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Pandemia da Covid jogou 150 milhões de crianças na pobreza

Número de menores sem acesso à educação, saúde, nutrição, água e saneamento subiu 15%

Foto: Unicef/Pavel Zmey
Assistente social e psicóloga interagem com crianças na Ucrânia

Cerca de 1,2 bilhão de crianças estão vivendo na chamada pobreza multidimensional. A que inclui falta de serviços básicos como água, educação e saúde para o desenvolvimento dos menores.

Este número aumentou 15% desde o início da pandemia, que jogou mais 150 milhões de crianças na pobreza. A conclusão é parte de um estudo do Fundo das Nações Unidas para a Infância, Unicef, e da ONG britânica Save the Children.

Segundo o relatório, divulgado em Londres e Nova Iorque, o aumento de 15% ocorreu em países de rendas baixa e média. Foram utilizados dados sobre educação, cuidados de saúde, moradia, nutrição, água e saneamento em mais de 70 nações.

O estudo mostra que cerca de 45% das crianças foram severamente privadas de pelo menos uma dessas necessidades numa análise antes da pandemia. Para o Unicef, com as consequências da Covid-19 na economia, este quadro deve piorar nos próximos meses. 

A diretora-executiva do Unicef, Henrietta Fore, contou que as medidas de combate à doença aprofundaram a situação de pobreza de milhões de crianças. No estudo, o Unicef afirma que para compreender a extensão da pobreza infantil é preciso analisar todas as dimensões e implementar políticas em várias frentes.

Ações de proteção social, políticas fiscais, investimentos em serviços sociais e emprego servem para apoiar as famílias e são críticas para tirar as crianças da pobreza.

Creche e educação a distância

Ainda para o Unicef, é preciso expandir os serviços de saúde e tecnologia necessários para a educação a distância. Uma outra urgência é o investimento em políticas de família como férias pagas e creche.

A líder da ONG Save the Children, Inger Ashing, lembra que a pandemia causou a maior emergência global de saúde da história e um aumento da pobreza, que serão difíceis para as crianças vencerem.

Segundo ela, alunos que perdem a chance de educação são mais facilmente levados ao trabalho infantil e ao casamento precoce ficando presos por vários anos num círculo de pobreza. Para ela, não é possível permitir que isso aconteça e por isso, os governos nacionais devem fazer mais para evitar o pior.

Atualmente no mundo, existem mais crianças na pobreza e ficando mais pobres que antes. Antes da pandemia, a média de crianças sendo seriamente privadas de serviços básicos era de 0,7. Após a Covid-19, esta taxa subiu par 0,85 o que representa 15% a mais do quadro anterior.

O Unicef afirma que é preciso agir agora. Para a chefe da agência, Henrietta Fore, os governos têm que priorizar as crianças mais marginalizadas e as famílias com uma expansão rápida de sistemas de proteção social incluindo transferência de dinheiro, benefícios para a criança, oportunidades de ensino a distância, serviços de saúde e merenda escolar.

A agência da ONU defende que fazer esses investimentos agora poderá ajudar os países a se preparem para choques no futuro.

Efeitos da Covid-19 em crianças

Mais pesquisas são necessárias para determinar os fatores que aumentam o risco de COVID-19 grave entre crianças e adolescentes, disse o chefe da Organização Mundial da Saúde (OMS), acrescentando que, embora as crianças possam ter sido amplamente poupadas de muitos dos efeitos mais graves, elas sofreram de outras maneiras.

Juntando-se aos chefes de Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) e Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), em uma entrevista coletiva na terça-feira (15), o diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, destacou que desde o início entender os efeitos da COVID-19 nas crianças tem sido uma prioridade.

“Nove meses após o início da pandemia, muitas questões permanecem, mas estamos começando a ter uma imagem mais clara. Sabemos que crianças e adolescentes podem ser infectados e podem infectar outras pessoas”, disse.

“Sabemos que este vírus pode matar crianças, mas que as crianças tendem a ter uma infecção mais branda e há poucos casos graves e mortes por COVID-19 entre crianças e adolescentes.”

De acordo com dados da OMS, menos de 10% dos casos notificados e menos de 0,2% das mortes ocorrem em pessoas com menos de 20 anos. No entanto, pesquisas adicionais são necessárias sobre os fatores que colocam crianças e adolescentes em maior risco.

Além disso, os efeitos potenciais de longo prazo para a saúde daqueles que foram infectados permanecem desconhecidos.

