É bom voltar à terra natal, ‘ao lar paterno’. Chego a Ibicaraí e sempre fico intimamente emocionada. Passo pelas ruas, e elas me são muito familiares. Olho a ‘casa do Dr. Justino’, que hoje é da família de Pedro Bispo, e os meus olhinhos infantis lembram de um velho pé de carambola que a gente subia pra tirar e chupar as frutas, pular pelos galhos, ‘pintar e bordar’ com o sorriso e a complacência de d. Alda, uma santa criatura. Quando soava o ‘alarme’: “Dr. Justino tá chegando”, era um tal de menino caindo do pé de carambola, que nem fruta podre. Em um minuto, sumia tudo que era ‘bichinho’. Não ficava nem o cheiro.
Ao passar em frente ao sobrado de seu Otaviano, os meus olhos adolescentes lembram dos longos papos que levávamos após o jantar; lembram da casa da professora Lurdes – que era junto da minha casa e onde eu bebia o licor e ‘fofocava’ com ela, sempre bem humorada; lembro a casa de Telma Barreto, minha amiga querida; de Maria Ramos, Vera Monteiro, Gisélia. Ah! Me deu saudade das cocadinhas de d. Julieta, toda calminha, com o cestinho no braço, passando toda tarde para atender a freguesia; e tinha os deliciosos quibes de d. Margarida Habib – que fazia os quibes de farinha de trigo tão deliciosos quanto os de trigo puro. Uma festa!
Saudade de Belisana – professora que me ensinou do catecismo até a primeira comunhão – e que fazia um licor divino; era também a ‘fazedora’ oficial da ‘temperada’, uma mistura maravilhosa de cachaça com ervas medicinais, com que as mamães recebebiam os convidados quando nascia o bebê. A ‘temperada’ de Beli corria mundo. Adoro as coisas da minha terrinha!
Cheguei – com os meus irmãos Paulo e Ana, a europeia – para passarmos o São João e resolver alguns assuntos familiares, matar saudade, rever os amigos. Tá um frio danado aqui na cidade. Tive que dormir de cobertor. Paulo gostou. Faz tempo que ele não vem por aqui, com a vida atribulada que tem em ‘Sumpaulo’, no corre-corre com os seus plantões médicos.
A "Família Trapo" reunida
E já tinha gente nova na família (filhos dos sobrinhos) que ele não conhecia. Aí, já viu, né? A chegada do tio Paulinho foi a sensação da garotada. Tiozão, ele fazia os gostos da molecada. Luisa e João Pedro fizeram dele peteca, correndo atrás, provocando, instigando. E ele feliz, também ‘atentando’ os meninos. Não sei qual deles era mais criança.
Quando chegamos, levei Paulo na Radio Cacau FM para dar entrevista. Eu já sou ‘macaco velho’ pois falo para a Rádio toda terça-feira, às 13h, sobre os principais assuntos políticos da semana ou algum tema da cidade ou região. Mas fiquei surpresa ao ver a audiência da rádio. Ah! E já tô famosa na área.
Mas a novidade, o ‘must’ da cidade é a fabrica de chocolate – que agora terá todos os trabalhadores de Ibicaraí (antes, eram de uma cooperativa Coaraci, em função de um acordo feito). Eu depois falo sobre a fábrica, pois ainda estou pra ir lá conhecer tudo de perto, com Josevan, Lula e Kakalo, meu querido amigo do Partido Verde – e que sempre faz os maiores elogios dos chocolates. Chocolates que eu vou comer na visita – mas somente por dever de ofício, para ver se são saborosos. E não por gula, viu, seu maldoso. Pode tirar esse sorrisinho cínico da cara.
Ficamos na casa do irmão Lula, onde os amigos iam nos visitar, ou ‘tomar uma’ pelo São João. Terezinha, minha querida cunhada, caprichou no menu, preparou tudo que eu gosto: bolos, canjica, milho cozido, beiju de goma com queijo, ah! E uma picanha de novilha que... huuumm! Tava boa demais. Até agora estou com o gosto na boca. Adoro estas coisitas que alargam a cintura da gente. Eu queria saber por que tudo que é gostoso é ilegal, imoral, engorda ou tem dono. É duro manter a elegância.
Recebi um presente valioso do vereador Valter da Farmácia: ele me deu uma revista de 1975 que fala da cidade naquela época: fala do meu pai – que foi o primeiro prefeito – e de outras personalidades que ajudaram a fazer a cidade de Ibicaraí. Guardei a revista com muito carinho, pois traz dados interessantes, que vou depois comparar com os dados atuais. Eu estou convencida que precisamos movimentar as forças politicas, sociais e econômicas por que acho que a população da minha cidade esta decrescendo em decorrência da queda do cacau pela a vassoura-de-bruxa, e do fechamento da fabrica da Coca Cola – fato que abalou muito a cidade.
Chega de conversa mole. Mole só a canjica de Terezinha, minha cunhadinha, que não pode faltar na mesa do São João. Ela pegou essa receita nos 90 anos de Dona Zefa, mulher de Pedro Bispo e mãe de Bau – que viajou com as irmãs para a Europa. Aventais a postos, rumemos para a cozinha.
Canjica de d. Zefa de Pedro Bispo
Ingredientes:
-- 15 espigas de milho verde
-- um coco grande
-- 1 ½ xícara de açúcar
-- uma colher (chá) de sal
-- uma colher (sopa) de manteiga
-- cravo e canela em pau a gosto
Modo de Preparar:
- Passar o milho no liquidificador com um pouco de água; peneirar e espremer o bagaço. Colocar um pouco de água no bagaço, batendo outra vez no liquidificador e peneirando. Espremer bem;
- Bater o suco do milho no liquidificador, peneirando novamente para que não fique nenhum bagaço; tirar o leite de coco grosso, e o fino, e reservar (dica: ponha pouca água para tirar o suco do milho para evitar que a canjica fique mole);
- Colocar o suco numa panela, adicionar o açúcar, sal, manteiga, cravo e canela. Levar ao fogo e mexer sem parar até engrossar. Caso engrosse muito antes de cozinhar o milho, colocar um pouco de leite de coco fino ou leite de vaca.
- Acrescentar o leite do coco grosso, mexendo sem parar até soltar do fundo da panela. (Veja se carece mais açúcar. Não parar de mexer pois a canjica é muito fácil de pegar no fundo da panela).
- Colocar em travessas e servir aos convidados queridos que vão lamber os dedos enquanto pular a fogueira do São João.