A posse foi há exatos três meses. Após o momento inicial de tomar conhecimento de como anda a Prefeitura de Salvador, ACM Neto já pode destacar projetos que começam a dar certo, porém faz ressalvas quanto à situação com que se deparou no Palácio Thomé de Souza.
“Eu diria que as duas realidades que a gente se deparou, logo nesse começo, foram, de um lado, graves problemas financeiros e, de outro lado, graves problemas administrativos”, lamenta o prefeito, apesar de comemorar avanços significativos no período, pois a população “percebe a presença do poder constituído”.
Temas como a implosão do Aeroclube, para dar lugar a um projeto inteiramente novo, “que abre a praia, um projeto moderno, prevendo espaços de entretenimento, de lazer, cinemas, restaurantes, lojas”, e a relação com o ex-prefeito João Henrique e a Câmara de Vereadores estão nesta rodada de conversa exclusiva com a Tribuna, dada em seu gabinete, no Palácio Thomé de Souza.
Sem falar nas próximas eleições, ACM Neto diz que tem, “ao máximo, evitado falar em 2014”. Ele diz ainda que o entendimento sobre o metrô com o governo do Estado caminha a passos largos e critica quem está “fazendo discurso para aparecer, para colocar seu nome na manchete só para politizar”.
Tribuna da Bahia – Prefeito, como podem ser classificados os três primeiros meses do seu governo, sobre o aspecto de gestão da cidade?
ACM Neto – Sobre o aspecto de gestão, nós encontramos muitas dificuldades. Primeiro porque a cidade tem um nível de dívida alto, uma dívida de curto prazo de cerca de R$ 560 milhões, e é uma dívida que incomoda muito porque são fornecedores, pessoal que trabalhou na gestão passada, terceirizados, que não receberam e pressionam para receber. Então, essa dívida é uma dívida que incomoda, porque é uma dívida muito pulverizada. A ela se soma a dívida de longo prazo do município, de mais R$ 2,4 bilhões, então Salvador tem uma realidade de uma dívida de quase R$ 3 bilhões. A isso se soma o fato de a cidade ter a pior arrecadação per capita de todas as capitais do Brasil, e a isso se soma o fato de haver, hoje, eu diria que uma grande dificuldade administrativa. Nos últimos anos, a máquina administrativa veio sendo muito sacrificada, veio sofrendo muito, por conta de problemas de eficiência de gestão. Eu diria que as duas realidades que a gente se deparou, logo nesse começo, foram, de um lado, graves problemas financeiros e, de outro lado, graves problemas administrativos. Isso tudo só se resolve de uma forma: arrumando a casa. Já na campanha do ano passado, eu dizia que a primeira providência do novo prefeito seria arrumar a casa. E é isso que a gente está tentando fazer desde o primeiro dia que eu assumi. Felizmente, nós já temos um volume de realizações e de serviços para mostrar à população, que compreende a dificuldade desse começo, que sabe que as coisas não vão acontecer da noite para o dia e nem com um passe de mágica, porém também eu acho que já percebe a presença do poder constituído, da ordem estabelecida e da tentativa de arrumar as coisas.
Tribuna – Quais os dois maiores problemas que a cidade enfrenta e como lidar com eles diante da falta de recursos?
ACM Neto – Se a gente superar a situação difícil das finanças e a situação difícil da governança da cidade, quando a gente olha e foca, eu diria, nas áreas fins, eu poderia apontar duas questões que são mais dramáticas do que as outras. Nós temos vários problemas, porém eu diria que duas questões são mais dramáticas do que as outras. Uma questão é a questão da saúde pública de Salvador. Há cerca de quatro anos não havia manutenção nos postos de saúde, a rede de saúde está muito comprometida hoje. Faltam profissionais. Não é difícil você chegar num bairro e encontrar uma pessoa reclamando porque bateu no posto de saúde e não conseguiu ser atendido ou porque faltou medicamento.
Tribuna – E o que vocês estão fazendo?
