Nordeste

Baleias começam a aparecer em diferentes pontos do Nordeste

Elas começaram a chegar ao País no fim de abril e poderão ser vistas até outubro

Foto: Pixabay/Creative Commons
As baleias procuram as águas quentes do Nordeste

Poucos dias após  o Projeto Baleia Jubarte anunciar o início da temporada 2021, imagens dos gigantes mamíferos marinhos na costa de Fortaleza apareceram nas redes sociais e causaram um grande alvoroço. Uma alegre surpresa, não apenas para quem não está habituado ao avistamento de baleias tão perto da costa do Ceará, mas também para pesquisadores e defensores da biodiversidade marinha.

Milton Marcondes, coordenador de Pesquisa do Projeto Baleia Jubarte, informa que, com o crescimento da população, as baleias-jubarte estão se espalhando cada vez mais pela costa brasileira: “Já temos registros da espécie desde o Rio Grande do Sul até o Amapá, mas é claro que elas são mais abundantes na região do Banco dos Abrolhos, que engloba o sul da Bahia e norte do Espírito Santo”.

Foi elaborado um mapa da distribuição das jubartes (abaixo), em setembro de 2019: “fizemos um sobrevoo desde Santa Catarina até o Rio Grande do Norte (infelizmente não fizemos o litoral do Ceará). As manchas mais escuras são maiores concentrações de baleias. Onde está branco não significa que não haja baleias, mas só que a quantidade pode ter ficado abaixo do limite de detecção da nossa análise (não fomos autorizados a voar no norte do Rio de Janeiro, por isso tem um ‘buraco’ na amostragem)”.

“Já tinha umas concentrações de baleias no Rio Grande do Norte em 2019 que não apareciam quando fizemos o sobrevoo de 2015. Então é provável que elas comecem a se tornar cada vez mais frequentes no Ceará. Nosso próximo sobrevoo deve ser realizado ano que vem”, completa Marcondes.

Até outubro

Segundo o Projeto Baleia Jubarte, elas começaram a chegar ao Brasil no fim de abril, sendo avistadas primeiro em São Paulo. Depois ao longo de toda a costa Sul e Sudeste, e finalmente chegaram à Bahia para o que os pesquisadores acreditam que vai ser uma excelente temporada.

As baleias-jubarte, cuja população, graças à proteção total no Brasil, já chega a cerca de 20 mil animais, vêm às águas baianas para acasalar, parir e amamentar seus filhotes. Além de serem acompanhadas por cientistas, elas movimentam a indústria do Turismo de Observação, desenvolvido ao longo de toda a costa do Estado, e cujos operadores estão retomando as atividades na esperança de recuperar os prejuízos com a pandemia.

Para recebê-las, as equipes de campo do Projeto Baleia Jubarte, patrocinado pela Petrobras e que lidera a pesquisa e a conservação da espécie no Brasil há mais
de três décadas, já iniciaram os cruzeiros de monitoramento. O Banco dos Abrolhos, principal área de concentração reprodutiva das jubartes no Brasil, é onde
são registradas as primeiras avistagens no Estado, e os pesquisadores do Projeto estão tomando todas as precauções sanitárias para garantir que o trabalho
científico possa ser executado com segurança.

A expectativa do Projeto, que também promove o Turismo de Observação como forma de gerar emprego e renda com a presença das baleias, é de que os visitantes
possam avistar as jubartes durante toda a temporada reprodutiva, que vai de julho a outubro.

“Pelo que estamos observando no Sudeste, a chegada das jubartes na Bahia vai ser em grande número, e esperamos que isso ajude a movimentar a Economia das nossas comunidades costeiras que praticam o Turismo de Observação embarcado, sempre cumprindo todos os protocolos sanitários para assegurar uma visita segura às baleias”, afirma o coordenador do programa de Turismo de Observação de
Baleias do Projeto, o biólogo Sergio Cipolotti.

Cipolotti também ressaltou a importância da atividade para aportar dados científicos, com o embarque de pesquisadores nas operadoras parceiras do Projeto
Baleia Jubarte, e para educar os turistas sobre as baleias e a conservação marinha. “Quem vê uma baleia nunca esquece, e isso cria novos defensores dos oceanos
na sociedade”, ressalta.

Já o coordenador de Comunicação do Projeto, Enrico Marcovaldi, comemora a expansão do Turismo de Observação ao longo da costa baiana. “Hoje temos operadoras parceiras, capacitadas por nossos especialistas, em Praia do Forte, Salvador, Morro de São Paulo, Barra Grande, Itacaré, Porto Seguro, Cumuruxatiba e Caravelas. Muito embora o Banco dos Abrolhos, no sul do Estado, seja a maior área de concentração da espécie na temporada reprodutiva, o crescimento da população de baleias permite observá-las em todas essas localidades, um produto turístico regional cada vez mais importante”.

