DESATIVADO / Entrevistas / Política

"O conselho vai opinar pela cassação do Cunha", afirma Carlos Araújo

Confira entrevista exclusiva à Tribuna

Presidente do Conselho de Ética na Câmara Federal, o deputado baiano José Carlos Araújo (PSD) reconhece que enfrenta um momento único na vida: presidir o colegiado que discute a cassação de um presidente do Legislativo. Em entrevista exclusiva à Tribuna, o parlamentar diz acreditar que Eduardo Cunha sofrerá perda do mandato no processo que tramita na Câmara. Araújo, no entanto, levantou o tom ao falar do PT enquanto aliado diante das eleições municipais deste ano:

“O PT é muito bom para receber apoio. Péssimo para dar apoio. Muito ruim para dar apoio. Ele quer sempre que apoie ele. Apoiar o outro é difícil”. O pessedista também não poupou o secretário de Relações Institucionais de Rui Costa, Josias Gomes: “Me dou muito bem com ele, mas ele não ouve as pessoas. Ele ouve o PT, nós aliados não somos ouvidos. Tem muitas queixas. Eu não vou a Josias. Não o procuro. Não ouve ninguém, não resolve nada”.

Confira entrevista completa:

Tribuna da Bahia - Deputado, é difícil estar à frente do Conselho de Ética, sobretudo em um momento em que a população gostaria de ver extirpados da vida pública políticos como Eduardo Cunha?
José Carlos Araújo -
Difícil todo trabalho é. Logicamente que no Conselho de Ética o trabalho tem sido muito maior porque não estamos julgando um deputado qualquer. Estamos julgando o presidente da Câmara, que logicamente tem implicações muito maiores tanto política como administrativa, ele toma conta da Casa, da máquina inteira. Então, tudo que se faz na Câmara tem que passar pela Mesa Diretora e isso está nos trazendo uma grande dificuldade.

Tribuna - O senhor anunciou que iria apresentar um recurso contra a decisão do STF, que adiou a continuidade da ação contra Eduardo Cunha. Em que ponto está essa questão?
Araújo -
Na verdade, recursos eu fiz muitos administrativamente. Na própria Câmara, apresentei questão de ordem mostrando que a decisão do vice-presidente Waldir Maranhão (PMDB-MA) foi uma decisão equivocada, uma decisão sem nexo, em cima de uma questão de ordem que não existiu de forma nenhuma e que não podia nem ser levada em consideração. Na verdade, a questão de ordem que ele pediu era vistas de um processo e que eu, de antemão, já tinha dito claramente que não era vontade minha dar vistas ao processo. Por quê? Porque o processo já tinha dado vista e numa questão de ordem anterior formulada por um deputado do DEM. Uma questão de ordem que foi feita em 23 de março de 2015 dizia claramente que se mudar o relator e o novo relator mantiver o relatório, só fizer complementação de voto, não é necessário dar vistas. Se mudar o relatório, aí sim, é necessário dar vistas. Como não mudou o relatório, mudou o relator e conservou o relatório anterior com complementação de voto, eu não gostaria de dar vistas. Um deputado se rebelou e outro deputado pediu vistas em um momento que não era para pedir vistas. Submeti a questão de ordem a voto e toquei, na hora que chegou a vez de falar, o deputado disse que era um absurdo e ia fazer um recurso à Mesa Diretora, à CCJ, e eu disse para ele ficar à vontade. Faça o recurso onde o senhor quiser. Ele esbravejou e saiu. Tive notícias no outro dia que ele deu entrada com recurso na Mesa e na CCJ, o mesmo recurso nos dois órgãos. É errado porque um corpo não pode sofrer duas penas ao mesmo tempo em lugares diferentes. Mas tudo bem. Levantei a questão de ordem no plenário corretamente dizendo ao presidente que a decisão foi esdrúxula, que não poderia ser tomada, mas ele não respondeu minha questão de ordem e tocou o barco. E eu, que sou disciplinado, aceitei tocar o projeto, mas sob protesto. Tanto é que agora foi ingressado no Supremo um mandado de segurança sobre essa decisão de Waldir Maranhão errada e pedindo para ser reparado e voltar à situação que estava o processo. Eles querem ganhar tempo. Isso não é possível, o Brasil inteiro reclama e temos que atender o povo.