ACM Neto - Ainda neste ano, nós vamos dobrar o alcance do Programa Saúde da Família de Salvador. Nós vamos saltar de 13% para 24% da cidade atendida pelo Programa de Saúde da Família. Recrutando novos profissionais, reformando unidades e construindo novas unidades. Portanto, ampliando a quantidade de equipes de saúde da família. Ainda na área de saúde, nós queremos, ao longo deste ano, viabilizar que cada um dos 12 distritos sanitários de Salvador tenha pelo menos uma unidade de urgência e emergência. Para isso, nós já demos a ordem de serviço para implantação da UPA (Unidade de Pronto Atendimento) de San Martin, nós vamos implantar uma UPA em São Cristóvão, nós vamos implantar uma UPA em Pirajá, nós vamos implantar uma UPA em Valéria, nós vamos implantar uma UPA na região aqui dos Barris, Estação da Lapa, Dique do Tororó, toda essa região, nós vamos implantar uma UPA em Brotas e nós vamos reativar para funcionar 24 horas a unidade do Vale das Pedrinhas. Com isso, nós vamos ter, pelo menos em cada um dos distritos sanitários, uma unidade 24 horas funcionando. Estou investindo no SAMU (Serviço de Atendimento Médico de Urgência) e agora a gente autorizou a reestruturação da sede, de todo o sistema de regulação do SAMU. O problema da saúde é sério, mas também nós temos um volume de ações muito grande. Estou buscando apoio do governo federal para tudo isso, porque Salvador precisa ampliar o teto de média e alta complexidade e precisa ampliar o teto de oncologia, porque senão a gente não tem dinheiro para pagar toda a rede. O segundo grande problema da cidade, ao lado da saúde, esses dois grandes problemas mais evidentes, eu diria que é o problema do trânsito. O trânsito da cidade está caótico, está estrangulado. O que houve nos últimos anos foi o aumento demasiado da população, um aumento demasiado da quantidade de automóveis e uma estagnação das soluções de transporte público.
Tribuna – O que fazer para destravar esses gargalos que a gente tem hoje na cidade?
ACM Neto – Uma série de coisas. De intervenções pequenas, como, por exemplo, a implantação de passarelas. Nós já estamos fazendo. A reorganização de semáforos, a proibição de estacionamento em locais públicos, onde você às vezes compromete uma via de trânsito de carro porque há carro estacionado irregularmente. Portanto, de ações pequenas, passando pela implantação do centro de operações da cidade, com uma rede semafórica inteligente, sendo ela comandada em tempo real, chegando até obras maiores, estruturantes, de infraestrutura urbana, algumas delas já estão planejadas, orçadas e nós já estamos buscando a fonte de financiamento para que essas obras saiam do papel.
Tribuna – A gente tem a questão dos ônibus da cidade, a licitação que está prestes a acontecer. Quando, de fato, isso vai sair do papel e o que a cidade pode esperar de redefinição do sistema de ônibus?
ACM Neto – Esse outro ponto é muito importante ligado à mobilidade urbana, que é a rede de transporte público de Salvador. Primeiro, Salvador não pode viver apenas do ônibus. Salvador precisa do metrô. Precisa ter mais um modal que não seja apenas o ônibus. Daí o nosso esforço para tentar encontrar um caminho de entendimento com o governo do estado e rapidamente poder viabilizar a solução que garanta a existência de um metrô em Salvador. Com relação aos ônibus, que dizem respeito diretamente à prefeitura, qual é a nossa ideia? Nós vamos fazer a concessão do serviço de ônibus, nós vamos redesenhar as linhas para buscar maior racionalidade, para diminuir o tempo origem-destino e para garantir uma renovação completa da frota. Eu quero ônibus com ar-condicionado, eu quero corredor exclusivo de ônibus, o que, por exemplo, nós estamos fazendo na Avenida Vasco da Gama, nós queremos que se multiplique pela cidade de Salvador, tendo corredores exclusivos de ônibus na nossa cidade.
Tribuna – Isso vai ser exigido dos empresários, essa contrapartida vai vir dos empresários?
ACM Neto – Vai ter. Nós faremos uma concessão, ela vai demandar uma outorga onerosa, vai ganhar a concessão quem oferecer o maior volume de contrapartidas para a cidade. E esse conjunto de contrapartidas vão ser buscadas com a concessão do serviço de ônibus, todas elas, vinculadas, na melhoria do transporte e do trânsito de Salvador.
