Jolivaldo Freitas

Eu gosto de greve

 Claro que o pessoal que mora longe vai estrebuchar quando eu disser que gosto de greve de ônibus. Adoro sim, e ando pelas ruas respirando fundo, puxando ar puro pela falta de fumaça que os ônibus velhos exalam. Até mesmo o fato da diarista não aparecer para me acordar de manhã cedo com o barulho do aspirador de pó e do puxa-puxa de cadeiras e sofás já é um ponto positivo para os motoristas.


O que me preocupa com a greve dos motoristas é que os caras são pirados. Vi em algum lugar escrito que boa parte dos profissionais do motor tem problema de hérnia de disco, problemas estomacais, o fusquete cheio de hemorroidas e o mais preocupante. Boa parte é maluco, esquizofrênico, bipolar e lelé. Se eles decidem sair quebrando tudo? Maluco tem arte e você sabe.
 
 Então imagine como a greve é boa. Você anda de carro pelas ruas e em nenhum momento vai aparecer um maluco para te cortar pela direita, jogar o ônibus em cima de você, dar queda de asa, costurar, apertar na curva ou parar na rua estreita e sair para comprar água, suco, refrigerante, cigarro, bater papo e ficar na banca de revistas enquanto os passageiros aguardam e o motorista de trás fica quieto, pois sabe que se houver queixa ou buzinar o psicopata vai cair matando.
 
Lembro que uma vez, não sei quando, eu subia pelo Santo Agostinho em direção à Ladeira dos Galés e quando dobro a rua e tem um ônibus parado empatando o tráfego. Nunca tinha ouvido falar que naquela rua estreita pudesse entrar ônibus. Caí na besteira de buzinar, pois notei que não tinha motorista em seu interior e que ele saíra, desligara o motor, ligara o pisca-alerta e fora resolver um probleminha prosaico no sindicato dele que ficava justamente onde ele estacionara. Levou o ônibus como se fosse seu.
 
Quando buzinei parecia que tinha mexido num vespeiro. Ele, o cobrador e mais um grupo de motoristas e sindicalistas, veio em minha direção e se eu não dou ré e desço por uma rua transversal com certeza tinham me transformado em patê. Os caras são doidos de pedra e nem entre si eles se entendem. De vez em quando um mata o outro, dá dedada no toba, xinga a mãe e chuta a canela. Ainda mais quando tem eleição sindical.
 
Portanto que eu gosto e apoio a greve dos ônibus; a cidade fica mais silenciosa e conheço um monte de gente que também gosta. A moça que atende no Posto de Saúde do Garcia estava comentando com a outra que era uma felicidade o sossego, sem velho para dar vacina, criança remelenta com coqueluche, tosse e bronquite, caganeira ou que engoliu uma moeda. Sem doentes o posto estava um paraíso e este é o sonho de quem trabalha em postos, clínicas e hospitais. Até no HGE os médicos podem jogar em paz uma partida de xadrez e as atendentes podem assistir às novelas da Globo ou aos programas de baixo nível, pois baixaria não entra em greve.