Mariana Desireé Reale Batista, 29 anos, é soteropolitana e chegou onde poucos conseguem chegar. Graduada em Engenharia Mecatrônica pela Unifacs, Mariana atualmente faz estágio na NASA, agência norte-americana de pesquisas espaciais.
O programa de estágio é voltado para estudantes internacionais e chama-se ‘NASA International Internship (NASA I²) Program’. Lá, ela desenvolve pesquisa no Ames Research Center, no Vale do Silício, em um projeto focado no uso de nanotecnologia para o desenvolvimento de eletrônicos e sensores.
A baiana diz ‘amar’ as matérias exatas, especialmente, Física (disciplina que tira o sono de muitos estudantes no Brasil) e sempre soube que faria algo relacionado à Engenharia.
"Decidi fazer Engenharia Mecatrônica porque o curso abrange várias disciplinas e me fascina a ideia de criar uma máquina e poder programá-la para executar de forma autônoma uma determinada atividade considerada difícil ou perigosa para o ser humano,” disse.
O apoio da família foi crucial para que ela se sentisse realizada como profissional. “Meus pais e minha irmã sempre me apoiaram e me incentivaram a escolher o curso que me fizesse feliz como pessoa. Embora eles fossem de família humilde, sempre foram muito visionários”, diz.
Mariana relata que em sua antiga turma tinha somente três mulheres (ela e mais duas) e mesmo assim, não se sentia preterida ou discriminada por ser do gênero feminino, mas sim, por morar na região da Cidade Baixa.
"Alguns colegas ficavam fazendo piada por eu morar no Bonfim e me apelidavam de ‘do gueto’ ou de ‘ribeirinha’. Nunca entendi o porquê de tanta discriminação, pois eu sempre tive orgulho de morar na Cidade Baixa. Eu tentava não me abalar com os comentários e não tomava aquilo como uma ofensa. Apenas ignorava ou até mesmo levava na brincadeira e ria dizendo: ‘Sim, sou da Cidade Baixa mesmo, sou ribeirinha’ e no final a tentativa de discriminação terminava em risos”.
O caminho trilhado na faculdade foi cheio de percalços, mas, recompensador. Durante os 10 semestres de duração da graduação, em 7 deles ela recebeu o 1° lugar no prêmio de Melhor Aluna do curso de Engenharia Mecatrônica e por um semestre recebeu o 3° lugar do prêmio. Em 2011, Mariana Batista formou-se como aluna laureada com diploma de Honra ao Mérito por ter sido a aluna com as melhores notas do curso de Engenharia Mecatrônica.
"Em mim, sempre soube da importância de ética e comprometimento com o trabalho. Sou feliz em ser exemplo e motivar as mulheres a cursarem engenharia. Sou grata aos bons professores que tive e as oportunidades que eles me deram. Por esse motivo faço trabalho voluntário com crianças, e especialmente meninas, para encorajá-las a fazer Engenharia e mostrar que elas também são capazes. Uma vez uma pessoa me perguntou que curso eu estava fazendo, e, quando eu respondi Engenharia, essa pessoa me disse que eu tinha escolhido o curso errado. Na época eu não tive reação e não soube o que responder. Apesar desse comentário ter levantado algumas dúvidas e questionamentos, eu nunca me deixei abalar, nunca pensei em desistir e sempre acreditei no meu potencial. Hoje, depois de tudo que eu passei e vivi por conta da profissão que escolhi, eu tenho certeza que cursá-la foi a melhor decisão que eu tomei na minha vida e que eu não podia ter feito uma escolha melhor. Eu amo a minha profissão e trabalho com prazer e entusiasmo”, complementou.
MBA e Doutorado - Na faculdade, uma iniciação científica na área de materiais a fez tomar gosto pela Ciência de Engenharia de Materiais, a qual se dedicou por dois anos .Durante o curso, ela conseguiu um estágio na Ford Company , em Camaçari, onde foi contratada e trabalhou como engenheira de desenvolvimento de produto até 2014. “Eu só comecei a estagiar no oitavo semestre da faculdade enquanto vários dos meus colegas já estagiavam há muito tempo. Apesar da frustração em receber vários ‘nãos’ nos processos de seleção, eu nunca esmoreci”.
Ao terminar a graduação, ela concluiu um MBA que a auxiliou a adquirir ferramentas para lidar na área de business. Em 2014, o programa do Governo Federal, ‘Ciência sem Fronteiras’, possibilitou um curso de especialização fora do país. Hoje, Desireé faz doutorado em Ciência e Engenharia de Materiais na Michigan State University, nos Estados Unidos.
Na pesquisa de doutorado, ela investiga a utilização de nanocristais de celulose (CNCs) e nanoplaquetas de grafeno (GnP) para melhorar as propriedades mecânicas de compósitos poliméricos. Devido a seu intenso comprometimento à pesquisa, ela teve a oportunidade de receber alguns prêmios. Para ela, dedicação é a chave do sucesso.
Ela faz doutorado em Ciência e Engenharia de Materiais nos Estados Unidos - Foto: acervo pessoal
"Aconselho aos estudantes a participar de todos os eventos promovidos na escola e faculdade, não ter vergonha de perguntar, assistir palestras para se aperfeiçoar e não perder as oportunidades que a vida oferece por medo de errar ou por achar que eles não são capazes, pois mesmo que a pessoa falhe tenho certeza que essa experiência vai contar como um aprendizado no futuro. Fazer trabalhos voluntários, curso de idiomas, praticar atividades físicas e se divertir também são essenciais. E para pessoas que não tem uma boa condição financeira, eu aconselho a não desanimar e procurar por opções gratuitas. Apesar de eu ter feito curso de inglês particular, eu fazia trabalho voluntário em uma ONG como intérprete para americanos que prestavam serviços no subúrbio de Salvador e dessa forma, praticava o meu inglês. Até um curso completo de italiano eu fiz de graça na igreja que minha família frequenta”.
A NASA - Foi um anúncio de uma vaga no site da Agência Espacial Brasileira (AEB) para um estágio na NASA que a catapultou para a oportunidade na agência norte- americana que é referência mundial em desenvolvimento de tecnologia aeroespacial.
"Quando recebi a confirmação de que tinha sido aceita pela NASA eu fiquei muito feliz com a notícia, mas também assustada com a magnitude do que aquilo representava na minha vida. Demorou um pouco para eu entender o que estava acontecendo e como seria minha vida dali para frente. Eu fiquei muito feliz e grata de ter esta oportunidade de estagiar em uma empresa tão respeitada, e de uma certa forma me senti orgulhosa de poder representar meu país”, complementa.
Mariana Desireé viu o anúncio da vaga de estágio na NASA na internet - Foto: acervo pessoal
Neste estágio, Mariana realiza pesquisas no uso de nanopartículas para desenvolver um sensor capaz de detectar radiação ultravioleta.
"A intensa exposição a esta radiação, por exemplo, pode causar danos à nossa pele, principalmente câncer. Por isso é importante desenvolver sensores capazes de detectar esse tipo de radiação e ajudar na prevenção de problemas de saúde relacionados a esta exposição. Participar do estágio da NASA me proporciona desenvolver um projeto que pode de fato ajudar a sociedade. Estou aprendendo com profissionais experientes e interagindo com outros estudantes internacionais e americanos com formação diferentes. Sem dúvidas, isso é muito recompensador e é o mais valioso disto tudo.”, diz Desireé, que assim que terminar o estágio, vai voltar para Michigan State University para concluir alguns experimentos do doutorado e defender a tese.