba?
Florence –
Na minha visão, acaba após votado e rejeitado no plenário da Câmara o pedido de impeachment e depois do presidente Eduardo Cunha mudar a conduta dele. Ele sempre liderou o PSDB e o DEM, que apoiaram Cunha para presidência da Câmara. São do mesmo grupo político. 

Tem que parar de jogar “pauta-bomba” para desestabilizar o país.

Tribuna – Até quando Eduardo Cunha vai conseguir fôlego para se manter forte? E o que sustenta ele no poder?
Florence –
Ele parece ter muitos tentáculos nas instituições.  Se elegeu presidente, com apoio de muitos partidos, principalmente, do DEM, PSDB e PPS, que dizem combater a corrupção, sendo que têm muitos dos seus lideres sem ter condições sequer de falar em passeatas. Muitos deles citados em delação premiada e tentando obstruir as investigações. O Supremo, em muitos casos, age de forma rápida, imagino que as provas contra ele sejam robustas, de que ele será afastado. No Conselho de Ética da Câmara, vai demorar muito porque tem a maior bancada. Boa parte dos que vão votar a favor do impeachment é da bancada dele. Cunha lidera o PSDB e o DEM todo.

Tribuna – Cerca de 60% dos parlamentares já foram citados em envolvimento na Lava Jato. O senhor acredita que a Justiça vai atuar sobre todos eles?
Florence –
Tenho convicção de que gradativamente todos serão levados aos tribunais para se defender. Claro que a disputa política faz com que alguém como Aécio Neves, que tem citações em quatro delações premiadas, tenha processos arquivados. E alguém que é do PT ou da base aliada do governo, em uma delação premiada, já seja condenado. Seja quem for, Eduardo Cunha, Michel Temer, Aécio Neves ou do PT, citado em delações premiadas, é preciso que seja provada. Não estou dizendo que Aécio deve ser condenado, que ele é corrupto, que o PSDB ou DEM sejam... Mas tem que ser investigado. Quando tem do PT condena todo o PT, mas com relação a eles arquivam e não investigam.

Tribuna – Independente dessa disputa política, existem elementos de atos de corrupção por parte de pessoas da cúpula do PT. Qual a defesa diante disso?
Florence –
Não. O que existe são delações premiadas, como tem para Aécio Neves, para PSDB, por isso tem que investigar todo mundo. Com relação ao PT, isso não quer dizer que os filiados do partido sejam todos culpados também. Quem for acusado tem que ter o direito de defesa. A delação premiada por si só não condena. E tem quatro em relação a Aécio e nem por isso tem que prendê-lo sem substância de prova. Tem que ter tratamento igual. O Brasil não aguenta mais corrupção, mas tem que ter o respeito à lei.

Tribuna – É impossível que a eleição deste ano não tenha o impacto dessa crise política. O PT vai sofrer mais ainda pelo que a presidente Dilma tem enfrentado?
Florence –
De jeito nenhum. O governo da presidente Dilma tem dois problemas. A crise econômica mundial que repercute no país e o ataque golpista da oposição. Claro, que tem desgaste. Mas, o desgaste do governador do Paraná é muito grande, do governador de São Paulo, também. Então, o PMDB e PSDB vão responder pelos seus erros onde atuam. Na Bahia, nós temos o governo de muito sucesso administrativo na capital e em muitos municípios apesar da crise. Acho que o tema nacional vai inferir, mas outras variáveis também. Nós vamos continuar apresentando para o povo brasileiro, baiano e para estes municípios um projeto generoso para o povo. Vamos sair com muitas vitórias.

Tribuna – O PT ainda não tem um nome para disputar a prefeitura de Salvador. E o nome do senhor apareceu. O senhor é pré-candidato?
Florence –
Não, não sou pré-candidato. O PT em Salvador tem uma presença muito expressiva. Tem lideranças muito fortes como o deputado Valmir Assunção, o vereador Gilmar Santiago, o ministro Juca Ferreira e o secretário Pelegrino. O maior cabo eleitoral do lado do DEM e do golpe é o ACM Neto, que vai para reeleição. Do lado da luta pela democracia, é o governador Rui Costa. Uma decisão equilibrada do PT, com apoio da base aliada, pode nos levar a uma vitória. Temos bons nomes e eu não sou pré-candidato. Agradeço quem cogitou.

Tribuna – Há possibilidade de tirar o nome da deputada Alice Portugal e colocar a secretária Olivia Santana para ser a principal candidata do governo?
Florence –
Não tenho conhecimento desse movimento. Menos ainda que seja do governo. Alice Portugal é uma deputada testada e provada. Tem densidade política e eleitoral. Acho natural, agora, aparecer o nome de Olivia porque também é um nome testado e aprovado. Agora, o PCdoB tem autonomia para escolher sua candidata.

Tribuna – O que fazer para a gente conseguir sair desse momento de tensão do país e passarmos a ter mais zelo pelo dinheiro público?
Florence –
Fortalecer as instituições de controle. Fortalecer a liberdade de opinião. Todo veículo pode ter sua linha editorial, mas tem que ser equânime. Ministro, juízes, políticos, tem que passaram a ter condutas exemplares e respeitosas. Temos que coibir quem ataca lideranças de movimento social, ataques a negros, quem pratica racismo, quem persegue fisicamente homossexual para, enfim, vivemos em uma sociedade melhor.

Colaboraram Fernanda Chagas e Rodrigo Daniel Silva.