Tribuna – O que a cidade pode esperar com relação à orla. O senhor prometeu novidades para abril, o que é que vai acontecer com a orla de Salvador?
ACM Neto – Nós estamos atuando em duas frentes. Uma frente junto a Justiça Federal, eu inclusive tenho uma reunião marcada agora para a primeira semana de abril, com o doutor Carlos D’Ávila, que é o juiz da Vara que trata do assunto, nós vamos apresentar para ele uma concepção técnica sobre que tipo de equipamento pode ser implantado na orla de Salvador, para ver se a gente consegue virar a página do impedimento que foi estabelecido a partir da retirada das barracas de praia. Então eu tenho confiança, o doutor D’Ávila é um homem de muito bom senso, de espírito público elevado, tenho confiança de que a gente pode chegar a um entendimento com a Justiça Federal. Essa é uma vertente. A outra vertente nossa é iniciar a intervenção em sete pontos da orla. Nós vamos começar a recuperação, a requalificação em sete pontos da orla. Já estão definidos São Tomé de Paripe, Tubarão, a orla da Ribeira, na Cidade Baixa, a Barra – o projeto da Barra está fechado, belíssimo, já está apresentado, agora nós vamos torná-lo público com o conjunto dos demais –, Rio Vermelho, depois Jardim de Alah, até a Boca do Rio, sendo que a gente já começou derrubando o que era a sede de praia do Esporte Clube Bahia, e ali vai ser a primeira intervenção na orla a ficar pronta, nós vamos fazer toda uma recuperação do Jardim de Alah e ali nós vamos fazer paisagismo, vamos ter praça, vamos ter uma ponte ligando o que era o ginásio do Bahia até a outra ponta, ligando até as quadras, da chamada boca do rio, onde passa a boca do rio, portanto um espaço a mais de lazer para a comunidade. E depois, mais à frente, em Itapuã, cujo carro-chefe da nossa intervenção vai ser colocar no chão o antigo mercado de Itapuã, que já está quase caindo aos pedaços, e construir um novo mercado, completamente reestilizado e padronizado para a população.
Tribuna – A gente passou por Armação, pela Boca do Rio. O que vai acontecer com o Aeroclube? O que é que a cidade pode esperar daquela área, que é tão importante, já que a gente não tem área de lazer e tem dificuldade de ter entretenimento de modo geral?
ACM Neto – As conversas da prefeitura com o concessionário estão avançadas. Primeiro foi apresentado um projeto que não agradou a prefeitura, depois foi apresentado um novo projeto. Esse novo projeto muito mais adequado à nossa orla, às características do que nós queremos para a orla de Salvador. Um projeto, por exemplo, que abre a praia, porque o Aeroclube hoje fecha a praia, então a pista vai passar pra frente do Aeroclube, ele passa pra ficar atrás da pista, isso abre a praia. O Aeroclube será um projeto moderno, prevendo espaços de entretenimento, de lazer, cinemas, restaurantes, lojas. Uma coisa que está realmente bastante adequada a um produto contemporâneo que precisa ter ali. Agora, o que está principalmente acontecendo é o entendimento nosso com o Ministério Público para definir os parâmetros legais dessa concessão: qual o prazo em que ela deve vigorar, como é que nós devemos conceder a progressão desse prazo, quais são as contrapartidas que o município vai exigir do concessionário. Mas eu espero, em breve, ter aquela área “tapumada” e ter prazo definido para esse concessionário, se ele realmente permanecer no contrato, para esse concessionário implodir o Aeroclube, botar aquele elefante branco no chão e nós podermos subir ali um produto muito legal para a cidade.
Tribuna – E essas contrapartidas que estão sendo exigidas do empresariado... Está havendo algum tipo de resistência por parte deles, já que a prefeitura não tem dinheiro suficiente para bancar as obras?
