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Cubanos voltam às ruas em seis cidades por liberdade e comida

Sem alimentos, sem eletricidade, sem água, sem liberdade

Cubanos voltaram às ruas, nesse domingo (17 de março), em pelo menos 7 cidades: Santiago de Cuba, Bayamo, Ciego de Ávila, Santa Marta, Cárdenas e Marianao.

Eles pediam comida e liberdade.

O governo ditatorial de Cuba cortou o acesso à internet, na tentativa de impedir que os cubanos de outras localidades tivessem conhecimento dos protestos.

Apagões de até mais de 20 horas em toda a ilha tornaram-se a realidade dos cubanos nas últimas semanas.

A cotação do dólar e do euro disparou nos mercados informais de Cuba. A  moeda americana está sendo cotada a 322 pesos e a europeia a 327. No relatório mensal do Observatório de Moedas e Finanças de Cuba (OMFi) o economista Pavel Vidal alertou que “os modelos de preveem, no cenário central, que o valor do dólar americano e do euro no mercado informal poderá ultrapassar os 340 pesos”.

A rápida desvalorização da moeda cubana deve-se fundamentalmente ao anúncio e entrada em vigor das novas medidas econômicas impostas pelo regime cubano, que incluem o aumento dos preços na venda de combustíveis e taxas de transporte, entre outras.

"Queremos comida"

“Estamos com fome“, “Não aguentamos mais”, “Queremos comida“, gritavam os manifestantes.

Para o ditador cubano Miguel Díaz-Canel Bermúdez está havendo uma "articulação propagandística e instigadora dos inimigos da Revolução para provocar desestabilização e caos", na Ilha, a cada dia com menos alimentos, menos eletricidade, menos água, menos remédio.

Díaz-Canel disse que "terroristas radicados nos Estados Unidos" incentivando "ações contra a ordem interna do país".

Em Santiago de Cuba, a primeira secretária do Partido Comunista na província, Beatriz Johnson Urrutia, associa a insatisfação do povo cubano a "persistentes intentos de contrarrevolucionarios e terroristas no exterior de desestabilizar o país".

Ele disse ter falado aos manifestantes sobre os esforços do governo cubano e assegurou ter sido ouvida de forma "respeitosa e pacífica". Vídeos que circulam na internet, no entanto, desmentem a dirigente do Partido Comunista.

O que eles mostram é uma multidão furiosa, gritando slogans de liberdade enquanto Beatriz Johnson, no alto de uma casa, tentava dirigir-se a eles, juntamente com outros membros do regime. Os manifestantes gritavam “Ninguém os escolheu” e diziam não confiar nas promessas de fornecimento de alimentos.

A primeira secretária do Partido Comunista na província, Beatriz Johnson Urrutia, tenta dar explicações
Foto: Perfil de Facebook 'El Gusanito Mambí',

Desde a pandemia da Covid-19 que a ilha enfrenta grande escassez de alimentos, combustível e medicamentos.

Em fevereiro deste ano, o governo brasileiro enviou 125 toneladas de leite em pó, arroz, milho e soja.

"Um país inteiro está morrendo de fome"

Artistas dentro e fora de Cuba levantaram a voz em apoio aos protestos populares que ocorreram em Cuba neste domingo. Entre eles está a cantora Señorita Dayana, que chamou a atenção para a crise humanitária em Cuba, enfatizando a urgência de mudanças.

“Um país inteiro está morrendo de fome e necessidade. Cuba não aguenta mais, compartilhe, não importa de que país você seja. O mundo precisa saber disso. A ditadura cubana deve acabar. “A mudança é agora!”, escreveu Dayana em suas redes sociais.

Por sua vez, a cantora Yenni Valdés condenou a miséria imposta ao povo cubano pelo regime e exigiu respeito e liberdade. “Em nome de uma ideologia e de um partido não se pode condenar um povo inteiro a sofrer com a fome e a miséria, não se pode brincar com a vida das crianças e dos idosos. É humanamente detestável. Quem pede sacrifícios não se limita a expor os seus privilégios e imunidades. Exijo respeito daquelas pessoas que hoje estão voluntária e pacificamente nas ruas manifestando-se pacificamente!, disse.

O comediante Ulises Toirac, depois de se manifestar contra a violência, apelou às autoridades para que tenham em conta “a situação desesperada das famílias cubanas” e lembrou que “essas pessoas na rua são o povo”.

A também comediante Aleanis Jáuregui, conhecido como Cuqui La Mora, declarou: “Cuba está nas ruas e o mundo deveria saber disso. Liberdade para Cuba, chega de comunismo.” Jáuregui também criticou os influenciadores que não comentaram os protestos. “Este é o momento de compartilhar e apoiar o povo cubano”, disse.

Um pão por dia

As filas estendem-se em frente às padarias da província de Santa Clara desde a manhã até tarde da noite, e até horas antes do amanhecer.

A escassez de farinha para fazer pão padronizado faz com que centenas de famílias dependam em grande parte do abastecimento de particulares.

Desde o início de março as autoridades tomaram a medida de entregar o pão correspondente à cesta básica apenas às grávidas e crianças menores de 14 anos.

Números oficiais asseguram que Cuba necessita de 700 toneladas de farinha apenas para a cesta familiar regulamentada. Porém, é sabido que este pão, de qualidade duvidosa e de baixa gramatura, mal dá para uma das refeições de qualquer criança.

“Às vezes fico duas horas sentado na calçada até chegar a minha vez de fazer compras e isso acontece quase todos os dias, inclusive nos finais de semana. Aquele pão fica guardado para o lanche da criança, a gente não toca”, explica Yanela Méndez, que trabalha para o Estado.

O pão vendido por particulares pode custar até 300 pesos por unidade (o salário mínimo em Cuba é suficiente, no caso, para apenas 7 pães).

Nas padarias estatais, o pão está sendo vendido a 70 pesos (o salário mínimo é suficiente para um pão por dia).

Abusos e tortura

Em 11 de julho de 2021, os cubanos foram às ruas em cerca de 40 cidades, pedir liberdade e comida. Centenas de pessoas acabaram presas (mais de 1.400, segundo o grupo cubano de direitos humanos Cubalex) e 380 sentenciadas, incluindo menores de idade, segundo a Human Rights Watch, uma entidade não governamental dos Estados Unidos.

Com 36 páginas, o relatório “Prisão ou Exílio: A Repressão Sistemática de Cuba aos Manifestantes de julho de 2021” documenta violações de direitos humanos durante os protestos, incluindo detenções arbitrárias, processos abusivos e tortura, apontando 155 casos de abuso.

As pessoas detidas foram mantidas incomunicáveis por dias, semanas e, às vezes, meses, sem poder telefonar ou receber visitas. Algumas foram espancadas, forçadas a ficar nuas e submetidas a maus-tratos, incluindo a privação de sono.

-- Confira o que diz o relatório sobre as prisões e tortura em Cuba (em inglês)

Para o ditador cubano, os protestos de 2021 foram a tentativa de "um golpe vândalo".

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