Uma das patrocinadoras da Seleção Brasileira na Copa do Mundo da Rússia, a Vivo colocou no ar uma campanha (ideia da agência Africa, do premiado baiano Nizan Guanaes), em que palavras do Hino Nacional são explicadas.
A ideia é muito boa, mas quando a também baiana Ivete Sangalo explica o que quer dizer "plácidas" (tranquilas, calmas, serenas) é levada a interpretar a letra do hino de forma errada.
Veja o que diz Ivete (texto da Africa): "Quando a gente canta no hino 'as margens plácidas' significa que nas tranquilas margens do Rio Ipiranga foi possível ouvir o estrondoso grito de independência..."
Lembremos o que está no hino: "Ouviram do Ipiranga as margens plácidas de um povo heroico o grito retumbante".
Quem ouviu? Ou: qual o sujeito da oração, aquele que praticou a ação (de ouvir)?
Muita gente acha que é indeterminado ("ouviram"). E quem escreveu o texto reproduzido por Ivete também acha que é isso ("...significa que foi possível ouvir...").
Não! Coloquemos o texto na ordem direta. Fica assim: "As margens plácidas do Ipiranga ouviram o grito retumbante de um povo heroico".
Foram as margens do Ipiranga que ouviram. Portanto, o sujeito da oração é o trecho "as margens plácidas do Ipiranga".
Para que a letra do hino significasse que foi possível ouvir o grito, como explica Ivete/Africa e, portanto, haver um sujeito indeterminado, é preciso uma crase: "Às margens plácidas".
E essa crase não existe.
Uma curiosidade: o escritor baiano Ubaldo Ribeiro teve que identificar o sujeito da oração em seu concurso vestibular.
E deu corretamente a explicação acima. Foi com ele que eu aprendi.