Jolivaldo Freitas

Nem Ivete aguenta mais pobre e Axé

A axezeira Ivete Sangalo acaba de cuspir no prato que vem comendo e dou toda razão para ela. A cantora se queixou à beira da piscina – segundo soube via impresso – com uma amiga que estava enlouquecendo com tanto Axé, Arrocha e Pagode que invadia seu milionário apartamento localizado na Mansão dos Cardeais, lá nas bandas do Campo Grande, por onde passaram e moraram de Dom Avelar Brandão Vilela ao Cardeal da Silva e que fica placidamente derreada sobre a Avenida de Contorno e Baía de Todos os Santos.

Os moradores da Gamboa de Baixo soltam a zorra dia e noite, som lá nas alturas e que chega ao seu confortável  lar, adquirido – diga-se de passagem – graças ao seu sucesso como cantora de Axé.

  Meu vizinho da casa ao lado ouve Ivete todo final de semana com os tuíteres abertos, com todos os graves, médios e agudos que seu Tres-em-um permite. Durmo com Ivete. Acordo com Ivete. Agora Ivete se queixa que não dorme em paz por causa do pessoal que curte sua música lá na favela.

No tempo dos cardeais, onde a cantora mora e vive, somente se ouvia o som das ondas batendo nos rochedos e em tempos mais  idos o trovão das canhões da Fortaleza de São Paulo. Os representantes de Deus moravam num paraíso tomado pelo azul que se espraiava até a Ilha de Itaparica, com o chilreio dos papa-capins e sofrês;  cercados de pitangueiras, jambeiros, mangueiras e araçazeiros. Hoje os moradores estão ilhados pelos axezeiros e Ivete não aguenta.

Tanto que mandou colocar material acústico no apartamento para evitar sua música e de outros que vêm lá de baixo, da casa nada mediterrânea da pobreza que habita os arcos do Museu de Arte Moderna e Gamboa de Baixo.

Pimenta no fiofó dos outros é refresco, diz a sabedoria popular. Isso porque Ivete não sabe como incomoda quando seu trio sai com 110 decibéis à noite de Carnaval ou outro evento qualquer, espantando o povo que mora na Barra ou outro bairro do país e que não gosta de folia; ou deixa à beira da apoplexia os doentes dos hospitais perto dos circuito.

Aliás, claro que ela sabe como todos os outros: Bell, Claudia Leitte, Margareth e até minha amiga Laurinha sabem que, para quem não gosta, Axé é uma overdose. Ivete está rejeitando e tomara que ela faça como Daniela, que está cada vez mais voltada para a MPB, ou como Mara Maravilha, que só Louva ao Senhor.

Se bem que não tem coisa pior que morar perto de templo evangélico. Conheço várias pessoas que moram em Brotas, em Paripe ou Federação que se não fosse pecado já tinham implodido os templos que, notadamente, aos domingos de manhã cedo falam com Deus em altos brados, como se Ele estivesse dormindo e precisando ser acordado. Aliás, os evangélicos não se deram conta que O Senhor precisa descansar no sétimo dia. Mas, não, gritam berram, abrem o gás, ligam alto-falantes para que suas palavras subam ao céu.

Talvez seja por isso que Deus anda num mau humor retado e tome erupção de vulcões, tsunamis, praga, fome, seca, queda do dólar e o PT tomando de vez o poder. Os evangélicos que se cuidem, pois os petistas vão cassar a liberdade de expressão.

 Mas se por um lado vai ser ruim, por outro teremos silêncio.  E não vai ter imprensa para denunciar nada. E Deus, ressabiado, já largou de mão. Ele, que estava acostumado com cantos gregorianos e sussurros dos terços, se lascou e vai ter de usar protetor auricular. Igual a Ivete.

  Ivete está certa. Esse negócio de Axé Music é brabo mesmo para quem não gosta. No domingo passado foi até interessante, se depois de certo tempo não começasse a enjoar a disputa entre três felizes proprietários de automóveis que pararam defronte ao Forte de Santa Maria, no Porto da Barra.
Chegaram, abriram os maleiros dos carros e mandaram ver nas alturas. Um tocava... adivinhe... Ivete;  outro Parangolé  e mais um se esmerava na Banda Calypso.

O som embolava de tal forma que não dava para saber o que se tocava ao certo, mas as maravilhosas e imprescindíveis piriguetes se esbaldavam. Rebolavam, comiam churrasco de gato feito na hora, diga-se de passagem, e tomavam banho de cerveja a R$ 2.00 o litrão.

Coisa bonita de se ver para quem gosta. Eu e Ivete não achamos tanta graça assim. E olha que ela, pelo menos, ganha a vida fornecendo a matéria-prima sonora. Ivete está certa. Tem que exorcizar. Coisa chata ficar vendo novela com a pauleira axezeira vindo da patuleia, a plebe rude e ignara.