ACM Neto – Eu acho que está havendo um momento de acomodação. Toda mudança cultural exige uma acomodação. Só o que eu tenho visto é uma consciência muito bacana dos empresários de Salvador. Porque a relação com a prefeitura é muito transparente. Pode, pode. Não pode, não tem conversa mais ou menos. É muito claro, é muito transparente o diálogo, a relação com a prefeitura. O que nós estamos fazendo? Para qualquer empreendimento na cidade, exigimos contrapartida. Isso é importante para Salvador, porque obras de infraestrutura, obras viárias, obras de passarelas, que a prefeitura hoje não tem recursos para fazer, porque o orçamento está apertado, se Deus quiser vai ter ano que vem, eu tenho buscado substituir o dinheiro público pelo dinheiro privado. Então, quem quer empreender em Salvador tem que ajudar a cidade, e esse é o conceito que a gente está estabelecendo.
Tribuna – O que fazer para Salvador voltar a ser uma cidade turística e culturalmente atrativa, o que hoje, infelizmente, não é como deveria?
ACM Neto – Tem que fazer muita coisa. Primeiro tem que arrumar a casa. É o princípio de tudo. Segundo, nós temos que fazer, já começamos a desenhar um plano de intervenção nos pontos turísticos. Salvador precisa ter bons produtos, então nós estamos já pensando em iluminação cênica para os pontos turísticos da cidade, em requalificação urbana desses pontos, na criação de um roteiro para a cidade de Salvador. Depois, a cidade precisa ter um calendário de eventos, que não pode ser um calendário apenas do Carnaval. Tem que ter um calendário de eventos do ano todo. A secretaria de Desenvolvimento, Cultura e Turismo junto com a Saltur e a Fundação Gregório de Mattos, todos esses que estão nas mãos de profissionais, de pessoas qualificadas e experientes, sem nenhum tipo de interferência política, eles estão conjuntamente preparando um calendário, uma agenda de eventos para a cidade de Salvador. Agora mesmo, por exemplo, na comemoração dos 464 anos, nós já lançamos uma semente, que é o Festival da Cidade, uma coisa muito bacana, cento e tantos eventos acontecendo em Salvador. Estamos já preparando uma agenda forte para o período dos festejos juninos. Ainda agora na Páscoa, voltou a ter a apresentação da Paixão de Cristo, que há muito tempo não tinha. O Fernando Guerreiro está bolando uma série de coisas na área cultural, então a nossa ideia é ter uma agenda permanente de eventos, e isso vai fazer com que a cidade seja mais atrativa. E não é só isso. Veja que o governo do estado e o governo federal também estão fazendo a sua parte. É o aeroporto que está sendo modernizado e ampliado, é o porto que vai ser entregue ainda este ano, com um terminal bacana de passageiros. Eu acho que é a soma de tudo isso que vai devolver a Salvador a condição de cartão-postal do Brasil.
Tribuna – Para a Copa das Confederações, vai ser possível mostrar a cidade para o mundo de uma forma diferente da que o senhor encontrou a prefeitura?
ACM Neto – Eu acho que a cidae já está diferente. Diferente ela já está. Eu acho que a cidade já respira novos ares, já sente que existe um ambiente muito mais produtivo, um ambiente muito mais positivo, um ambiente de confiança e um ambiente onde a ordem e a lei está estabelecida. É o que nós queremos para Salvador? Não. Uma coisa eu garanto. Para a Copa do Mundo, quando nós já teremos um ano e meio de governo, a cidade terá outra cara mesmo. Ela hoje já respira outros ares, já vive um novo momento. Nada pode ser comparado com o que acontecia até o ano passado, porém a grande transformação começará a ser percebida, efetivamente, na Copa do Mundo. Por quê? Na Copa do Mundo, nós já vamos ter os sete pontos da orla realizados, recuperados, nós já vamos ter, para a Copa do Mundo, melhor organização do trânsito e melhor sistema de transporte na cidade. Nós vamos ter, para a Copa do Mundo, uma série de obras de infraestrutura urbana já realizadas, então, eu diria que a mudança profunda vai ser percebida na Copa do Mundo.
Tribuna – O ex-prefeito João Henrique deixou um rombo enorme nas contas públicas. O que está sendo feito para reverter essa situação, já que as medidas que foram anunciadas pelo secretário da Fazenda, Mauro Ricardo Costa, vão demorar algum tempo até isso se tornar realidade na cidade?
