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2 de julho: caboclo é o principal símbolo da data comemorativa

Na Bahia, se algo vai mal, o conselho que se dá, quando parece não haver outra solução, é “chorar no pé do caboclo”.

Tal expressão de uso corrente no jargão popular baiano é uma referência às preces, pedidos e promessas que são feitos na base do monumento do Campo Grande ou deixados na forma de cartas e bilhetes aos pés das imagens do caboclo e da cabocla nos carros emblemáticos do desfile do 2 de julho.

Na data em que se comemora a independência da Bahia, é para eles que os tambores tocam nos terreiros de candomblé. Nas tradições religiosas afro-brasileiras, os caboclos são reverenciados como seres encantados, afinal, já estavam aqui, eram os donos da terra, quando os africanos chegaram ao Brasil trazendo consigo os seus orixás.

A figura do caboclo, que ainda hoje é o núcleo do cortejo cívico do 2 de julho, teria surgido como um símbolo das lutas de 1822-23, desde o momento em que as tropas brasileiras, após vencerem os portugueses na batalha de Pirajá, adentraram em Salvador.

De acordo com a historiadora Wlamyra Albuquerque, o que se conta é que o contingente de 9.515 homens, ao chegar na cidade, pela Estrada da Liberdade, apropriou-se de uma carroça que havia sido abandonada pelos lusitanos. Além de a enfeitarem com folhas verdes e amarelas, os combatentes vitoriosos colocaram sobre ela a figura de um índio.

Esta seria, portanto, a origem da festa da independência, cujo desfile inicia-se no bairro da Liberdade, que foi o lugar de chegada dos exércitos libertadores.

No ano de 1826, o caboclo ganhou uma representação mais condizente com o movimento nativista do começo do século XIX, cuja principal referëncia de nacionalidade era imagem do índio valente e guerreiro, que foi retratada nos romances de José de Alencar.

No lugar do velho índio da primeira carroça, foi colocada uma escultura de madeira. O novo caboclo, ornado de penas, ganhou um porte altivo e atlético. Com uma das mãos, ele aponta uma lança para uma serpente, representando a tirania portuguesa, e, com a outra, segura a bandeira nacional.

Em 1840, em função dos conflitos entre a população local e os portugueses que permaneceram na Bahia, os quais passaram a ser alvos de protestos e ataques durante as comemorações do 2 de julho nos anos seguintes à independëncia, cogitou-se substituir a imagem do caboclo pela figura feminina da cabocla, uma vez que este passou a ser visto como um elemento incitador da hostilidade, sobretudo, contra os comerciantes lusitanos.

No entanto, devido à força simbólica do caboclo, aquela que foi criada para ser sua substituta acabou sendo incorporada como sua companheira no desfile. A cabocla do 2 de julho representa a lendária Catarina Paraguaçu, a índia pela qual o náufrago português Diogo Álvares Correia, apelidado de Caramuru, teria se apaixonado.

Na Lapinha, no bairro da Liberdade, em 1860, foi construído o pavilhão patriótico que abriga as carroças do caboclo e da cabocla, que são chamadas de carros emblemáticos, uma vez que têm como adornos brasões e outros símbolos nacionais, além dos nomes das batalhas e dos heróis da guerra.

Eles só saem de lá no dia 2 de julho, quando são conduzidos para o Largo do Campo Grande, onde, em 1895, foi inaugurado o Monumento à Independência da Bahia, criado pelo artista italiano Carlos Nicoli. Do alto de uma coluna de bronze, assentada sobre um pedestal de mármore Carrara, formado por dois corpos e escadarias do mesmo material, a figura de um índio, com 4,11m de altura, simboliza a afirmação da identidade brasileira.

Armado de arco e flecha, o caboclo mira uma serpente, que esmaga com seus pés. Além da alusão ao golpe desferido no poder da metrópole, o majestoso monumento de 25,86m de altura apresenta um série de representações das batalhas campais e dos nomes dos heróis que participaram das lutas de emancipação, bem como dos rios São Francisco e Paraguaçu, e da cachoeira de Paulo Afonso.