Está aberta ao público, no Sesc Piracicaba, a 15ª Bienal Naïfs do Brasil. Com curadoria de Ana Avelar e Renata Felinto, a Bienal reúne 125 artistas de 21 estados do país, além do Distrito Federal.
A partir do tema Ideias para adiar o fim da arte - uma referência direta ao pensamento do líder indígena, ambientalista e escritor brasileiro Ailton Krenak e ao filósofo e crítico de arte americano Arthur Danto -, a exposição traz 212 obras em suportes diversos. São instalações, pinturas, desenhos, colagens, gravuras, esculturas, bordados, marcheteria e entalhes. Em diálogo com o corpo expositivo, as artistas Carmela Pereira, Leda Catunda, Raquel Trindade e Sonia Gomes integram a mostra a convite das curadoras.
Ana Mae Barbosa e Lelia Coelho Frota, mulheres intelectuais brasileiras que demonstraram em suas pesquisas a preocupac?a?o e o cuidado com o entendimento da pessoa artista e de sua produc?a?o de forma mais humana e plural, também são reverenciadas no processo curatorial desta 15ª edição da Bienal.
Inicialmente prevista para inaugurar em agosto deste ano, a mostra, que teve sua abertura adiada devido às restrições impostas pela pandemia de Covid-19, poderá ser visitada gratuitamente pelo público de terça a sexta, das 14h às 20h e aos sábados, das 10h às 14h, mediante agendamento prévio pelo site sescsp.org.br/piracicaba. A permanência máxima na unidade é de 90 minutos e o uso de máscara facial é obrigatório para todas as pessoas durante toda a visita.
A Bienal
Realizada pelo Sesc São Paulo em Piracicaba desde o início da década de 1990, a Bienal Naïfs é um convite para o público refletir sobre os fazeres populares inventados por artistas. Nesta 15ª edição, a partir do título Ideias para adiar o fim da arte, a mostra traz discussões sobre temas como meio ambiente; o feminino como força social, como divindade e como figura do sagrado; as violências estruturais históricas; os espaços de coletividade e sociabilidade em ritos, festas e cerimônias; e o debate sobre objetualidade e utilidade.
Segundo Danilo Santos de Miranda, Diretor Regional do Sesc São Paulo, "a longeva relação do Sesc com esse universo, que antecede à realização das Bienais Naïfs do Brasil, está ligada ao reconhecimento de que a arte popular merece um espaço condizente com sua relevância. Além disso, essa trajetória colaborou para que a própria instituição alargasse seus horizontes e sua compreensão sobre ação cultural, evidenciando as conexões entre cultura, democracia e cidadania. Cada nova edição impõe desafios sintonizados com contextos cambiantes e suas urgentes questões. Pois o presente é caleidoscópio de temporalidades, onde passados e futuros são disputados - e a arte é uma das principais expressões dessa tão humana condição".
A Curadoria
A partir da seleção feita pelas curadoras Ana Avelar e Renata Felinto - foram inscritas 980 obras, de 520 artistas com idades entre 19 e 87 anos - surgiram eixos temáticos, plurais e diversos, que compõem a mostra. O processo de seleção de trabalhos partiu do critério da representatividade e considerou as regiões de onde provêm e atuam esses artistas, suas declarações étnico-raciais, faixas etárias, os assuntos e as materialidades com as quais trabalham.
"Saltam aos olhos assuntos da maior relevância na imprensa hoje, como é o caso da questão premente da conservação ambiental, em particular no que diz respeito ao desmatamento na Amazônia, tema que há décadas ocupa o centro da política nacional, com negociações frequentes entre governos e órgãos internacionais, acionando avanços e retrocessos no debate ambiental. É também visível a associação da figura feminina à natureza, frequentemente como divindade. Nesse sentido, surgem imagens do sagrado e do fantástico, muitas vezes num amálgama sincrético de linguagens e religiões. As mulheres, aliás, são protagonistas de umas tantas cenas para além dessas fantásticas", explica Ana Avelar.
"Nosso desejo durante a seleção foi de contemplar várias humanidades, que é a multiplicidade de cores. Nós temos, por exemplo, um grande número de pessoas não brancas participando dessa exposição, e isso é necessário porque é preciso equilibrar dentro das exposições, o número de participantes, as origens, as complexidades das pessoas humanas participantes de acordo com a complexidade da população constitucional brasileira. Temos um grande número de pessoas de povos originários e de pessoas que são consideradas também pretas, ou negras e pardas, de acordo com as categorias oficiais. E isso é muito estimulante porque foi a nossa tentativa de apresentar, na Bienal Näifs do Brasil, uma pluralidade do povo brasileiro", ressalta Renata Felinto .