ACM Neto – Eu diria que três grandes medidas foram tomadas nesses três primeiros meses do meu governo para equacionar a situação econômico-financeira de Salvador. A primeira, eu tive que suspender o pagamento do passivo. Eu tive que suspender o pagamento dos débitos e das dívidas da gestão anterior. Nós estamos auditando essas faturas, parte delas foram pagas, aquelas que tinham fonte direcionada de recursos, as outras nós continuamos no processo de auditagem e muito em breve eu vou apresentar um plano de pagamento para esses credores. Que vai, preferencialmente, prestigiar os pequenos credores e que os grandes credores vão ter dilatados ao longo de anos o seu pagamento garantido. Nós não decretamos moratória, mas nós vamos ter uma negociação muito prolongada de pagamento dessas faturas. A segunda grande medida que nós tomamos foi determinar o ajuste no orçamento de 2013 do que a prefeitura gasta com o que ela efetivamente arrecada. Eu fui obrigado a contingenciar 25% do orçamento da cidade. Esse contingenciamento pode ser depois flexibilizado na medida que as receitas se confirmarem. Nós esperamos que elas se confirmem e que eu possa flexibilizar. Só que uma coisa eu garanto: nós não vamos gastar um centavo a mais do que arrecada. Essa não é uma prática do passado. E a terceira grande medida, que foi a última a ser adotada nesses três meses e eu diria que é a mais importante de todas elas, foi a apresentação desse conjunto de propostas tributárias para a Câmara. Porque a aprovação dessas medidas vai ter impacto não na minha administração, ela vai ter impacto no futuro de Salvador, vamos conseguir virar a página daquela velha história, daquela velha conversa que Salvador não pode andar com as próprias pernas. Salvador não pode ser a terceira maior cidade do Brasil e a última em arrecadação per capita. Não existe isso. É vergonhoso para a cidade de Salvador. E com a aprovação desse conjunto de medidas tributárias, que vai ter pouco impacto este ano e muito impacto a partir do ano que vem, nós vamos dar autossustentação para a cidade de Salvador.
Tribuna – O ex-prefeito João Henrique falou que deixou uma herança bendita para o senhor e que o senhor está inaugurando obras que foram iniciadas na gestão dele. O que dizer sobre isso? Há um estremecimento?
ACM Neto – Eu disse claramente em 2012 e quero afirmar agora: eu não fui eleito para procurar nem culpados e nem desculpas. Nunca ninguém me ouviu falar em herança maldita. Isso não faz parte do meu discurso e nem do meu vocabulário. A cidade e o cidadão, principalmente o cidadão, são conscientes da realidade de Salvador, sabem qual a situação que a cidade se encontra hoje. Eu sou uma pessoa que por um lado apresento e evidencio os problemas, não escondo os problemas, não deixo de mostrar os problemas, mas também reconheço as coisas que eventualmente tenham acontecido de maneira positiva. Veja, não é comum, o que eu estou fazendo agora na inauguração da Avenida Vasco da Gama, eu fiz questão de registrar que aquela obra foi iniciada na gestão do ex-prefeito João Henrique. E foi concluída na minha gestão. Outro, eu não sei se faria isso. Eu faço isso porque eu acho que é um reconhecimento justíssimo. Da mesma forma que eu falo dos problemas, do que há de errado, eu falo das coisas boas. Essa obra foi começada por ele, uma obra muito positiva para a cidade, não vou deixar de dar o crédito que ele devidamente merece.
Tribuna – Há algum estremecimento, há algum risco de rompimento das relações?
ACM Neto – Não há estremecimento. Eu tenho uma relação pessoal muito boa com João, sempre tive, de muito respeito de lado a lado. A gente não tem conversado nesses últimos meses, até porque ele tirou um momento inicial para descansar. Eu estou muito envolvido, muito ocupado pela agenda administrativa do município. Agora, não há, da minha parte, nenhum tipo de rusga pessoal com ele e nem o desejo de alimentar briga nem com ele e nem com ninguém.
Tribuna – O que diferencia a sua gestão da administração passada?