Tribuna - O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, fez ao Supremo um pedido de afastamento das funções de presidente e do mandato do Eduardo Cunha. O senhor acredita que o STF vai conseguir afastá-lo, já que o Congresso não conseguiu?
Araújo -
Tudo é processo legal. O Conselho de Ética não conseguiu afastá-lo ainda porque não chegou o tempo. A fruta só dá no tempo certo. Eu tenho prazo para concluir o processo. Acredito que quando concluir, o conselho vai opinar pela cassação do Eduardo Cunha, dadas as evidências claras, não estou pré-julgando, são muito claras. O próprio Janot, estivemos com ele, nos mostrou indignação com o que está acontecendo. Logo depois que estive com Janot, dez dias depois ele pediu o afastamento do presidente da Câmara. Um afastamento de presidente da Câmara é uma coisa traumática, sabemos que é muito difícil acontecer. Nunca houve isso, mas também nunca houve um julgamento no Conselho de Ética de um presidente da Câmara. E está acontecendo. Então, tudo pode acontecer. Eu acredito que anulando essas decisões do Waldir Maranhão, que acreditamos serem decisões do Eduardo Cunha, que ele se afaste como suspeito, mas mande seu primeiro vice responder. É óbvio que ele está por trás disso tudo. A nossa tentativa, e acho que vamos ter êxito, é desfazer o que Waldir Maranhão fez. Aí, voltaremos realmente ao ponto em que nós estávamos, ou seja, admissibilidade aceita, intimado o Eduardo Cunha, o prazo correndo e terá mais sete dias para apresentar sua defesa e iremos tocar o projeto normalmente até o final. 

Tribuna - O que dá tanta força para Eduardo Cunha?
Araújo -
O que dá tanta força? É o terceiro na sucessão da Presidência da República. Se Dilma viajar, assume Michel Temer. Se Temer não puder assumir por algum motivo, assume Eduardo Cunha. Essa é a força. Ele é chefe de um poder por dois anos, é muita coisa, e isso pode incidir no destino do país.

Tribuna - A tropa de choque dele é mantida coesa com base em que, pelo que o senhor escuta no Congresso?
Araújo -
No Congresso, tem conversa que faz trepidar todo o concreto que foi usado na construção do próprio Congresso Nacional. Até me sinto assombrado sobre o que se fala de Eduardo Cunha ter tanto poder com mais de 100 deputados fazendo a vontade dele.

Tribuna - A gente acompanhou a disputa recente no PMDB com a vitória do Leonardo Picciani para líder do partido na Câmara. Esse tensionamento do partido contamina as outras bancadas na Câmara?
Araújo -
Contamina. Se Eduardo Cunha tivesse feito líder, ele estaria muito mais forte. Ele sofreu duas derrotas na semana que passou. Sofreu a derrota com a eleição de Picciani, uma derrota de fato muito forte, até porque se ele tivesse feito líder, seria esse quem indicaria membros da CCJ e provavelmente o presidente da comissão. Logicamente, o fato dele ter sido derrotado influencia entre os demais deputados.

Tribuna - Em relação ao processo de impeachment da presidente Dilma, o senhor avalia que o processo perdeu força ou ela conseguiu se fortalecer?
Araújo -
O processo perdeu força, no meu entender, porque o processo contra Eduardo Cunha no Conselho de Ética é a coqueluche do momento. É o que mais se fala. Isso enfraqueceu o impeachment. Com isso, a presidente aproveitou o vácuo e freou o impeachment com a vinda do recesso, que também ajudou a resfriar. Agora, sob pretexto do Aedes aegypt, a presidente começou a viajar, botou ministros para viajarem, tudo isso colocou a presidente em evidência e se tornou mais forte. 

Tribuna - A chegada de Jaques Wagner na Casa Civil, de alguma forma, auxiliou no processo de distensionamento dessa crise política que estava existindo?
Araújo -
Sem dúvida nenhuma. Eu disse que antes de Wagner ir para lá que o Mercadante era o cara errado, no lugar errado e na hora errada. Naquela época, já se cogitava a ida de Wagner lá e eu disse, para a própria Tribuna, que ele era o homem certo, na hora certa, no lugar certo. Toda essa negociação que aconteceu ai agora para a eleição do Picciani foi articulação, lógico, que se o Planalto participou, foi através de Wagner.