A ênfase desta 15ª edição da Bienal Naïfs numa crescente representatividade geográfica, étnico-racial, etária e de gênero, entre outros marcadores sociais, é, segundo a curadoria, uma maneira de estar à altura desse panorama. Os artistas naïfs constituem parte importante de tal questionamento, expandindo e relativizando os pontos de vista presentes na arte, campo tradicionalmente atrelado a distinções de classe. Maior diversidade de vozes e, portanto, de formas e cores, de assuntos e aproximações.
Sobre Naïfs
De origem francesa, o termo Naïf deriva do latim e sugere algo natural, ingênuo, espontâneo, foi utilizado originalmente no campo das artes para descrever a pintura e as propostas do artista modernista francês Henri Rousseau (1844-1910). A adoção do termo pela Bienal, no plural e desvinculado da palavra "arte", evidencia seu foco no artista e em suas manifestações diversas e múltiplas, deixando em aberto os possíveis significados e características do que é ser naïf.
"Vale notar ainda que o termo naïf, largamente utilizado para denominar essas várias artes e que, inclusive, nomeia esta Bienal, possuía no passado um sentido de arte ingênua relacionado a uma suposta falta de formalização dos estudos por parte desses/dessas artistas. Como podemos perceber, inclusive nesta mostra, tal leitura provou-se errônea e, a julgar por artistas que tradicionalmente participam desta exposição, hoje a palavra é reivindicada por eles/elas pelo fato de compor um sistema específico no qual os critérios daquilo que define um/uma artista naïf e os interesses que suscitam suas obras são absolutamente distintos daqueles que vigoram no sistema da arte contemporânea", afirma Ana Avelar.
Premiações
Como forma de estimular a participação, valorizar a produção artística e diversificar a coleção permanente da instituição, - o Acervo Sesc de Arte -, o Sesc São Paulo concede a alguns dos artistas selecionados, por meio de suas obras, o Prêmio Destaque-Aquisição, o Prêmio Incentivo e Menção Especial.
Para esta 15ª edição da Bienal Naïfs, as obras agraciadas foram:
Prêmio Destaque-Aquisição
Cotidiano II, de Alexandra Adamoli (Piracicaba, SP)
Totem Apurinã Kamadeni, de Sãnipã (Pauiní, AM)
O renascimento de Luzia, de Paulo Mattos (São Paulo, SP)
O martírio de Nossa Senhora do Brasil, de Shila Joaquim (São Matheus, ES)
Prêmio Incentivo
Manto tropeiro: um breve olhar do caminho das tropas, Coletivo de Angeles Paredes e Carmem Kuntz (Sorocaba, SP)
Em busca de uma liberdade que ainda não raiou, de Con Silva (Batatais, SP)
Comadre Fulosinha dá a luz depois de degolar o caçador que a engravidou, de Eriba Chagas (São Paulo, SP)
Esperança em pedaços, de Paulo Chavonga (Diadema, SP)
Brincantes do imaginário, de Valdeck de Garanhuns (Guararema, SP)
Menção Especial
É óleo no mar..., de Alcides Peixe (São Paulo, SP)
Cantinho do benzer, de Alexandra Jacob (Piracicaba, SP)
Vazante, de Eri Alves (São Paulo, SP)
Jandira #33, de Hellen Audrey (Campinas, SP)
Aprendiz de Pajé, de Yúpury (Manaus, AM)
Umbuzeiro florindo, de Nilda Neves (São Paulo, SP)
Gorda, de Soupixo (Crato, CE)
Alma da estrada, de Thiago Nevs (São Paulo, SP)
Dia-a-dia de Finoca, de Zila Abreu (São Paulo, SP)
Ações online
Ao longo dos pro?ximos meses, o Sesc São Paulo promoverá uma se?rie de atividades gratuitas e online com as curadoras, artistas e outros especialistas do campo das artes visuais. Sera?o abordados temas como as estrate?gias de visibilizac?a?o de produc?o?es arti?sticas, as dina?micas dos espac?os de criac?a?o, ale?m de diferentes perspectivas sobre o campo da arte dita popular.
A programac?a?o tera? bate-papos e encontros virtuais, assim como cursos destinados a pu?blicos especi?ficos, com temas como fotografia de obras de arte e um curso de formac?a?o de professores, educadores e artistas a ser ministrado pela escritora, educadora e curadora Valqui?ria Prates. Todas as ac?o?es online da Bienal sera?o anunciadas periodicamente nas redes os canais do Sesc Piracicaba. no Facebook, Instagram e Twitter.