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A Desafortunada História do Romance de Julieta e Romeu estreia na Sala do Coro

Montagem integra programação comemorativa de aniversário de 20 anos da companhia

Foto: Caio Lirio
Romeu e Julieta

Uma trupe composta por sete corpos da rua apresenta na Sala do Coro do Teatro Castro Alves, de 19 de maio a 12 de junho - quinta a domingo, às 20h, a peça A Desafortunada História do Romance de Julieta e Romeu. A montagem, que integra a programação do 25º Festival Cultura Inglesa (https://culturainglesafestival.com.br/), é uma produção da ATeliê voadOR, em comemoração aos seus 20 anos, com direção e dramaturgia de Djalma Thürler. 

Nesta montagem, carnavalesca e repleta de referências musicais brasileiras, o dramaturgo se vale de uma poética de encruzilhadas, em que se inspira em textos e cenas emblemáticas de outros gêneros literários e autores: o drama de William Shakespeare, a poesia do poeta Arthur Brooke, a prosa de Matteo Bandello e a poesia popular de João Martins de Athayde, sendo esta última, a base principal para a encenação da ATeliê voadOR. 

“Uma encenação em encruzilhada se vale de muitas referências em complexa negociação cultural entre as fontes que inspiram esse trabalho (Shakespeare, Brooke, Bandello, Athayde). É uma forma de linguagem insubordinada, totalmente contrária às formas canônicas de controle, regulação e vigilância, fiel às forças de movimento, cruzo, rasura, invenção”, realça.

Para contar a história destes infelizes amantes, Thürler, Duda Woyda e Mariana Moreno, integrantes da ATeliê voadOR, convidam Igor Epifânio, Jarbas Oliver, Leonardo Teles, Mariana Borges e Talis Castro. “Embora nossa encenação termine mais uma vez com a morte, o coro – implicado a uma política de vida, contrário aos ditames da agenda dominante – reage e se coloca na frenética esperança de algo mais. É um espetáculo dedicado a todas as pessoas que não se cansam de renascer. ‘Basta de mortes! Chega de sangue!'”, pontua o diretor.

Mas não se trata de um spoiler do fim trágico. Desde o prólogo, os sete corpos de rua, em encantaria, convocam a atenção de todo o público e, em gira, festejam a história da desafortunada história do romance de Julieta e Romeu, na bela Verona, antiga cidade da província italiana.   

Para Thürler, encenar uma história clássica, como a de Julieta e Romeu - que tem na obra de Shakespeare a versão mais conhecida - é compreender que ela é uma dramaturgia que nunca termina de dizer o que tem a dizer. “Contudo, a nossa montagem enfatiza a figura da heroína, cujo primeiro amor transgressivo a torna uma rebelde. Julieta encarna a sede de vida mesmo imersa em um ambiente marcado pelo autoritarismo de um pai perverso, que impede qualquer possibilidade de alegria ou felicidade”, explica. 

“O que fazemos é reduzir o fosso entre arte e realidade. Quero contar uma história de poder e me posicionar contra o moralismo desaprovador e da mensagem sombria e cautelosa que os primeiros dão aos seus textos”, revela Thürler, ao acrescentar que ao dar o protagonismo à figura de Julieta, acentua a consciência crítica sobre a realidade em que estão inseridos. 

Ao se colocar nesse espaço crítico social, ao aproximar aquilo que dificilmente se aproximaria, a Companhia torna A Desafortunada História do Romance de Julieta e Romeu em uma obra épica. “Embora minhas obras, de fato, sejam marcadas por uma estética épica, paradoxalmente, elas são concebidas e estudadas a partir do texto teatral. É pelos estudos literários que se dá essa concepção mais performativa da cena, porém, de uma perspectiva histórica, se difere muito da representação em suas funções e processos, frustrando os princípios do teatro de representação, em especial, suas ligações com a ilusão e a ficção, colocando a realidade da ação diante dos olhos dos espectadores”, explica Thürler.

Carnavalesca e alegórica, A Desafortunada História do Romance de Julieta e Romeu tem a direção musical assinada por Cassius Cardoso, que se vale de ritmos populares e periféricos brasileiros, como o samba, funk, axé, galope e o arrasta-pé. Um momento de destaque é a releitura de “Tonight”, composição do musical “West side Store”. O trabalho corporal dos atores foi preparado pelo bailarino e coreógrafo Leandro Oliveira.

No cenário assinado por José Dias há fragmentos memoriais de espetáculos anteriores do repertório voador, que chegou à Bahia em 2009. Há referências dos cenários de "O Lustre" (2002), "O Melhor do Homem" (2009) e "Salmo 91" (2012). O figurino é assinado pelo artista visual Luiz Santana. Como referência visual, fragmentos de detritos de metal e borracha, figurinos de um corpo-memória para se defender das violências mundanas.

Vale lembrar que a ATeliê voadOR Teatro foi criada em 2002, estimulada por um movimento fundamental e coletivo para as artes cênicas brasileiras contemporâneas que foi o Teatro de Grupo. A ATeliê voadOR em seus 20 anos tem se confirmado como uma Companhia de repertório sustentada por eixos de pesquisa, extensão e formação, sediada em um Instituto Interdisciplinar na Universidade Federal da Bahia (UFBA).

Duas décadas, 15 espetáculos. Radicada em Salvador há 15 anos, estreou 13 das obras do seu repertório: Cabaré Vibrátil (2019), Escorpião (2019), Que os outros sejam o Normal (2018), Uma mulher impossível (2017), A mulher que matou os peixes (2017), O outro lado de todas as coisas (2016), Qu4tro Carreirinhas, Três Cigarros & A Última Lasanha (2015), CORAL: uma etno(cena)grafia (2015), O diário de Genet (2013), A Alma Encantadora do Beco (2013), Salmo 91 (2012), O Melhor do Homem (2009). Para o segundo semestre de 2022, o grupo já tem marcado a estreia do espetáculo “O princípio de Arquimedes”, de Josep María Miró.