Tribuna - Até quando o senhor acredita que a Câmara vai continuar paralisada e com ritmo que tem levado hoje de tensionamento entre Cunha e o Planalto?
Araújo -
Está paralisada porque Eduardo Cunha quer. Não indicou membros das comissões, não indicou a CCJ, a Casa está parada. A ele não interessa dar ritmo acelerado à Câmara. O que quer é votar matéria no plenário que enfraqueça o Planalto. É isso que está fazendo. Vem querendo derrotar o Planalto nas matérias que vão gerar desemprego e despesa para o Estado. Esse é o grande problema. Impostos e impostos. A carga tributária brasileira é a maior do mundo. Com isso, você vê o seguinte: um carro tem 60% de imposto, é um absurdo. O governo precisa gastar menos, a máquina é muito pesada. Isso vem trazendo problemas, o desemprego está aí. 

Tribuna - Vivemos uma crise política, financeira e uma crise de confiança que a população tem com a presidente Dilma. Ela vai conseguir reverter essa situação de descrédito?
Araújo -
As crises que você falou são verdadeiras, mas a maior é a crise política. É a crise dos políticos. Hoje eles não têm credibilidade. 


Tribuna - E por que todo mundo fala que precisa de uma reforma política, mas quando ela chega no Congresso Nacional não passa?
Araújo -
Esse é o problema. A Câmara é definida mais pelos líderes dos partidos. Aos partidos, talvez, não interesse essas coisas, porque perderão forças. Não é possível na Câmara que no plenário fale somente líder. Para um deputado falar é um trabalho. O debate é feito pelos líderes, nós damos procuração aos líderes e eles fazem o debate. Raramente um parlamentar, a não ser quando ele se inscreve para falar contra ou a favor de uma matéria, quando tem a palavra como líder para falar. Agora mesmo, o Eduardo Cunha não me deixou falar de forma nenhu   ma. Pedi tempo ao partido, o partido me deu tempo, não deixou eu falar. O partido me nomeou vice-líder e ele não me deixou falar. Fiquei lá por mais de três horas pedindo a palavra ele não me concedeu. Quem manda é o presidente. Fica difícil.

Tribuna - Como o senhor avalia as investigações que estão acontecendo no âmbito da Lava Jato? Há excessos na visão do senhor ou é uma operação necessária?
Araújo -
Todas as investigações que estão em curso são necessárias. Pode ser que uma ou outra coisa tenha acontecido com excesso, essas coisas acontecem. Você vê nas manifestações de rua, muitas vezes é necessária a repressão da polícia, e a polícia muitas vezes comete excessos. Mas o fato de a polícia cometer excesso não quer dizer que a repressão não fosse necessária, é necessária. Mas excessos são cometidos.

Tribuna - As investigações atingirão diretamente o ex-presidente Lula, já que estão muito próximas e no entorno dele?
Araújo -
Esse é que é o xis do problema. Se fala que as verificações chegaram a Lula. E acho que chegaram. Cabe agora ao ex-presidente Lula provar que não está envolvido. Mas são coisas que aconteceram. Não se pode tapar o sol com a peneira. Da mesma forma que temos que dar crédito que estão chegando contra Eduardo Cunha, se forem fundamentadas e tiverem provas, o ex-presidente Lula terá que responder. 

Tribuna - Há um desgaste muito grande com relação ao PT, o senhor acha que o partido vai ter dificuldade para se manter forte nas eleições desse ano?
Araújo -
Acho. Acho. O PT vai se manter forte, com algum prestígio ainda na Bahia, em função da administração que foi de Jaques Wagner e que está sendo do governador Rui Costa. Rui Costa está fazendo uma boa administração, centrada, com os pés no chão. Tecnicamente, trabalhando bem e visitando o interior de uma forma impressionante, com paciência, demora nos lugares. Ninguém faz isso. Todo mundo ia, fazia um discurso e ia embora. Ele não, fica no município, visita escola estadual, unidades policiais e conversa com o povo do município para se inteirar do que está acontecendo. Acho que isso foi uma maneira nova que Rui está criando e está deixando a sua marca.

