Chico Ribeiro Neto

O lugar mais democrata do Brasil


Foto: Pixabay/Creative Commons

(“Amigo eu nunca fiz bebendo leite/ Amigo eu não criei tomando chá/ Eu sou da madrugada me respeite/ Que eu sei a hora de ir trabalhar” (Trecho do samba “Toda Hora”, de Zeca Pagodinho).

É no bar que encontro o juiz e o jogador, o feliz e o sofredor, o agiota e o devedor, o patrão e o trabalhador, o delegado e o ladrão.

Também se acha o risonho e o chorador, o paciente e o doutor, o calado e o falador.

“Bebida é uma faca de dois gumes”, dizia um velho jornalista e boêmio baiano, explicando: “Com ela, você pode perder seu melhor amigo ou ganhar a mulher mais bonita da festa”.

Bar parece com um templo. Ninguém quer saber seus pecados, mas todos lhe dão o perdão. Dono de bar é um sacerdote que comanda aquele culto singular. Dono de bar conhece a alma humana.

Dono de bar e garçom são conselheiros dos biriteiros até enquanto não estão devendo. Mas tem hora em que o cenário muda e é o garçom quem chora. Tem hora que já sabem, pelo jeito do cara perguntar pela cerveja, quanto ele tem no bolso.

Entrar num boteco pela primeira vez tem muito de descobertas. Importante calar e ouvir, ouvir muito, até conseguir participar da conversa. Sentir o ritmo do boteco. Ninguém pergunta onde você trabalha nem quanto ganha. Se não voltar amanhã não tem problema.

Havia um barzinho na Avenida Garibaldi, perto da Vila Matos, que tinha um grande banco de madeira na porta e uma inscrição na parede: “Banco da Mentira”. Para sentar ali tinha que contar pelos menos uma mentira. E o rodízio era grande.

Bar combina com solidão e com mais uma porrada de coisa.

Boteco que se preza tem uma magia, senão vira choperia de shopping. Tem uma sujeira no lugar certo, o bife feito na frigideira encardida e o isopor que não vê água há muito tempo.

É um desfilar de personagens nesse grande espetáculo do mundo – a celebração da vida – regido pelo dono do bar com as duas mãos sobre o balcão e os olhos bem atentos.

No vídeo
Zeca Pagodinho | Toda Hora