A equação trabalho versus vida pessoal, após dois anos da pandemia de covid-19, tem levantado questionamento semelhante entre profissionais de vários países, inclusive do Brasil: "Vale a pena?". "As pessoas estão repensando sobre o que realmente estão dispostas a abrir mão por suas carreiras", diz Colette Stallbaumer, gerente-geral de Microsoft 365 e Marketing para Futuro do Trabalho, em entrevista exclusiva ao Estadão.
A companhia divulgou na última semana o seu Índice de Tendências de Trabalho 2022 e, segundo o relatório, 71% dos brasileiros estão mais propensos a priorizar saúde e bem-estar sobre o trabalho do que estavam antes da pandemia, versus 53% da média geral. "Muitas das tendências observadas globalmente se mantiveram ainda mais fortes no Brasil e na América Latina", diz Stallbaumer.
Com base em pesquisas com 31 mil pessoas em 31 países e análises de informações sobre produtividade nas plataformas Microsoft 365, Outlook e Teams, bem como tendências no LinkedIn, a empresa listou dados que descrevem o futuro do trabalho para ajudar empresas, líderes e funcionários a terem sucesso no novo cenário
Segundo o relatório, 47% dos funcionários em todo o mundo têm maior probabilidade de priorizar a vida familiar e pessoal frente ao trabalho. Além disso, 18% deixaram o emprego nos últimos 12 meses, em busca de mais bem-estar, flexibilidade e, por último, remuneração - na esteira do movimento que vem sendo chamado de "grande debandada". Outros 43% dos entrevistados estão considerando fazer movimentos semelhantes. Na geração Z e entre os millennials, o dado representa 52%.
"Acompanhar o ritmo dessas expectativas não será fácil. Sabemos que muitos desejam flexibilidade, mas, ao mesmo tempo, 47% dos líderes empresariais no Brasil dizem que sua empresa planeja exigir que colaboradores voltem ao escritório em tempo integral no próximo ano", afirma a executiva.
As pesquisas indicam ainda que as prioridades e os valores dos profissionais mudaram nos últimos anos, principalmente, a partir de experiências e vantagens observadas nos trabalhos remoto e híbrido. Saúde, família, tempo e propósito cresceram em importância frente aos benefícios corporativos.
"O que estamos vendo é o que chamamos de a era das grandes expectativas", diz Stallbaumer. "O desafio dos líderes é unir esses interesses e encontrar formas para que o trabalho híbrido realmente funcione."
O relatório indica também que a desconexão entre os interesses dos colaboradores e das empresas gera uma tensão que recai sobre os gerentes. No Brasil, 73% deles gostariam de poder fazer mais para implementar mudanças na equipe, mas não têm influência ou recursos, e 34% sentem que a liderança realmente está fora de contato com as expectativas de seus funcionários.
O equilíbrio, segundo o estudo, parte de uma mudança de cultura e de reavaliação do papel do escritório. Ainda mais se levar em consideração que 58% dos trabalhadores brasileiros pretendem mudar para o modelo remoto ou híbrido no próximo ano. "Tentar trazer as pessoas de volta ao escritório de uma vez não é a solução", alerta Stallbaumer.
O relatório indica que os líderes precisam fazer o ambiente "valer a pena". Ocorre que apenas 31% deles no Brasil criaram acordos de equipe para definir claramente as novas normas, por exemplo, de por que e quando ir ao local. Outros 39% dos entrevistados não estão preocupados se os novos funcionários remotos não estão recebendo o suporte necessário.
Por outro lado, a pesquisa mostra certo otimismo para o País ao constatar que apenas 27% dos líderes empresariais temem que a produtividade tenha sido impactada negativamente pelo home office (versus 54% da média global). Entre os trabalhadores, 85% dizem ser tão produtivos ou até mais em comparação com um ano atrás.
"As pessoas estão desejando conexão humana. Estar junto pessoalmente após dois anos de trabalho remoto é uma sensação maravilhosa", diz a gerente da Microsoft, que se encontrou recentemente com uma funcionária contratada há um ano. "Mas ela continuará morando em outra cidade por conta do trabalho híbrido As pessoas estão procurando por essa flexibilidade."
O Índice de Tendências de Trabalho 2022 indica que, além de repensar o papel do escritório e capacitar os gerentes, as organizações necessitam adotar novas práticas que perpassam pela tecnologia, o espaço e a cultura para que o trabalho flexível se torne sustentável.
"Há pequenas ações que, juntas, podem ajudar as pessoas a terem uma experiência positiva do trabalho híbrido ou remoto e em relação à flexibilidade", diz Stallbaumer. "Estou fazendo isso agora com a minha equipe. Estamos decidindo, por exemplo, quando nos reuniremos pessoalmente. Teremos de ficar mais abertos e flexíveis para aprender o que funciona para as pessoas e deixar bem claro nosso comprometimento com isso", finaliza.