Tribuna - Como avalia a gestão do prefeito ACM Neto? Ele chega fortalecido para própria reeleição?
Araújo -
É obvio. Estamos falando aqui francamente e ninguém pode tapar o sol com a peneira. O ACM Neto está fazendo uma grande administração. Chega fortalecido sim. Agora, vai ser uma briga forte porque ACM Neto está fazendo uma boa administração e Rui também está. O prefeito vai disputar em causa própria, na capital, tem um grande respaldo por fazer uma boa administração, ninguém tem dúvida disso. Mas por outro lado Rui também está fazendo uma boa administração em Salvador com um rosário de obras muito grande. O próprio metrô, o projeto do VLT, as encostas que estão sendo feitas e o governador faz questão de inaugurar. Assim, talvez seja o governador que mais tenha andado em Salvador. O grande problema é quem será o grande candidato de Rui Costa. Já sabemos hoje quem o candidato do outro lado, é o próprio ACM Neto e vem forte, não bote dúvida nisso. Não é porque estou do lado de cá que vou dizer que ele está fraco, não. 

Tribuna - O PT tem hoje dificuldade de encontrar um candidato natural em Salvador. Acredita que o partido terá condição de abrir mão para apoiar um aliado?
Araújo -
Acho que esse é o caminho. O PT tem que entender, o Lula, por exemplo, concorreu em eleições quatro vezes. Só ganhou quando fez alianças fortes. Na Bahia, o Jaques Wagner também, todos eles, o Lula, Rui, sabem que é preciso ter alianças. O PT talvez não esteja vacinado ainda e acha que sozinho pode ganhar eleição. O PT sozinho não ganha mais. Ou faz alianças ou prestigia os seus aliados, prestigia aqueles partidos que fazem parte da aliança. O PT é muito bom para receber apoio. Péssimo para dar apoio. Muito ruim para dar apoio. Ele quer sempre que apoie ele. Apoiar o outro é difícil. E agora vai ser diferente. Nós mesmos, não posso falar em nome do meu partido, mas no PSD sofro muito porque o PT acha que para ganhar eleição tem que estar conosco, mas para governar tem que estar sozinho. Não dá. Você vê, há uma crítica generalizada dos deputados contra isso. Eu, como coordenador da bancada [da Bahia] tenho recebido muitas queixas disso e já disse ao governador Rui Costa e ele me ouviu. O secretário Josias [Gomes], me dou muito bem com ele, mas ele não ouve as pessoas. Ele ouve o PT, nós aliados não somos ouvidos. Tem muitas queixas. Eu não vou a Josias. Não o procuro. Não ouve ninguém, não resolve nada. Então, estou fora de conversar com Josias. Se tiver que conversar alguma coisa, converso com o governador. 

Tribuna - Como coordenador da bancada, qual a mensagem que deixa para a população em um momento em que a política está cada vez mais sendo colocada como descrédito pelo povo?
Araújo -
Eu vou falar com muita tranquilidade. Examine na hora de votar, não interessa partido, não interessa lado, o que interessa é o trabalho do deputado, do vereador. Você pode votar em um candidato a prefeito de um lado ou do outro, mas examine os seus vereadores, o que eles têm feito por sua cidade. A mesma coisa quando chegar em 2018, vamos ver quem trabalhou, quem está fazendo um bom trabalho, quem está defendendo o Brasil, a Bahia, quem está trazendo obras para seu município e o mais importante ainda: quem não está metido em corrupção. Porque hoje a palavra-chave no país é corrupção. Como presidente do Conselho de Ética, estive recentemente no Rio de Janeiro, em São Paulo, e fiquei impressionado com o interesse do povo na política. Todos os táxis que peguei, inclusive Otto Alencar estava comigo, fomos a São Paulo a um casamento de um filho de um prefeito nosso, e lá todos os táxis que peguei, todos os motoristas me conheciam. No sábado, estive em um mercado em São Paulo e muita gente me reconhecendo e pedindo para tirar selfies. É essa coisa que nos deixa feliz porque as pessoas estão acompanhando, o interesse pela política é muito grande e o povo está de olho nos políticos. Salto nos aeroportos e as pessoas dizem: "deputado, estou de olho em você". Portanto, eu não posso errar, essa é a grande chance da minha vida. Se eu errar, eu estou liquidado. 

Colaboraram: Aparecido Silva e Fernanda Chagas