
Durante décadas, o tratamento dos sintomas da menopausa, especialmente as ondas de calor (os famosos fogachos), girou em torno exclusivamente da terapia de reposição hormonal. Mas isso começa a mudar com a chegada de uma geração de medicamentos não hormonais, desenvolvidos para atuar diretamente nos mecanismos cerebrais que controlam a temperatura corporal. Essa mudança promete oferecer alívio a mulheres que não podem ou não querem usar hormônios nessa fase.
O primeiro representante dessa classe é o fezolinetanto, aprovado em 2023 pela Food and Drug Administration (FDA), agência regulatória dos Estados Unidos. Em vez de repor o estrogênio, ele atua sobre o centro termorregulador do cérebro, bloqueando a neurocinina 3, um neurotransmissor que se desregula quando os níveis de estrogênio caem.
“Quando o estrogênio diminui, o sistema que regula a temperatura corporal perde o equilíbrio e fica hiperestimulado. O fezolinetanto atua justamente nesse ponto, sem exercer nenhuma ação nos outros sintomas da menopausa. Por isso, ele não substitui os outros benefícios da terapia hormonal”, observa a ginecologista e nutróloga Alessandra Bedin, do Einstein Hospital Israelita.
Em estudos clínicos com mais de 3 mil mulheres, o fezolinetanto reduziu em 64% a intensidade dos fogachos e em 60% a frequência das ondas de calor após três meses de uso, melhora que começou a ser percebida já nos primeiros dias. O medicamento é administrado por via oral, uma vez ao dia, e mostrou boa tolerabilidade, com efeitos colaterais leves.
O ponto de atenção está no risco raro de lesão hepática, razão pela qual é preciso fazer um monitoramento das enzimas do fígado durante o tratamento. “O metabolismo hepático dessa medicação é alto. Então, quando estiver disponível no Brasil, teremos que monitorar essas enzimas. Mulheres com algum problema de fígado não devem usá-la”, alerta Bedin.
Desenvolvido pela farmacêutica japonesa Astellas, o fezolinetanto já está disponível em 14 países. A fabricante submeteu a medicação à aprovação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) também em 2023, mas ainda aguarda autorização para comercialização no Brasil.
Em outubro de 2025, a FDA aprovou o elinzanetant, da farmacêutica alemã Bayer. Ele é considerado um antagonista duplo, ou seja, bloqueia tanto o receptor de neurocinina 3 quanto o de neurocinina 1, ação que potencializa os benefícios. O medicamento também atua na modulação da via termorreguladora, restaurando o equilíbrio da resposta térmica no organismo sem a necessidade de reposição hormonal.
Nos estudos clínicos, o medicamento demonstrou uma redução significativa tanto na frequência quanto na intensidade dos sintomas vasomotores nas primeiras 12 semanas de tratamento, em comparação ao placebo. Além disso, as participantes relataram melhora no sono e na qualidade de vida relacionada à menopausa. De acordo com a farmacêutica, já foi enviado à Anvisa um pedido para registro do elinzanetant no Brasil.
Quando os hormônios não são opção
A terapia de reposição hormonal continua sendo o padrão ouro no tratamento dos sintomas da menopausa. No entanto, ela não é indicada para todo mundo — pessoas com histórico de câncer de mama, trombose ou doenças hepáticas devem evitá-la. Outras preferem não usar hormônios e recorrem normalmente a terapias alternativas, como acupuntura e uso de fitoterápicos para lidar com os sintomas indesejados.
O receio do uso da terapia hormonal existe desde publicação do Women's Health Initiative (WHI), um estudo publicado em 2002 que associou o uso prolongado de hormônios combinados a uma maior probabilidade de câncer e eventos cardiovasculares. Mesmo após revisões mostrarem que esses riscos variam conforme a idade e o tipo de hormônio, o estigma permaneceu. “Ainda há resistência na indicação da terapia hormonal, inclusive entre ginecologistas”, pontua Alessandra Bedin.
Isso ganha ainda mais relevância diante dos impactos dos fogachos. Um estudo brasileiro publicado em 2022 na revista Climateric mostra que 73% das mulheres na menopausa relatam ondas de calor, mas apenas 52% fazem algum tratamento. Destas, somente 22% recorrem à reposição hormonal. Além disso, muitas interrompem o uso de hormônios em menos de um ano, geralmente por efeitos colaterais.
Segundo Bedin, a chegada desses medicamentos representa uma mudança significativa na forma de tratar a menopausa. Embora não substituam a terapia de reposição hormonal, que continua sendo indicada para quem pode usá-la, eles ampliam as opções, permitindo um tratamento mais personalizado e seguro.
“Até pouco tempo, não tínhamos nenhuma opção. Quando a mulher não podia usar hormônio, era como se disséssemos: ‘senta e chora’. Agora temos uma saída. Essa nova geração de medicamentos vem oferecer uma alternativa para uma demanda que não tinha solução tão eficaz”, analisa a médica do Einstein.
Enquanto essas medicações aguardam aprovação no Brasil, Bedin ressalta que o estilo de vida saudável — com alimentação equilibrada, sono regular e prática de atividade física — continua sendo essencial para controle dos sintomas da menopausa.

