Eu bem que poderia falar do Cão: o Satanás, o Capirobo, o Demo, o Sete trouxas o Diabo que atirou e matou os estudantes em Realengo. Mas não quero dar trela ao sensacionalismo que tomou conta da mídia. Ainda mais sabendo que quanto mais se remexe mais aparece maluco querendo imitar pela fama.
Tudo bem que um, dois, três dias o assunto seja pautado. Mas como vem sendo feito, beira à espetacularização da desgraça alheia.
Prefiro falar de um cãozinho. Não moro no Jardim Amália, na zona leste de São Paulo.
Estou há dois mil quilômetros de distância, em Salvador. Não sou lá muito chegado a animais, mas ando cada vez mais os entendendo – até às cobras e aos lagartos –; e entendendo menos o ser humano: “o lobo do homem”, disse Nietzsche
Mas, mesmo de longe, decidi tomar as dores do cão Pirata. Herói não tão anônimo assim, famoso, sim, com seus minutos de glória como nos remete Andy Warhol. Foi anos passados, personagem de telejornais, aclamado pelo público e agraciado pela PM.
Foi quem certa vez (e assim fez fama e nome) – faz tempo - alertou os policiais do quartel do bairro que os bandidos estavam levando as motos da corporação. Pirata evitou mais um fiasco; vergonha a manchar o currículo da briosa brigada militar paulistana.
Fama dura pouco. Não temos memória. E a nova comandante da PM lá do bairro de São Paulo parece que não tem coração e do nada invocou com o bicho. Assim como todos os idosos do país o velho Pirata – que tem um só olho bom: não tem o outro de vidro, nem perna de pau ou cara de mau – é vítima da idade e da ausência de sentimentos elevados do homem. Ninguém respeita os mais velhos.
A moça da PM o expulsou do quartel, onde morava desde sempre. Ela agindo como se fora uma filha má. Pirata perdeu seu cantinho na corporação. Sem motivo aparente, por estar ficando velho?. Foi maltratado e desrespeitado como se fosse um reles bucaneiro.
Ele agora está num estacionamento de supermercado, sendo bem cuidado por um casal de bom coração. Abana o rabo para qualquer um que o afague, por ter bons instintos - daqueles que só os heróis possuem. Faz graça até mesmo para a cruel comandante “Kruela”. Não guarda mágoa.
- Mas, é de dar dó - diz a senhora que agora o hospeda – “ver sua alegria quando passa uma patrulha da polícia com a sirene tocando”.
É!
Mais um herói esquecido, como tantos outros.
É...
Mas Pirata entende e perdoa.
Jolivaldo Freitas