ACM Neto – Eu acho que a comparação pode ser vista e pode ser percebida pelas pessoas. Eu entendo que o ex-prefeito cometeu um erro. E esse erro foi no começo do seu governo, que acabou o acompanhando durante toda a administração. Que foi fazer uma divisão, um loteamento político-partidário do governo. Eu aqui faço diferente. Eu tenho pessoas na minha equipe que têm experiência política, que já fizeram política sim, mas só que a equipe é uma só. Não existem ilhas. O governo é um só. E é um governo que preza, principalmente, pela qualificação profissional de quem ocupa as funções. E é um governo onde o prefeito cobra pessoalmente, diariamente, de cada um dos secretários, auxiliares, dirigentes, funcionários, o serviço correspondente. Eu acho que essa unidade de governo, que essa clareza de direção, eu acho que essa articulação de gestão, e sobretudo esse espírito de corpo, de um conjunto que está estabelecido, é a grande diferença e, sem querer polemizar ou muito menos estabelecer críticas à administração anterior, eu acho que é um fato, e o ex-prefeito num dado momento reconheceu isso. E acho que aprendeu com o tempo, no final já não pôde mais corrigir, mas aprendeu que não se pode lotear politicamente um governo.
Tribuna – Falando da relação do Executivo com a Câmara, existe dificuldade em construir uma base sólida, uma base que dê segurança e tranquilidade na Câmara?
ACM Neto – Você sabe que hoje, quando nós estamos realizando essa entrevista (quarta-feira), eu assinei o decreto do programa “Domingo é meia”. Você estava aqui e pôde ter acompanhado a presença maciça dos vereadores, prestigiando esse ato. Nós tínhamos maioria esmagadora da Câmara de Vereadores aqui. A relação minha com a Câmara é diferente. Como é a minha relação com a Câmara? De respeito. Eu respeito a independência do Legislativo, eu respeito a independência de cada vereador. Eu não vou ficar censurando ninguém, eu não vou ficar admoestando ninguém. Não é meu dever. Cada um ali tem o seu mandato e é dono do seu mandato. Então, a minha relação com os vereadores é essa, é de diálogo. Eu inaugurei um novo estilo de trabalho. Veja, por exemplo, quando eu fui apresentar a reforma tributária. Eu chamei os vereadores aqui. Chamei todos. De governo e oposição, para conhecerem o texto. Uma semana depois, menos de uma semana depois, porque eu apresentei numa quinta e na terça-feira seguinte o secretário da Fazenda estava na Câmara de Vereadores prestando todos os esclarecimentos à Câmara Municipal. Essa é a forma que eu quero fazer. Agindo com transparência, prestigiando o debate, fazendo uma construção coletiva, ouvindo os vereadores e pedindo que sempre o espírito público prevaleça.
Tribuna – Existem alguns estremecimentos dentro da própria base que podem prejudicar a situação da prefeitura na Câmara?
ACM Neto – Não me preocupo. Não me preocupo.
Tribuna – O entendimento com o governo estadual tem sido até então saudável. O entendimento sobre o metrô trouxe tensão a essas relações. O que vai ser possível ter de consenso, já que o senhor anunciou nos próximos dias um encontro com o governador?
ACM Neto – Eu espero que seja possível chegarmos a um consenso total. Até porque não existe meio consenso nesse assunto. Ou o governo e a prefeitura se entendem integralmente ou não há acordo. Eu estou confiante que vamos nos entender. Eu estou confiante que o governador vai entender as ponderações da prefeitura. Por outro lado, eu tenho que entender as ponderações do governo, e nós vamos flexibilizar. Cada um cede um pouco pra encontrar um caminho de entendimento.
Tribuna – Há disputa dos empresários de ônibus e dos empresários do metrô do tipo de colocação?
ACM Neto – De forma alguma. Primeiro eu não acredito que o governador tenha qualquer tipo de compromisso ou que se sujeite a qualquer tipo de pressão de empresários de metrô, como eu não tenho nenhum compromisso e não me sujeito a nenhum tipo de pressão de empresários de ônibus. Então, eu afastaria isso. O que eu percebo é que, enquanto eu tenho uma conversa e um diálogo franco, fluido e muito positivo com o governador, do outro lado, o que a gente vê é que muita gente ao redor, na cercania, que não tem muito conhecimento efetivo do que está acontecendo, quer tirar proveito, fazendo discurso para aparecer, para colocar seu nome na manchete só para politizar, e eu não vou permitir que isso aconteça.