A lista de operadoras recomendadas pelo Projeto Baleia Jubarte pode ser consultada no site do Projeto Baleia Jubarte. Na Praia do Forte, no município de Mata de São João, litoral norte da Bahia, o Espaço Baleia Jubarte está aberto e recebe visitantes para mergulhar no mundo das baleias, incluindo palestras pré-embarque.

Atuando há mais de 30 anos na pesquisa e conservação das baleias-jubarte e do ambiente marinho no Brasil, o Projeto Baleia Jubarte, patrocinado pela Petrobras por meio do Programa Petrobras Socioambiental, integra a Rede Biomar juntamente com outros projetos patrocinados pela empresa (Albatroz, Coral Vivo, Golfinho Rotador, Meros do Brasil e Tamar), que atuam de forma integrada na conservação da biodiversidade marinha do Brasil.

O Projeto Baleia Jubarte é realizado pelo Instituto Baleia Jubarte a partir de suas sedes na Praia do Forte e em Caravelas, Bahia; e em Vitória, no Espírito Santo. Por meio deste projeto são realizadas ações de pesquisa científica, turismo responsável, ações de educação ambiental, bem como atividades de conservação que têm contribuído para o sucesso da recuperação da população de jubartes do atlântico sul ocidental.

Cruzeiros

Além da jubarte, a baleia-franca também migra para as águas quentes da costa brasileira para reprodução, de julho a novembro, temporada que começou mais cedo neste ano da 2021. “Nos últimos anos observamos essa mudança de comportamento, mas 2021 surpreendeu: em abril já avistamos as primeiras baleias-jubartes. Isso pode ser reflexo do crescimento da população ou efeito de mudanças climáticas, mas ainda é cedo para saber”, acrescenta Milton Marcondes.

A equipe do Projeto ProFranca também percebeu a alteração e registrou, no fim de junho os dois primeiros filhotes de baleia-franca da temporada, avistados em Imbituba, em Santa Catarina. “A presença de filhotes normalmente é observada só na segunda quinzena de julho. Nossa hipótese é de que essa antecipação pode estar relacionada à maior disponibilidade de alimento no verão, refletindo em boa condição de nutrição das fêmeas para engravidar. Foi isso que ocorreu em 2018, quando tivemos um “boom” de filhotes e um recorde de avistagens”, comenta Karina Groch, diretora do projeto. Ela explica que, por análise de imagens captadas por um drone, foi possível observar o tamanho e o comportamento dos filhotes, que estavam acompanhados de suas mães, com indicativos de poucos dias de vida”, completa.

Além do monitoramento com drone, o Projeto realiza saídas embarcadas para coletar amostras de pele das baleias-franca com o objetivo de obter informações sobre as áreas de alimentação da espécie. A partir de agosto o projeto ProFranca intensificará o monitoramento terrestre em 15 praias no sul de Santa Catarina, desde o Cabo de Santa Marta, em Laguna, até a praia da Pinheira, em Palhoça. A equipe espera receber a visita de baleias-franca que estiveram no Brasil em 2018, uma vez que elas retornam para a área reprodutiva a cada três anos.

O Baleia Jubarte já iniciou o trabalho de pesquisa e, para este ano, instalou um gravador acústico subaquático autônomo que ficará por semanas gravando o som das baleias, assim, será possível registar o canto das baleias ao chegarem a Abrolhos. Em 2020, o projeto percorreu por lá cerca de 798,8 milhas náuticas durante 23 dias. Neste período, foram registrados 171 grupos. Ao todo, 433 baleias, dos quais 76 eram filhotes.

Além disso, para esta temporada, o Baleia Jubarte conta a parceria com a universidade australiana Griffith University para uma avaliação detalhada da nutrição das baleias – pequenos pedaços da gordura dos animais serão coletados e enviados para análise dos ácidos graxos que compõe a cama de gordura das baleias para identificar se estão bem nutridas e avaliar o impacto da mudança do clima sobre a Antártica.

Corredor migratório

A temporada de migração das baleias jubarte teve início com muitos registros de indivíduos no litoral carioca em meados de junho. Mas o verdadeiro corredor migratório, usado anualmente durante o inverno para alcançar os criadouros na região Nordeste do Brasil, ocorre em alto mar. É onde as jubartes adultas nadam em alta velocidade rumo ao Nordeste, onde se reproduzem. Embora conhecido, esse corredor nunca foi estudado profundamente – e é o objetivo das pesquisas do Projeto Ilhas do Rio, conduzido pelo Instituto Mar Adentro – com a curadoria técnica do WWF-Brasil e patrocínio da Associação IEP e JGP.

“As baleias-jubartes mais jovens se aproximam mais da costa do Rio de Janeiro e, por isso, são as mais avistadas pelos banhistas, remadores e barcos de passeio. Mas, a maioria, especialmente as adultas, passam mais afastados do litoral, em alta velocidade e em ‘fila indiana’, um fenômeno que já foi observado, mas nunca explorado pela ciência”, explica Liliane Lodi, bióloga do Projeto Ilhas do Rio e especialista em cetáceos. “Agora teremos a chance de registrar algo inédito”, destaca. Para favorecer a investigação científica, os cruzeiros incluirão cinegrafista com drone para captura das imagens aéreas da migração das baleias, a partir do fim de julho.