Referindo-se ao fechamento de escolas em todo o mundo, que atingiu milhões de crianças, impactando não apenas sua educação, mas também uma série de outros serviços importantes, o diretor-geral da OMS disse que a decisão de fechar escolas deve ser um último recurso, temporário e apenas em nível local em áreas com transmissão intensa.

Manter as escolas abertas é ‘um trabalho de todos’

O tempo durante o qual as escolas estão fechadas deve ser usado para implementar medidas de prevenção e resposta à transmissão quando reabrirem.

“Manter as crianças seguras e na escola não é tarefa apenas das escolas, dos governos ou das famílias. É um trabalho para todos nós, juntos”, acrescentou.

“Com a combinação certa de medidas, podemos manter nossos filhos seguros e ensiná-los que saúde e educação são duas das mercadorias mais preciosas da vida”, acrescentou.

Orientação sobre a reabertura de escolas, mantendo crianças e comunidades seguras

Embora as crianças tenham sido poupadas de muitos dos efeitos mais graves do vírus para a saúde, elas sofreram de outras maneiras, disse Tedros, acrescentando que o fechamento de escolas atingiu milhões de crianças em todo o mundo.

Dadas as diferentes situações entre os países: alguns onde as escolas foram abertas e outros, onde não, a UNESCO, o UNICEF e a OMS publicaram orientações atualizadas sobre medidas de saúde pública relacionadas com as escolas no contexto da COVID-19.

Com base nas evidências científicas mais recentes, o guia fornece conselhos práticos para escolas em áreas sem casos, casos esporádicos, grupos de casos ou transmissão comunitárias. As orientações foram desenvolvidas com a contribuição do Grupo Técnico Consultivo de Especialistas em Instituições Educacionais e COVID-19, estabelecido pelas três agências da ONU em junho.

Audrey Azoulay, diretora-geral da UNESCO, também destacou a importância da escola, não apenas para o ensino, mas também para fornecer saúde, proteção e – às vezes – serviços de nutrição.

“Quanto mais tempo as escolas permanecerem fechadas, mais prejudiciais serão as consequências, especialmente para as crianças de contextos mais desfavorecidos. Portanto, apoiar a reabertura segura de escolas deve ser uma prioridade para todos nós”, disse ela.

Além de reabrir escolas com segurança, a atenção deve se concentrar em garantir que ninguém seja deixado para trás, acrescentou Azoulay, advertindo que em alguns países, as crianças estão faltando às aulas, em meio ao temor de que muitos – especialmente as meninas – podem nunca mais voltar às escolas.

Paralelamente, garantir o fluxo de informação e comunicação adequada entre professores, gestores escolares e familiares; e definir novas regras e protocolos, incluindo funções e treinamentos para professores, gerenciamento de horários escolares, revisão de conteúdo de aprendizagem e fornecimento de suporte corretivo para perdas de aprendizagem são igualmente importantes, disse ela.

“Quando lidamos com educação, as decisões que tomamos hoje terão impacto no mundo de amanhã”, disse a diretora-geral da UNESCO.

Emergência educacional

No entanto, com metade da população estudantil global ainda sem possibilidades de retornar às escolas e quase um terço dos alunos do mundo incapaz de acessar o ensino à distância, a situação é “nada menos que uma emergência educacional global”, disse Henrietta Fore, diretora-executiva do UNICEF.

“Sabemos que fechar escolas por períodos prolongados de tempo pode ter consequências devastadoras para as crianças”, acrescentou ela, destacando o aumento do risco de exposição à violência física, sexual ou emocional.

A situação é ainda mais preocupante tendo em conta os resultados de uma recente pesquisa do UNICEF, que descobriu que quase um quarto dos 158 países questionados, em seus planos de reabertura de escolas, não havia definido uma data para permitir que os alunos voltassem às salas de aula.

“Para os mais marginalizados, faltar à escola – mesmo que apenas por algumas semanas – pode levar a resultados negativos que duram a vida toda”, advertiu Fore.

Ela pediu aos governos que priorizem a reabertura de escolas, quando as restrições forem suspensas, e se concentrem em todas as coisas de que as crianças precisam – aprendizado, proteção e saúde física e mental – e garantam que o melhor interesse de cada criança seja colocado em primeiro lugar.

E quando os governos decidem manter as escolas fechadas, eles devem ampliar as oportunidades de aprendizagem remota para todas as crianças, especialmente as mais marginalizadas.

“Encontre formas inovadoras – incluindo online, TV e rádio – para manter as crianças aprendendo, não importa o que aconteça”, enfatizou Fore.