Tribuna – Foram anunciadas medidas duras, inclusive auditorias em contratos. O que há de resultado disso? O senhor já tem três meses de administração.
ACM Neto – Nós iniciamos um processo no segundo mês de governo de apuração dos créditos tributários, isso é um problema evidenciado pela prefeitura. O trabalho está sendo desenvolvido pela secretaria da Fazenda, pela procuradoria do município e pela controladoria do município. Então, o trabalho está sendo desenvolvido e assim que haja uma conclusão nós vamos verificar o que havia de irregularidade e o que é que não havia. O que houver de irregularidade vai ser encaminhado para o Ministério Público para responsabilizar quem de direito. Com relação às Transcons, depois de 60 dias de trabalho, a equipe que eu constituí verificou que não havia nenhum controle de Transcon na cidade. Não se sabia quem eram os donos das Transcons, não se sabia como as Transcons tinham sido constituídas e muito menos qual era a quantidade de Transcons que estavam sendo negociadas no mercado. Qual é a evidência? A evidência é que o sujeito usava a Transcon e a prefeitura, por não ter controle, sequer fazia a baixa daquela Transcon. A gente determinou a contratação de uma auditoria externa que vai fazer um trabalho agora muito mais refinado com instrumentos que a prefeitura não dispõe, que o Ministério Público não dispõe, e eu espero concluir esse trabalho dando seguimento ao uso desse instrumento quando ele for efetivamente correto, e punindo quem usou errado.
Tribuna – No caso das Transcons, havia realmente máfias operando na cidade? E quando isso vai vir à tona?
ACM Neto – Eu vejo que quando você classifica como máfias, você está usando um adjetivo definitivo. O que se sabe evidentemente é que há uma concentração de Transcons. É claro que o mercado imobiliário acaba manipulando esse instrumento de acordo com os seus interesses e o descontrole era total. Vamos fazer um censo. Todo mundo que tem Transcon na cidade vai ter que apresentar. Então nós vamos saber quem são as pessoas que têm. Quantos essas pessoas têm e como foram constituídos para depois daí confrontar as informações e ver onde eventualmente possa ter acontecido irregularidades.
Tribuna – Dois mil e quatorze está na pauta política. Há uma antecipação clara por parte da base do governo. Haverá uma dificuldade da oposição na Bahia hoje para apresentar um candidato competitivo?
ACM Neto – Primeiro eu tenho ao máximo evitado falar em 2014. Eu acabei de sair de uma eleição. Eu estou extremamente absorvido pela agenda administrativa da prefeitura. Não estou tendo quase tempo para falar de política, para conversar sobre política. Às vezes nem pra ler sobre política. Então, eu estou muito concentrado em 2013. Até porque, graças a Deus, depois de ter disputado quatro eleições consecutivas, e ter disputado cinco eleições em um prazo de 10 anos, graças a Deus, eu não serei candidato em 2014.
Tribuna – Mesmo o seu nome sendo o melhor posicionado nas pesquisas até agora?
ACM Neto – Sem nenhuma chance. Não há hipótese de eu ser candidato. Ela sempre foi descartada por mim enquanto candidato a prefeito e por mim agora como prefeito de Salvador. A cidade tem tanto desafio pela frente, tem tanto problema para ser resolvido, que não há hipótese de eu sair. E não haveria hipótese de nenhum outro que aqui estivesse sentado pensar em sair candidato.
Tribuna – Da base da prefeitura, Geddel Vieira Lima, Paulo Souto, Antonio Imbassahy. Quem vai conseguir agregar mais para apresentar um projeto, para contrabalancear com o PT?
