Opinião

A necessidade de estrelas na economia

Outras estrelas são possíveis e necessárias

Foto: Pixabay/Creative Commons
O reforço bélico é generalizado

Dois poderosos fatores – provavelmente interligados – constituem motivo de tremenda incerteza econômica mundial, obrigando os países e empresas com lideranças de maior sentido de responsabilidade e visão de médio prazo, a prepararem alternativas, antecipando implementações.

Os dois fatores são a nova chegada de Trump à Casa Branca e o reforço bélico generalizado, com ponto altos na Ucrânia e Oriente Médio, por enquanto.

O protecionismo vai aumentar nos Estados Unidos com apoios em outras partes do mundo. Se isto acontecer, por exemplo, na Argentina, cujo presidente é – pelo menos por enquanto - óbvio aliado de Trump, será problema duplo, pois afetará as trocas na América latina e enfraquece a movimentação para acordo de livre comercio do Mercosul com a União Europeia.

Porém, há países que reforçam suas capacidades internas e procuram aumentar as trocas internacionais. Há pequenos, médios e grandes exemplos.

Nos pequenos, aparece a tradicional opção pelo turismo nas Seicheles, arquipélago no Índico africano. É tradicional mas tem sabido manter as infraestruturas, níveis de governabilidade, com Índice de Desenvolvimento Humano na divisão de “Muito Alto”. Dada a pequena dimensão deste país, seu exemplo, serve para modelos regionais ou locais em países de maiores dimensões.

Nos médios, estão desde há muito tempo a Holanda e a Suíça, pequenos países situados em zona central do sistema – a Europa – com desempenhos muito acima de outros de mesma localização e até maior dimensão. Conectam altos índices de inovação tecnológica com facilidades para iniciativas e mercados financeiros importantes. A manufatura holandesa de máquinas para os mais avançados semicondutores é incontornável e o Banco Nacional da Suíça continua presença indispensável nas reuniões dos bancos centrais, exatamente porque a Suíça tem muito mais que bancos.

Nos grandes, a Malásia é exemplo constante, do qual já falamos aqui.

A previsão de crescimento este ano está a 5% e não decorre de commodities nem parte de níveis muito baixos. Um artigo da Bloomberg chama-lhe “estrela emergente da Ásia”. Por nossa parte, ao mencionar este país pretendemos significar que outras estrelas são possíveis e necessárias, estabelecendo sem dúvidas a noção de economia emergente, expressão muito usada por outros sem demonstração prolongada (inclusive designação geral exagerada pelo FMI). A trajetória da Malásia é mais que mero ciclo de crescimento.

Já na década de 1990 chamaram a atenção mundial o poder da estatal Petronas, das empresas de telecom e dos investimentos no exterior a ponto de ser, então, o maior investidor na África e não apenas comprador de matérias-primas. A queda do apartheid abriu caminhos imediatamente aproveitados por Kuala Lumpur, em certa medida facilitados culturalmente pela grande comunidade descendente de malaios na região da Cidade do Cabo.

A cultura é componente de topo na mentalidade de desenvolvimento, a nível da sociedade e suas lideranças. Se não houver faltará a envergadura.

A Malásia não estacionou no petróleo nem no avanço do celular. Criou zonas francas abertas ao capital estrangeiro, estimulou investimentos internos e externos especialmente nas IT, sendo hoje um polo de impacto mundial nos semicondutores, capacidade de avanço na Inteligência Artificial como meio de conhecimento e subida na produtividade.

Esta subida na produtividade, como é obvio, alcança vários eixos da produção e serviços, sendo ponto facilitador da expansão econômica em qualquer país. As autoridades malaias, incluindo o governador do Banco Central, sublinham a grande atenção ao mercado interno, como motor do crescimento no duplo sentido econômico e social.

Podemos acrescentar que é também uma das proteções contra choques externos. A Malásia tem cerca de 35 milhões de habitantes, é fácil imaginar o mesmo fator em mercado de 210 milhões.

Ao mesmo tempo, o atual governo malaio não recua perante medidas como controle rigoroso de preços. O referido artigo da Bloomberg - aliás, interessante – considera este tipo de controle como não ortodoxo. Não vamos debater aqui ortodoxia econômica, porém, olhando a recente história econômica mundial, controlar os preços tem sido frequente em função de imperativos centrais. Na Malásia, subsídios são também praticados pelos mesmos imperativos, desde que a duração seja conjuntural. No caso dos combustíveis levantam-se dúvidas sobre efeitos na inflação. É provável que o banco central acredite na força do controle de preços como defesa eficaz. Veremos no próximo ano, como veremos quem no mundo resiste melhor aos dois fatores de abertura neste texto.

No limiar do que vem por aí, a Malásia aparece como performance útil no global, capaz de manter sustentabilidade nos 5%, percentagem hoje equivalente a joia na economia. Com métodos muito distintos dos projetos de Trump e Milei.

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Jonuel Gonçalves é pesquisador associado no NEA/INEST da UFF (Niterói),ex-professor visitante da Uneb (Salvador) e está à frente do Blog do Jonuel