Política

Jaques Wagner surpreende e apoia PEC que retira poder do Supremo

A orientação do PT era de voto contrário

Foto: Roque de Sá | Agência Senado
Senador Jaques Wagner (PT-BA): "O meu voto será sim"

A proposta de emenda à Constituição que limita decisões monocráticas no Judiciário (PEC 8/2021), foi aprovada no Senado em dois turnos, com 52 votos favoráveis (3 a mais que o necessário) e 18 contrários e agora vai para apreciação da Câmara dos Deputados.

Apresentado pelo senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR), o texto veda a concessão de decisão monocrática que suspenda a eficácia de lei. Decisão monocrática é aquela proferida por apenas um magistrado — em contraposição à decisão colegiada, que é tomada por um conjunto de ministros (tribunais superiores) ou desembargadores (tribunais de segunda instância). Senadores decidiram retirar da proposta trecho que estabelecia prazos para os pedidos de vista. 

Oriovisto agradeceu a todos os senadores pelo debate democrático em torno da proposta e, em especial, ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, por garantir ampla discussão à matéria. Ele também elogiou o trabalho do relator, Esperidião Amin (PP-SC), por aperfeiçoar o texto.

— Eu luto por essa PEC há cinco anos. O equilíbrio dos Poderes voltará a este país. Eu espero que a Câmara dos Deputados não pare, continue. O Brasil precisa ser modificado, e hoje nós fizemos isso.

O relator, Esperidião Amin (PP-SC), acatou pedido do líder da maior bancada da Casa, Otto Alencar (BA), do PSD, e excluiu da PEC mudanças nas regras dos pedidos de vista (mais prazo para análise do processo).

Wagner justifica o voto

"O governo entende que essa é uma matéria entre o Legislativo e Judiciário e o governo não vai firmar posição. Agora, não falo como líder do governo e entendo que Vossa Excelência (Rodrigo Pacheco) e o senador Oriovisto Guimarães (autor da PEC) promoveram o movimento de minimizar as diferenças que fizeram parecer se tratar de uma interferência no Supremo (STF). O meu voto será sim", disse Wagner (PT-BA), líder do governo.

Para o ministro da Secretaria de Comunicação Social da Presidência (Secom), Paulo Pimenta, a PEC "não é assunto do governo”. De acordo com o ministro, discussões como essa, que envolvem disputas entre os Poderes, não “são temas em que o governo tem posição”.

O líder do PT no Senado, Fabiano Contarato, considera que a PEC invade a função do Poder Judiciário, e o senador Humberto Costa (PT-PE) diz estar havendo "uma descortesia inconstitucional com o Supremo".

Durante o debate no Plenário, parte dos senadores rechaçou a ideia de que a medida seria uma retaliação à Suprema Corte, enquanto outros apontaram que a medida seria uma invasão indevida nas atribuições daquele Poder. 

Antes da votação, Rodrigo Pacheco disse que a medida não é uma retaliação, mas um aprimoramento ao processo legislativo:

— Não é resposta, não é retaliação, não é nenhum tipo de revanchismo. É a busca de um equilíbrio entre os Poderes que passa pelo fato de que as decisões do Congresso Nacional, quando faz uma lei, que é sancionada pelo presidente da República, ela pode ter declaração de institucionalidade, mas que o seja pelos 11 ministros, e não por apenas 1 — disse. 

Ao ler seu parecer, Esperidião Amin foi na mesma linha:

— O que nós desejamos com esta proposta, tanto em 2019 quanto hoje, é que uma lei aprovada pelas duas Casas do Congresso e sancionada pelo Presidente da República, ou seja, passando por este filtro do Legislativo e do Executivo, seja sim examinada, como é previsto na Constituição pela Suprema Corte e, eventualmente, pelos Tribunais respectivos, e consertada caso haja nela algum defeito jurídico de peso, uma inconstitucionalidade, por exemplo.

Flávio Bolsonaro (PL-RJ) foi outro a afastar a ideia de confronto. Ele reforçou que a mudança tem como objetivo aperfeiçoar o Judiciário e garantir assim a análise mais célere dos processos:

 — A população brasileira espera de nós, senadores, buscando o mínimo de estabilidade jurídica, de estabilidade política, de estabilidade das leis que são aprovadas aqui no Congresso Nacional, e obviamente não tem nenhum sentido virem a ser sustadas, suspensas por um único ministro do Supremo, por mais que ele possa ter razão, mas após uma análise de um colegiado.

Para o senador Marcelo Castro (MDB-PI), a PEC também é desnecessária. 