ACM Neto – Aí você percebe o seguinte. Houve uma precipitação do processo no plano nacional. Se você for analisar, as três principais candidaturas ou pré-candidaturas postas estão num movimento intenso, diário. Da presidente Dilma Rousseff (PT), do governador Eduardo Campos (PSB) e do senador Aécio Neves (PSDB). Isso, de alguma maneira, acaba gerando uma precipitação dos processos eleitorais nos estados. E é o que talvez aconteça aqui. Se você for examinar, a disputa na base do governo do estado hoje é muito intensa. No campo fora do governo, a disputa não está dessa maneira. Acho que a velocidade é outra, com muito mais parcimônia. Lá dentro é que a gente já percebe muitos movimentos para precipitar o processo. Eu acho que é cedo para falar. O que eu espero é que os partidos que me deram sustentação no segundo turno de 2012, pelo menos esses partidos, que são seis, PMDB, PSDB, Democratas, PV, PPS e PTN, eu espero que esses seis partidos possam construir um caminho comum para a disputa eleitoral. Agora, nomes não devemos falar ainda. Está cedo. O momento ainda é cedo para definir calendário. Acho que o momento agora é o momento dos prefeitos, não apenas o da capital, mas de todo o estado da Bahia e do Brasil fazerem o seu dever de casa e arrumarem as suas cidades.
Tribuna – Já que a gente não vai falar de nomes, não vai antecipar a questão de nomes, a falta de um nome natural da oposição facilita o processo para a base do governo?
ACM Neto – Eu repito: eu acho que é cedo. A gente não sabe como vai ser a dinâmica da base do governo. Se vai ter um candidato único, se vai ter mais de um candidato, se vai ter uma cisão ou não vai, se vão estar unidos ou não vão. A gente não sabe disso. Da mesma maneira que é cedo para falar qual é a dinâmica e o comportamento dos partidos do campo de oposição. Agora, qualquer disputa na Bahia, você pode buscar na história recente, é uma disputa que vai ter mais de um lado. Não existe disputa de um lado só. A indefinição é como esses lados vão se acomodar, como é que eles vão se ajustar.
Tribuna – O que é que a cidade pode esperar de ACM Neto prefeito de Salvador a partir de agora?
ACM Neto – O que eu posso garantir é muito empenho. O que eu posso garantir é que nós estamos trabalhando aqui mais de 12 horas por dia. Nós estamos trabalhando fim de semana, para começar a organizar a cidade. Eu sinto que as pessoas têm no coração muita esperança e muita confiança. Estão compreendendo que as coisas não vão acontecer da noite para o dia. Que as soluções não são milagrosas, que não é estalar os dedos e vão resolver tudo. Que problemas acumulados ao longo de anos não vão ser superados em poucos meses. Mas, por outro lado, há a percepção clara de que a prefeitura hoje tem comando, de que a prefeitura sabe o que quer, aonde quer chegar, e eu vou lutar muito para que ela chegue e possa corresponder a essa expectativa tão grande das pessoas de Salvador. O meu trabalho, a minha dedicação, o meu empenho, o meu envolvimento pessoal é total, e eu posso garantir que eu não vou descansar um minuto sequer até o momento em que a nossa cidade viva dias muito melhores.
Tribuna – O Prefeito Netinho (fake do prefeito no facebook) tem ajudado no processo de construção de sua imagem e no diálogo com a população da cidade? Tem ajudado nesse processo de aproximação maior com as pessoas?
ACM Neto – O Prefeito Netinho é uma coisa diferente, que surgiu na cidade. Nós fomos ver, a eleição de 2012 já foi uma eleição com maior força nas redes sociais, no mundo virtual, no mundo digital do que nas anteriores. E eis que surge esse fenômeno de uma pessoa muito criativa, que eu tenho muita curiosidade de conhecer essa pessoa, sem querer invadir, efetivamente, a sua liberdade de se manifestar, e assim eu entendo que não posso censurar. Faço questão de separar as coisas. Uma coisa é o prefeito ACM Neto, que está fazendo o seu trabalho, que tem a sua forma de pensar, a sua forma de agir e de proceder, outra coisa é um personagem criado, com muita criatividade, com muito humor, com uma dose muito bacana de tocar na graça das pessoas, porque a vida já é muito repleta de problemas, quando você vê a cidade de Salvador cheia de problemas, a política cheia de problemas, a gente acaba tendo aqui, nessa manifestação, um certo momento de descontração, de dar risada, de parar e ver. Traduzido de uma maneira muito mais simples, muito mais cotidiana. Eu respeito, acho a pessoa muito criativa, agora são coisas distintas, porque trata-se de um personagem virtual da internet.
Colaboraram: Fernanda Chagas e Fernando Duarte