Plano Inclinado do Pilar, em Salvador - Foto: Paul Robert Burley/Wikimedia
A história do transporte vertical em Salvador começa com a instalação dos ascensores de cargas, chamados na época de guindastes, transportes inclinados movidos por animais, e o mais conhecido era o guindaste da Companhia de Jesus, instalado onde hoje temos o Plano Inclinado Gonçalves. Há, inclusive, uma rua alinhada à encosta chamada de Guindaste do Padres.
De acordo com Glaucia Trinchão, no século XVII havia pelo menos seis guindastes em funcionamento, alguns deles pertencentes a outras ordens religiosas como a dos beneditinos, na praia da Preguiça, dos carmelitas, que ligava o Pilar ao Carmo, e o dos terésios, que ligava as Pedreiras ao Sodré.
No detalhe da planta de Albernaz, de 1631 podem ser vistos dois guindastes: o da Companhia de Jesus e o do Conselho, ou melhor da Câmara Municipal, onde hoje temos o Elevador Lacerda.
Em se tratando do transporte público de passageiros, os ascensores verticais e inclinados vão se somar aos bondes para integrar, assim, as linhas da cidade alta com as da cidade baixa, estratégia fundamental para a mobilidade urbana em uma cidade com ladeiras bastante íngremes cujo calçamento demoraria a chegar.
Vimos que a eletrificação das linhas de bonde ocorreu na década de 1890, mas alguns ascensores foram instalados um pouco antes. Desde a década de 1860, o governo da Província havia investido em concessões para a construção de equipamentos que atendessem à necessidade do transporte de pessoas e cargas entre a cidade alta e a cidade baixa, o que ocorreria a partir da participação da empresa Antônio de Lacerda & Cia. em 1869.
O empresário baiano Antônio de Lacerda havia estudado nos Estados Unidos onde teve contato com as primeiras aplicações da tecnologia de elevadores, e como visionário que era construiu o Elevador Hidráulico da Conceição, uma torre erguida a 63 m, em ferro e alvenaria de pedra, que atravessa a encosta até chegar à cidade baixa, um marco de modernidade na paisagem colonial de Salvador, pioneira na implantação dessa modalidade de transporte público urbano. Em 1894 o elevador recebeu o nome do seu idealizador.
Na década de 1880 foi a vez da construção do Plano Inclinado Gonçalves (Figura 3), o famoso Chariot (para quem é sessentão), no mesmo local onde funcionou o guindaste dos padres da Companhia de Jesus. Incialmente ele receberia o nome de Plano Inclinado Isabel, em homenagem à princesa, mas como foi inaugurado em 25 de dezembro de 1889 recebeu o nome em homenagem ao comendador Manuel Francisco Gonçalves, diretor da Companhia Circular de Carris, empresa responsável pelo empreendimento.
O Plano Inclinado do Pilar foi construído entre 1895 e 1897 para ligar Santo Antônio Além do Carmo, na cidade alta, ao Pilar, no mesmo local onde funcionou o guindaste dos carmelitas. Os dois ascensores inclinados foram construídos com mecanismos e máquinas alemães.
Em 1891 começou a construção do Elevador do Taboão, iniciativa da Companhia Circular de Carris. Instalado em um desnível de cerca de 25 metros, ligava a Ladeira do Taboão, na cidade alta, à Rua do Julião, na cidade baixa. Foi construído em estrutura metálica, projeto desenvolvido na Inglaterra, e a máquina das oficinas de W.G. Armstrong, em Newcastle. Sua torre possui 28 metros de altura e originalmente tinha duas cabines de passageiros. Assim como o Elevador Lacerda, uma passarela metálica conectava a torre ao destino na cidade alta.
Esses equipamentos foram implantados em Salvador num período considerado o primeiro surto industrial da Província e refletem a busca pela modernidade por meio de investimentos em tecnologia de transportes. Todos esses mecanismos se articulavam com as linhas de bondes e constituíam um sistema de transporte público. Nesse período havia quatro modais de transporte: bonde, puxado por burros ou elétrico; elevadores; planos inclinados e trem. Todas essas iniciativas, algumas pioneiras, foram da segunda metade do século XIX.
Salvador fecha o século XIX com telégrafo, telefone, cinema, fontes luminosas, tudo isto convivendo com bairros com características rurais e uma população de cerca de 170 mil habitantes. Sob a perspectiva do avanço da tecnologia dos transportes, a cidade ficou a desejar apenas pela falta de metrô, mas tendo em vista suas dimensões, principalmente a populacional, essa modalidade poderia esperar um pouco.
***
Para saber mais
SAMPAIO, C. N. 50 anos de urbanização: Salvador da Bahia no século XIX. Rio de Janeiro: Versal, 2005.
TRINCHÃO, G. M. C. O Parafuso: de meio de transporte a cartão postal. Salvador, 1999. Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo). Faculdade de Arquitetura, Universidade Federal da Bahia, Salvador, 1999.