— Estamos quebrando a harmonia? Não chegaria a tanto, mas diante da postura que o Supremo já assumiu, não haveria necessidade de votar o que estamos votando hoje. Estamos chovendo no molhado. Eu concordava com essa PEC em 2021, mas acho que em 2023 ela perdeu o objeto — afirmou.

Emendas

Por meio de emenda, o relator retirou do texto referência a eficácia de lei ou ato normativo com efeitos "erga omnes", ou seja, que atinjam todas as pessoas, assim como qualquer ato do presidente da República. Se mantivesse a proibição de decisões monocráticas nesses casos a suspensão de política públicas ou outros atos do presidente só poderiam ser tomadas pelo plenário dos tribunais, que no caso do STF é formado por 11 ministros. 

— Estamos retirando a expressão "atos normativos" para que apenas haja referência à restrição de decisões monocráticas sobre normas legais e não atos normativos. Atos normativos , que via de regra são do Executivo, podem tramitar sem essa regulação que a nossa emenda à Constituição aplica — disse Amin.

Durante a análise no Plenário, o relator acatou emenda de Rodrigo Pacheco para garantir que os julgamentos sobre inconstitucionalidade de leis contem com a participação das Advocacias do Senado e da Câmara dos Deputados. O texto diz que “as Casas do Congresso Nacional devem ser citadas para se manifestarem sobre o tema, por intermédio dos respectivos órgãos de representação judicial, sem prejuízo de haver também a manifestação da Advocacia-Geral da União”.

Votaram contra
-- Augusta Brito (PT-SE)
-- Beto Faro (PT-PA)
-- Carlos Fávaro (PSD-MT)
-- Confúcio Moura (MDB-RO)
-- Eliziane Gama (PSD-MA)
-- Fabiano Contarato (PT-ES)
-- Fernando Farias (MDB-AL)
-- Humberto Costa (PT-PE)
-- Jorge Kajuru (PSB-GO)
-- Jussara Lima (PSD-PI)
-- Leila Barros (PDT-DF)
-- Marcelo Castro (MDB-PI)
-- Paulo Paim (PT-RS)
-- Randolfe Rodrigues (sem partido-AP)
-- Rogério Carvalho (PT-SE)
-- Romário (PL-RJ)
-- Teresa Leitão (PT-PE)
-- Zenaide Maia (PSD-MA)

Ausentes
-- Ana Paula Lobato (PSB-MA)
-- Cid Gomes (PDT-CE)
-- Eduardo Braga (MDB-AM)
-- Irajá (PSB-TO)
-- Jader Barbalho (MDB-PA)
-- Mecias de Jesus (Republicanos-RR)
-- Omar Aziz (PSD-AM)
-- Renan Calheiros (MDB-AL)
-- Sérgio Petecão (PSD-AC)
-- Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB)

O que diz a PEC

Recesso do Judiciário: No caso de pedido formulado durante o recesso do Judiciário que implique a suspensão de eficácia de lei, será permitido conceder decisão monocrática em casos de grave urgência ou risco de dano irreparável, mas o tribunal deverá julgar esse caso em até trinta dias após a retomada dos trabalhos, sob pena de perda da eficácia da decisão.

Criação de despesas: Processos no Supremo Tribunal Federal (STF) que peçam a suspensão da tramitação de proposições legislativas ou que possam afetar políticas públicas ou criar despesas para qualquer Poder também ficarão submetidas a essas mesmas regras.

Decisões cautelares: A PEC estabelece que quando forem deferidas decisões cautelares — isto é, decisões tomadas por precaução — em ações que peçam declaração de inconstitucionalidade de lei,  o mérito da ação deve ser julgado em até seis meses. Depois desse prazo ele passará a ter prioridade na pauta sobre os demais processos.

Histórico

A PEC 8/2021 resgata o texto aprovado pela CCJ para a PEC 82/2019, também de Oriovisto Guimarães. Essa proposta acabou sendo rejeitada pelo Plenário do Senado em setembro de 2019.

Na justificação da nova proposta, Oriovisto apresenta números de um estudo segundo o qual, entre 2012 e 2016, o STF teria tomado 883 decisões cautelares monocráticas, em média, 80 decisões por ministro. O mesmo estudo indica que o julgamento final dessas decisões levou em média, entre 2007 e 2016, dois anos. Esse grande número de decisões cautelares monocráticas, na visão do autor da PEC, acaba antecipando decisões finais e gerando relações insegurança jurídica.

A proposta foi aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) no início de outubro com parecer favorável de Esperidião Amin. A votação durou menos de um minuto na ocasião.