Chico Ribeiro Neto

O dia em que fizemos um carioca metido a besta se entupir de jaca

Ele já chegou lá na rua botando uma banca da porra, chamando o pai de “paiê”, a mãe de “mãeiê” e usando sandália japonesa (assim se chamava naquele tempo a havaiana, que ainda não havia chegado a Salvador no início da década de 60).

Veio morar na Rua Tuiuti e vivia cercado das meninas, todas queriam conversar com o carioca, falante e fluente. O cara reinava e despertava nossa raiva. Perdi a esperança em Tânia. Começou a se chegar na nossa turma como quem não quer nada, como todo carioca. Contava vantagens, e a gente só ouvindo. Falava das roupas da moda, “no Rio é assim”, e a gente só ouvindo.

Um dia, o carioca pediu para acompanhar nossa turma numa excursão do Unhão ao Iacht Clube da Bahia pelas pedras, com a maré vazia. A galera autorizou e lá fomos nós, saltando entre as pedras e roubando frutas nos quintais das mansões da Vitória.

Conseguimos pegar uma jaca e o carioca foi logo dizendo: “Essa aí eu como toda, sozinho”. Foi a deixa para nossa vingança. Meu irmão Cleomar falou: “Carioca, vamos fazer uma aposta: se você não comer a jaca toda, vai tomar porrada”. E ele aceitou. Devorou a primeira banda com avidez. O cheiro da jaca deixava a gente com água na boca. No começo da segunda banda ele começou a “enguiar” e a galera dizia: “Ei, caiu um bago aqui, tem que comer esse também”.

O carioca comeu a jaca toda, sumiu da turma e depois ficamos sabendo que ele ficou quase uma semana de cama, com febre e caganeira. A mãe dele falava pros vizinhos: “Meu filho nunca foi acostumado a comer jaca, acho que o organismo estranhou, né?” Depois dessa, o carioca ficou “pianinho” com a turma.

Numa dessas expedições Unhão-Iacht, entrei de “penetra” num baile infantil do clube. Ao chegar perto do Iacht o caminho pelas pedras já ficava inacessível. Caímos na água, uns três, com a roupa na cabeça, e nadamos até a rampa onde os sócios pegam o barco que os leva até a lancha.

Fui “penetra” também num baile infantil do antigo Centro Espanhol, que ficava no Corredor da Vitória. Eu e um amigo estávamos vendo um jeito de entrar no clube quando duas velhinhas, moradoras de uma casa vizinha ao Espanhol, nos perguntaram: “Vocês querem pular o muro? Nosso muro dá para o fundo do clube”. Benditas velhinhas. Pulamos muro e Carnaval a tarde toda.

Tem a famosa entrada de um “penetra” no  Baile do Ziriguidum, no Hotel da Bahia. Quando chegaram os técnicos da TV Itapoan, com aquele mundo de cabos e fios, ele pegou num daqueles fios e passou de costas pelo porteiro gritando: “Olha o fio, olha o fio”.

As festas de 15 anos eram muito cobiçadas pelos “penetras”, pela profusão de comidas e bebidas. Mas o maior desafio, além de conseguir “penetrar” na festa, era dançar com a debutante e ainda ouvir os pais perguntarem: “Quem é aquele?” Fim de semana, alguém da turma sempre perguntava: “Quem sabe onde tem um 15 anos hoje?”

E tem a boa piada sobre um grupo que queria “penetrar” numa festa dançante. Foram bem mais cedo para o clube dizendo que eram da orquestra. “Você toca o quê?”, perguntou o porteiro. “Bateria”. “Pode entrar”, e o porteiro só anotando. Depois que entraram uns dez, o porteiro avistou mais dois sem ingresso se aproximando. “Pelo que anotei, já entrou a orquestra toda. E o senhor, mocinho, não venha me dizer que também é da orquestra”. “Sou, sim”. “E toca o quê?” “Eu sou aquele cara que grita Ú na hora do mambo”. “Tudo bem, (virando-se para o outro), e você, engraçadinho?” “Eu puxo os culhões dele na hora dele gritar o Ú”.