Jolivaldo Freitas

Prédios, igrejas e inúteis paisagens

Jolivaldo Freitas

A construção de um prédio de dezenas de andares na boca do Porto da Barra, junto ao hotel Praiamar – obra do tipo que demonstra inveja das obras histriônicas de Dubai, uma síndrome que acontece hoje com todos os arquitetos do mundo inteiro, e a Bahia que na visão de Gregório de Mattos sempre foi uma terra de invejosos não podia ficar de fora – está causando o maior frisson, inclusive com ambientalistas preocupados, vereadores buscando correr atrás antes do leite derramar ou o bonde passar; e ex-ministro defendendo o outro lado, todos com seus interesses sendo democraticamente defendidos.

Enquanto o político denuncia que os vereadores estão sendo acossados pela família Mariani, que detém uma imensa área verde, considerada o pulmão da Barra, o outro lado diz que o ex-ministro foi usado para defender os empreiteiros – perdoe pela má-palavra. E a querela tem tudo para aumentar pois me disseram que vai ter protesto na região, pelo fato de que, embora a área verde pertença a uma família, há algumas dezenas de ano elas foi considerada como patrimônio público, numa ação de tombamento protagonizada pelo então governador Antonio Carlos Magalhães, que se por um lado prejudicou os proprietários que até para arrancar banana do pé precisam de projeto e autorização, por outro serviu para manter o verde num dos pedaços mais valorizados da Bahia que é a Ladeira da Barra.

O que facilitou o espigão que irá dominar a paisagem entre a Ladeira da Barra, avenida Princesa Isabel e Porto da Barra foi a mudança de gabarito para construção aprovada pelos próprios vereadores, sob a égide da administração João Henrique. O prédio vai ter 107 metros de altura, muito mais alto que o Elevador Lacerda. São 35 andares e até que para os padrões da área vai sair barato, a módicos 2,5 milhões. 10 mil reais por metro quadrado.

O terreno onde o prédio será instalado pertencia à família Martinelli. A antiga casa em estilo neoclássico ainda não foi derrubada mas a prefeitura já expediu o alvará, e pelo que vem sendo denunciado, indo de encontro ao posicionamento do ETEL, o escritório técnico de licenciamento e fiscalização, com base na resolução 51 do Conselho de Arquitetura e Urbanismo. A construtora Cosbat, dizem e tem mostrado, tem costas quentes e apadrinhamento e citando de novo Gregório de Mattos na Bahia é preciso ser apadrinhado. A Sucom já autorizou a obra.

A preocupação dos ambientalistas que me pediram para entrar na discussão e eu adoro discutir, é que o espigão vai influenciar diretamente, impactando em bens tombados pelo patrimônio histórico federal e estadual, como a igreja de Santo Antônio, o Outeiro de Santo Antônio, os fortes São Diogo e Santa Maria e o Cemitério britânico. O caso está no Ministério Público.

Mas eu duvido que da noite para o dia, num final de semana a casa não caia e o prédio suba que nem adrianino. Lembra do caso daquele edifício que foi aprovado no fundo da Igreja da Vitória? Enquanto se discutia na Justiça se a obra devia ser embargada, a construtora numa noite de sábado para domingo, quando os técnicos da Sucom estavam dormindo, chegou com caçambas e tratores e jogou no chão a mansão Wildberg. Virou fato consumado e as obras estão aceleradas.

Mas, em “compensação” a construtora decidiu criar um mirante sobre a garagem para que se veja a Baía de Todos os Santos e fez a reforma da Igreja da Vitória. Mas, pasme, na hora de pintar as paredes da igreja parece que usaram tabatinga. A chuva bateu e a tinta escorreu. Nem para Nossa Senhora da Vitória mandar uma praga. Gregório de Mattos já se dizia:
“A ti trocou-te a máquina mercante,
Que em tua larga barra tem entrado,
A mim foi-me trocando, e tem trocado,
Tanto negócio e tanto negociante.”