Jolivaldo Freitas

Arembepe: dos hippies a um casal se descabelando ao som do gospel

Foto: Alexandre Amaral/Flickr/Creative Commons

Passei o final de semana em Arembepe depois de muito tempo sem ir por lá e olha que a primeira vez que lá estive foi nos anos 1960 quando meu padrinho pegava seu fusquinha, colocava a gente, montava um embornal e viajávamos um tempão em estrada de barro e terra, para que ele comprasse peixe nas embarcações dos nativos, que chegavam de alto mar no final da tarde. Enquanto meu padrinho aguardava a vinda das velas no empuxo do vento brincávamos nas águas do canal e nos arrecifes que até hoje dão sua proteção contra a maré alta e os monções.

Adolescente, surfando a onda do movimento hippie, acampei com meus amigos na mesma década citada, numa Arembepe macia, sonolenta, contemplativa onde se ouvia o vento passando como se cortasse a palha do coqueiro e roçando de leve a areia solta das dunas amareladas. As lagoas formadas longe do rio serviam de belos cenários para os banhos noturnos sob a lua, vindos como no dia do nascimento.

Comia-se o que se pescava no rio: tainhas, enguias e baitas siris. O que se conseguia no mangue: caranguejos e outros crustáceos. Coco, caju, manga e mangaba a depender do período e os pescadores da pequena aldeia nas proximidades da igrejinha que ficava no meio da areia da praia sempre davam uma sobra de peixes pequenos que não serviam para vender para a capital ou para consumo próprio.

Arembepe atraia gente do mundo todo, principalmente depois que a revista Rolling Stones, a bíblia do Rock e da contracultura publicou que por lá estavam Mick Jaeger, Janis Joplin, Luiz Carlos Maciel, os meninos dos Mutantes, a galera dos Novos Baianos, filósofos de grandes universidades norte-americanas e gente de todas as bandeiras e pensamentos. Todos vindo fazer Arembepe.

Ver os extraterrestres, a chegado dos discos-voadores pousando, descobrindo coisas mais que da vida nas experiências extra-sensoriais, as drogas como chás de cogumelo e maconha ou LSD e outros alucinógenos.

De vez em quando a polícia aparecia para cortar os cabelões dos hippies e mandar tomar banho. A chegada dos primeiros veranistas nos anos 1970 expulsou a paz, os hippies e outros alternativos. Fez com que vestissem calções e as mulheres colocassem calcinhas e sutiãs.

Pois estive lá neste final de semana e Arembepe, como tudo na vida, cresceu, expandiu-se, subiu morro, devastou Mata Atlântica, poluiu os lagos e rio e hoje é uma minicidade pertencente a Camaçari, com as atrações que ainda restam, como um arremedo da aldeia hippie, barcos de pesca que em nada lembram os saveiros ou os batelões. O peixe já chega vendido para os frigoríficos atravessadores. Nada se dá. Tudo se vende. Mas os mais velhos ainda dão bom dia.

E haja gente como nunca se viu num dia pleno de verão. E os carros fecham as ruas, engarrafam o trânsito; seus felizes proprietários ligam os “paredões” e disputam quem tem o som mais potente, o melhor gosto musical e as meninas requebram a bundinha até o chão e a cerveja rola de montão e fiquei feliz em ver que os nativos recebem todos de braços abertos, se integram e caem na gandaia socializante.

Mas, virou uma terra de ninguém. Agora tem até uma boate com moças que cobram. Tem também uma facção que conseguiu dizimar duas outras é quem manda – o chefe está na penitenciária, mas ainda manda em tudo – e obedece quem tem juízo. E quando a noite cai a festa continua. Continua tanto que da pousada de onde estava eu vi, na plena madrugada, um casal se descabelando em plena prática do amor se equilibrando no capô do carro, enquanto da caixa de som o cantor gospel louvava Deus. Estava certo. Mas eu nunca tinha visto tal tipo de trilha musical para uma sacanagem bem-feita e ardente.

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E sobre a Polícia Federal? Tem se parar com a espetacularização nas prisões. Sérgio Cabral é bandido? É! Mas algemas nos pés e nas mãos como se fosse Bin Laden redivivo? Tá demais.

E o Ministério do Trabalho? Será que Cristiane Brasil, filha do mensaleiro Roberto Jefferson não se tocou ainda que se não serve como patroa, não presta como ministra?

Tudo isso me diz: vivendo e aprendendo.