Há tempos que os pesquisadores monitoram os padrões de ocorrência, distribuição, comportamento e movimentos dos cetáceos. O estudo, em andamento, já registrou a ocorrência de seis espécies de cetáceos: baleia-jubarte (Megaptera novaeangliae); baleia-de-bryde (Balaenoptera brydei); baleia-franca-austral (Eubalaena australis); orca (Orcinus orca); golfinho-de-dentes-rugosos (Steno bredanensis); e o golfinho-nariz-de-garrafa-comum (Tursiops truncatus).

Todas essas espécies estão no litoral carioca, mais especificamente na unidade de conservação federal Monumento Natural das Ilhas Cagarras (Mona Cagarras) e na área compreendida entre a barra da Baía de Guanabara, praias da zona sul, ilhas e adjacentes. Esta região é reconhecida pela aliança internacional Mission Blue como um Hope Spot – extensão com grande abundância e diversidade de espécies, habitats ou ecossistemas, com populações raras, ameaçadas ou endêmicas que carecem de proteção – pois é crítica para a saúde dos oceanos.

“Esse estudo do corredor migratório é muito importante, pois gera dados de ocupação de seis espécies de baleias e golfinhos que ocorrem dentro da Unidade de Conservação e entorno. Além disso, são levantados dados sobre interação entre os golfinhos e baleias com o lixo flutuante, o que representa um risco para a fauna marinha. Os resultados sobre ocorrência e fidelidade dos cetáceos nesta Unidade de Conservação e áreas adjacentes serão apresentados ao órgão gestor”, detalha a pesquisadora.

Vinicius Nora, analista de conservação do WWF-Brasil, explica que essas informações devem auxiliar em políticas públicas, de forma a diminuir a captura acidental, as colisões com embarcações e o vazamento de lixo plástico e outras formas de poluição, colaborando com a preservação das espécies.

“O habitat marinho vem sofrendo de maneira crônica inúmeros impactos. Os dados da pesquisa corroboram a necessidade de olharmos atentamente e propor ações efetivas para a preservação da vida desses cetáceos, tão importantes do ponto de vista ecológico e para o engajamento da sociedade pela manutenção das unidades de conservação”, afirma.

Desenvolvido desde 2004 pela bióloga, este acompanhamento é hoje a linha de pesquisa com a maior série temporal na região, contendo dados e imagens de seis espécies de cetáceos que ocorrem na região fluminense. O monitoramento é realizado por meio de saídas em barco para as ilhas do Mona Cagarras e entorno para atualização do catálogo fotográfico dos animais individualmente identificados por meio de marcas naturais; análise do histórico de avistagem e reavistagem para determinar a fidelidade de área, residência e movimentos. Esse trabalho permite a ampliação da análise espaço-temporal da ocorrência, com a plotagem de informações em mapas, possibilitando uma interpretação da sua distribuição, a indicação de áreas importantes para a conservação e a conexão de dados com outras pesquisas e projetos.

As fotografias são examinadas para comparação com as pré-existentes no catálogo de indivíduos identificados por programas de computador especializados. Os dados das avistagens são georreferenciados para a elaboração de mapas as áreas preferencialmente utilizadas pelos cetáceos. Além disso, os pesquisadores fazem análise das ameaças – interações com redes de pesca, a captura acidental de cetáceos devido à intensa atividade de pesca industrial e artesanal na área costeira, o elevado tráfego de navios que causam poluição acústica, e ainda o lixo flutuante.

O estudo desenvolvido pela equipe de Liliane foi tema de artigo publicado recentemente na revista Marine Ecology Progress Series. O texto destacou a influência de variáveis ambientais e antropogênicas no uso do habitat por baleias-jubarte (Megaptera novaeangliae) e baleias-bryde (Balaenoptera brydei) na costa da cidade brasileira do Rio de Janeiro. Os autores usaram técnicas de Sistema de Informação Geográfica (SIG para modelar o uso do habitat dessas espécies de cetáceos na orla urbana da cidade do Rio de Janeiro, incluindo os ecossistemas insulares. Os autores destacaram que as baleias jubarte usam o entorno das Ilhas do Mona Cagarras como um corredor azul quando desembarcam das águas frias da Antártica para migrar para as mais quentes no Nordeste do Brasil.

O Projeto Ilhas do Rio teve início em 2011 e tem como missão subsidiar órgãos tomadores de decisão com dados de pesquisas e monitoramentos de longo prazo, visando a proteção das ilhas da região fluminense, assim como conscientizar a sociedade sobre a importância da preservação ambiental e do uso sustentável de recursos, em especial do Mona Cagarras. É conduzido pelo Instituto Mar Adentro, com curadoria técnica do WWF-Brasil e patrocínio da Associação IEP e JGP.