Opinião

Carnaval: cultura é algo vivo... será possível geri-la?

A maior festa popular brasileira e a cultura organizacional de uma empresa se encontram em muitos momentos

Bianca Ainchinger e Susana Azevedo

Estamos em pleno Carnaval, este que é um dos mais icônicos símbolos da cultura brasileira! O Carnaval traz à tona tantos dos elementos do ser brasileiro!

Quando pensamos em Carnaval, pensamos em Alegria de Viver, Ritmo, Calor Humano e Inspiração. Se refletirmos no processo de preparar os desfiles de Carnaval, pensamos em Criatividade, Colaboração e Trabalho em Equipe, Foco, Planejamento e Execução, Compromisso. E também podemos pensar em Despreocupação, Caos, Confusão, Improvisação. 

Carnaval pode ser tudo isso acima e ainda mais, depende do modelo mental, crenças e vivências de cada um. Ser Brasileiro também pode ser tudo isso, uma mistura de valores e comportamentos, que por vezes parecem contraditórios, mas que podem criar coisas maravilhosas. Assim somos nós, seres humanos, organismos vivos, com o contraditório dentro de nós. Assim também é a Cultura de uma organização, algo vivo, que evolui, estagna ou se transforma. 

Frequentemente líderes são convidados a liderar, gerenciar e transformar equipes ou organizações. Também, mais frequentemente do que desejado ou mesmo esperado, essas mesmas pessoas, líderes normalmente com expertise, conhecimento e experiência de negócio, fazem diagnóstico da empresa e definem estratégias e essas mesmas estratégias e respectivos planos de ação simplesmente não surtem efeito, pois não consideram o efeito Cultura.

Peter Drucker já dizia no século passado: “A Cultura come a Estratégia ao café da manhã.”

A pergunta que fica então é: sendo a Cultura algo vivo e dinâmico, será possível geri-la e mudá-la, inclusive? De uma forma simplificada, a cultura é a personalidade da organização ou, a um nível mais micro, de uma equipe. É a maneira como as coisas são feitas por lá. Ela é composta de crenças, valores, hábitos e aptidões adquiridos pelos membros da organização ou da equipe e seus comportamentos. Uma cultura efetiva é uma cultura forte, no sentido de que é vivida e percebida em todos os níveis, e é uma cultura saudável, no sentido de que promove performance e resultados, satisfação e bem-estar e também contribui para criar valor para o ecossistema econômico e social em que se integra.

A cultura é determinada pela integração entre legado institucional dos líderes do passado e os seus valores herdados e os valores, crenças e comportamentos dos líderes atuais. E essa integração e evolução só serão possíveis se houver um processo consciente, intencional e consistente de gestão e liderança da Cultura.

Porque é então importante gerir a Cultura? Conectando com o que Drucker falou e muitos experienciaram na prática, a Cultura pode ser percebida como o "como" por trás de qualquer estratégia e que vai dar sustentação à sua implementação bem-sucedida. Nesse sentido “a forma como fazemos as coisas por aqui” é essencial para ter sustentabilidade e alcançar alto desempenho. Por outro lado, uma Cultura efetiva, forte e saudável, permite atrair e reter as melhores pessoas e a criação de um ambiente em que também as pessoas prosperam, criam, produzem e se comprometem, pois se sentem emocionalmente conectadas. A um outro nível, a gestão da Cultura permite identificar o que torna esta organização única e como capitalizar isso – o que diferencia esta organização de seus concorrentes, valorizando assim a marca. Em termos econômicos e financeiros, a gestão da Cultura ativa suporta a condução de fusões e aquisições bem-sucedidas.

Quais são os fatores chave para a gestão e transformação cultural? Em um mundo que as palavras da vez são complexidade e ecossistemas integrados, não dá para fatiar e simplificar tudo para trazer resultados. Essa visão simplista dá uma aparente ilusão de controle. Sendo assim, a cultura não pode ser separada da estratégia, do modelo de negócio ou da governança e processos, tecnologias ou mecanismos de informação, comunicação e decisão. Necessitamos de olhar para cada elemento, considerando o impacto mútuo com os outros elementos.

O processo de gestão e transformação cultural é de alinhamento de 4 fatores-chave principais:

-- Alinhamento de Propósito, Missão e Visão de Futuro: entre propósitos e missões individuais e organizacionais;

-- Alinhamento de Valores: entre valores individuais e organizacionais;

-- Alinhamento de Liderança: quais os comportamentos que a liderança necessita desenvolver e apresentar, que modelam a cultura desejada para as restantes pessoas;

-- Alinhamento Estrutural: entre estratégia, governança, sistemas e processos

Por onde começar a gestão cultural? Como qualquer problema específico, técnico ou administrativo, necessitamos começar por entender o contexto atual: quais as características da cultura atual, tanto em termos dos valores individuais, quanto dos valores vivenciados pelas pessoas na organização e o impacto dessas características nos resultados e na dinâmica de trabalho e relacionamento dentro da organização. 

Por outro lado, também precisamos mapear quais as características da cultura desejada. A partir do diagnóstico de cultura, podemos dar início a um processo de desenvolvimento, estruturado, que, explorando os 4 fatores-chave, vai desdobrar a cultura desejada por toda a organização ou na equipe. 

Este é um processo longo, que, dependendo da dimensão da organização e dos desafios (de outra forma, diferença entre situação atual e desejada), vai demorar mais ou menos tempo e necessita de disciplina, consistência, espírito experimental e colaboração. E talvez o fator de maior impacto seja o patrocínio por parte da alta liderança, tanto com apoio, recursos e organização, mas principalmente sendo exemplo no dia a dia da cultura desejada.

No fim, o que temos a certeza é que se você não conhecer e gerenciar a sua Cultura, ela gerenciará você, sua equipe e sua organização, pois solta, a Cultura é autogerenciável, no sentido de preservar os seus elementos originais.

* Bianca Aichinger e Susana Azevedo são ex-executivas, coaches e sócias-proprietárias da Quantum Development.