Quando adolescente, nos anos 60 e 70, no auge da filosofia hippie, todo mundo sabia quem era o maconheiro do bairro. As mães não deixavam que suas filhas sequer olhassem em sua direção e os pais diziam aos filhos que levariam surras de criar bicho se fossem pego em sua companhia. O indigitado parecia que tinha lepra ou parte com o demônio e os mais velhos diziam que ele fumava maconha para poder tarar, estuprar e roubar. A cannabis sativa era tida e havida como aditivo para ladrão.
Com a filosofia do Paz e Amor e principalmente após Woodstock, as drogas foram sendo disseminadas aos poucos e já havia ao invés um maconheiro, grupos de fumadores e como tudo na vida, o que era tema virou realidade para vários daqueles que faziam parte do nosso grupo de moleques. Na época era até algo folclórico e lembro-me das rebordosas e micos que alguns amigos pagaram e entraram na história local.
Vem-me à memória um caso em que para fumar escondido e ninguém saber um amigo pegou um barco na beira da praia, remou vários metros e fumou seu baseado se bronzeando ao sol. Lá para as tantas só se ouvia seus gritos alertando sobre a chegada dos invasores holandeses. Ele chamava às armas, pedia para içarem as velas das naus e dizia que devia ser obedecido pois era Vasco da Gama. Um piração só.
Outro fumou tanto que ficou parecendo cachorro querendo pegar o rabo. Corria na rua de um lado para o outro, olhando a própria sombra e dizendo que a lua o estava seguindo para todos os lados onde fosse. O pior de todos foi um vizinho que tomou tal de chá de cogumelo, pegou uma lata de tinta prateada, jogou no corpo, pintou a bicicleta da mesma cor, montou e desceu a ladeira em alta velocidade se jogando ao mar.
E tem aquele que achava, quando aspirava suas fumaças do demônio, que se transformava em super-homem. Mas nunca que tentou voar, pois ele era “doidão”, mas não era maluco a esse ponto. Acho que foi o primeiro a agir como surfista de trem. Viajando com os braços abertos sobre os vagões.
A cannabis não era fácil de arranjar naqueles tempos, imagine heroína, cocaína ou outras drogas mais pesadas. Cachacheiro tinha demais. Qual o bairro que não tem o seu? O nosso era Zé da Moringa. Andava de um lado para outro carregando um pote de barro, onde se dizia, estava cheio de cachaça. Ia trabalhar cedo como tratorista da prefeitura, passava asseado, barba feita, roupa branca de linho bem passada, dando bom dia. Voltava um mulambo, soltando palavrões e xingando quem passava perto.
As drogas que já não eram mesmo coisas para se usar em sã consciência foram evoluindo em poder de destruição. Os pesquisadores dizem que a maconha campa com os neurônios e o cabra termina esquecendo até o nome da genitora. A cocaína leva à paranóia e o LSD (algo até em desuso nos tempos atuais) enlouquece. Hoje são tantas as drogas que fica até difícil enumerar. Mas, o que traz preocupação por seu poder de destruição e facilidade em ser encontrada é o crack. Este tipo de droga barata nem dá tempo para o usuário pensar na vida. Nem na morte. E dizem que foi a droga que devastou com a cantora Amy Winehouse.
Mas, mesmo na desgraça – claro que a dos outros – tem um ou outro engraçadinho que, ou por doideira ou humor negro sai com alguma tirada. No ponto do táxi ouvi um doidão dizendo para o outro:
- Você viu que cremaram a Amy?
O outro responde rápido:
- Já imaginou o que seria fumar suas cinzas?
- Doideira pura!
- Ô!.
Jolivaldo Freitas