O Brasil já não é mais o mesmo, felizmente. A riqueza, mesmo a duras penas, está batendo nas portas de quem tem coragem e ousadia para vencer obstáculos. Estava degustando um acarajé com pimenta malagueta, acompanhado de uma cerveja geladinha que era para rebater o ardor, e na falta do que fazer, além de mastigar e deglutir o acepipe afro-baiano-brasileiro, fiquei a ouvir o que a baiana do acarajé estava falando com um cliente ao lado.
Ela estava bastante preocupada com os últimos resultados da Bolsa de Valores. Disse que nunca, em sua experiência de aplicar em ações, viu a Bovespa entrar em pânico e levar tanta gente à beira de um infarto. Explicou que tinha procurado seu corretor de investimento para saber se era melhor vender as ações e colher os resultados ou ter sangue frio e continuar aplicando e de olhos e ouvidos abertos para as novidades vindas das bolsas europeias, americanas e asiáticas.
Ela tinha uma opinião: era melhor deixar tudo como está, vez que entende ser um caminho único os Estados Unidos honrarem seus compromissos. “Eu sei que se não pagar a quem devo não vou conseguir crédito para comprar o feijão fradinho, o dendê, o camarão seco, gengibre, castanha, amendoim e nem um galinho de coentro vou receber. Imagine Obama”, disse fazendo uma analogia econômica.
Mostrando que entende mesmo do riscado, observou que dificilmente a Comunidade Econômica Europeia deixará de tirar a Grécia e a Espanha da perrengue em que se encontram e que, depois que a crise passar, com certeza suas ações voltarão a valer de novo. O que Dilma disse na TV sobre o Brasil estar preparado para enfrentar um crash internacional, teve seu apoio:
- As reservas brasileiras estão excelentes!
Dona Maria Célia, como ela se chama, alertou, entretanto, para o perigo do governo não conseguir controlar o dólar. Ela mesma tem aproveitado que o real está valorizado e tem gasto dinheiro com viagens e outro dia importou pela internet um moedor de tempero com tecnologia japonesa. Já comprou uma televisão 3D (se queixou que só veio um par de óculos e vai ter de comprar outros) e está esperando só juntar um pouco mais de grana para visitar a Disney.
Ela disse ao freguês que a vida vai bem, com a chegada dos turistas; a venda de acarajé, abará, cocada, punheta, lelê e bolo de aipim aumentou consideravelmente, mas se recusou a dizer quanto fatura por dia ou o volume de vendas. Riu e explicou que estava dando para pagar a faculdade da menina e do menino e segurar a barra do namorado – bem mais jovem - “Quem gosta de velho é cadeira de balanço”, disse, que está sem trabalhar faz bem uns quatro anos.
Ela já teve uma experiência péssima com aplicação em ações, quando comprou com umas merrecas nos anos 80 ações do Banco do Brasil e depois elas foram pulverizadas, pois foi descoberto que o BB estava maquiando resultados financeiros. O que era positivo na verdade era negativo. O que era lucro, na verdade não o era. “Foi um mico”.
Mas, ela revela que tem um temperamento ousado. Botou algum na poupança, outros em CDBs e mais alguns em imóveis. Mas gosta mesmo é de ações da Vale, da Petrobas e do Eike que acha um gato e diz que se ele aparecesse em sua frente daria todo o tabuleiro de graça. “Ele merece um 0800”. Falou e beijou o camafeu e o patuá. Suspirando desabafou: “A Bovespa vai subir. Ogum vai ajudar. Tá nos búzios”.
Quase engasgo. Mas corri para aplicar na bolsa, aproveitando que as ações estão em baixa.
- E o momento certo, meu filho – aconselhou enquanto mandava molho para dentro do abará
Jolivaldo Freitas